São Paulo, quarta-feira, 03 de março de 2010

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MÚSICA

Crítica/ "Berg & Beethoven Violinkonzerte"

Jovem violinista alemã faz gravação impecável em CD

Arabella Steinbacher interpreta músicas de Berg e Beethoven com virtuosismo

SIDNEY MOLINA
CRÍTICO DA FOLHA

Foi o compositor Robert Schumann (1810-1856) quem escreveu que "a estética de uma arte é a das outras; só o material é diferente". No meio do segundo movimento do "Concerto para Violino", de Alban Berg (1885-1935), depois do ponto culminante, a linguagem atonal dá lugar a uma citação, totalmente instrumental, do coral "Es ist Genug" (já basta), extraído da "Cantata" BWV 60, de Johann Sebastian Bach (1685-1750). A partitura traz um preciosismo: abaixo de cada nota, Berg coloca também o texto do coral, como se a intenção das palavras pudesse ecoar através da melodia.
Com o "Concerto para Violino" op. 61 de Beethoven (1770-1827), a obra integra o CD da jovem violinista alemã Arabella Steinbacher à frente da Orquestra Sinfônica WDR de Colônia, sob a direção do maestro letão Andris Nelsons. O aforismo de Schumann comenta a construção (típica do século 19) de um "sistema das artes", para o qual uma essência comum, a "Poesia", poderia transcender a especificidade das diferentes linguagens.
Que o "Concerto" de Berg, escrito em 1935 -entre as ruínas de uma guerra e a premonição de outra- tentasse juntar a seu modo os cacos do romantismo com o dodecafonismo (técnica desenvolvida nos anos 1920 por Schoenberg, que consiste em ordenar as 12 notas da escala em uma série que serve de estrutura para a construção da peça) é um paradoxo que não foi bem aceito pelos formalismos dos anos 40 e 50. Alheio a essas discussões, o "Concerto" foi um sucesso já na estreia.
A interpretação que Arabella Steinbacher faz dele também é impecável. Seu som não perde a beleza nas passagens virtuosísticas, e a maturidade que demonstra faz lembrar o violinista Isaac Stern (1920-2001), responsável pela lendária gravação do concerto de Berg sob a regência de Leonard Bernstein.
No trecho do coral de Bach (faixa 2, a partir de 7m20) ela encontra recursos expressivos adicionais, e parece preferir enfrentar com delicadeza a crise entre o verbal e o puro som, sem tentar forçar o indizível. O "Concerto" de Beethoven merece igual atenção, e soa mais leve do que de costume ao seguir -na inversão cronológica proposta pelo disco- o de Berg.
Filha de uma cantora japonesa e do pianista da Bayerische Staatsoper, Steinbacher nasceu em Munique em 1981, e começou a estudar violino aos três anos, pelo método desenvolvido pelo grande educador japonês Shinichi Suzuki (1898-1998). Sua discografia tem crescido com rapidez, e um CD com obras de Dvorák e Szymanowski foi lançado praticamente junto com este. Nos dois trabalhos ela utiliza um espetacular Stradivarius de 1716.
Seria impossível que o álbum atingisse essa qualidade sem a competência do jovem regente Andris Nelsons com a Sinfônica WDR: além do rigor com as dinâmicas e a homogeneidade entre os naipes, ele sabe oferecer, generosamente, todo o espaço necessário para abrigar a arte de Arabella Steinbacher.


BERG & BEETHOVEN VIOLINKONZERTE

Artista: Arabella Steinbacher / WDR Sinfonieorchester Köln / Andris Nelsons
Lançamento: Orfeo
Quanto: R$ 97, em média
Avaliação: ótimo




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