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DISCOS LANÇAMENTOS
Bob Dylan, a pureza imaculada
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local
Para capitalizar uma anunciada
vinda de Bob Dylan ao Brasil, a
gravadora Sony redescobre em seu
baú o álbum triplo "The Bootleg
Series Volumes 1-3", lançado em
91, num formato bem mais pomposo que o caixotinho atual.
Já se tratava, na origem, de capitalização de gravadora. O apanhado de 58 gravações raras ou inéditas do artista norte-americano
veio ao mundo como manobra para tentar refrear o comércio de piratas (os "bootlegs" a que o título
se refere) que borbulha à sua volta.
A Sony brasileira leva sorte adicional: a edição da caixinha coincide com a boa acolhida de "Time
Out of Mind", álbum mais recente
de Dylan, entre os votantes do
prêmio musical Grammy.
Não precisava nada disso. Se
gravadoras pensassem a sério em
algo além de dinheiro (leia texto
ao lado), "The Bootleg Series" seria um lançamento sensato, só.
Sabe-se, por inúmeros exemplos, que takes alternativos, versões demo e gravações ao vivo
quase sempre deixam a desejar.
Pode até ser o caso dos de Dylan,
mas aqui se fala de história.
Concorre para isso o fato de que
38 das faixas são (ou melhor,
eram, em 91) inéditas em álbuns
oficiais. A maioria foi retirada de
sessões de gravações de seus discos e preteridas nos lançamentos.
O exemplo mais expressivo é
"Talkin' John Birch Paranoid
Blues", que a gravadora ejetou na
última hora do álbum "The Freewheelin' Bob Dylan" (63), devido
a alusões ao comunismo e a Hitler.
Dessa fase -62, 63- se extrai o
melhor filão do pacote. Até a sexta
faixa do segundo CD, o que se tem
é um músico folk desacompanhado, alternando vocal, violão, harmônica, um ou outro piano. Tudo
muito simples, tudo muito rústico
-um retrato do primeiro Dylan.
Avizinha-se já o propalado poeta, mas também o artista quadrado que ele nunca deixou de ser. O
"politicamente correto" já avança
no jovem Dylan, não raro domado
por alguma modalidade individualista de espírito patriótico, familiar e/ou cristão que nem a frequente ironia pôde abafar.
Só na faixa 7 do CD 2, "If You
Gotta Go, Go Now", vem se instalar estrutura de banda. Tal coincide com o Dylan circa 1965, que
perfurava uma simbologia mais
cosmopolita em álbuns como
"Bringing It All Back Home" (65),
"Highway 61 Revisited" (65) e
"Blonde on Blonde" (66).
"She's Your Lover Now", que ficou de fora do festejado "Blonde
on Blonde", rende evidências de
que a mitologia que localiza nessa
fase o melhor de Bob Dylan não
parece nada infundada.
"I'll Keep It with Mine", criada
em 64 para Nico, aparece na voz
fanha de Dylan como revelação a
mais, profunda e descomprometida ("não posso fazer nada/ se você
achar que sou estranho/ se digo
que não amo você pelo que você é/
mas pelo que você não é") -e registrada (coincidência?) em 65.
Bem, daí adiante entram os anos
70, irregulares, e os 80, mais irregulares ainda. O lote de três canções que ficaram de fora do medonho álbum "Shot of Love" (81), em
especial, é pura melancolia.
No cômputo, o contraste entre o
Dylan de antes e o de agora evidencia, entre altos e baixos, ainda
um artista linear -um gênio, diriam os fanáticos, mas tal afirmação é questionável. Para ouvidos
brasileiros, é muito caubói e gaita
a emoldurar a decantada poesia
dylaniana. Tem gente que gosta.
Caixa: The Bootleg Series Volumes 1-3
Artista: Bob Dylan
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 60, em média (3 CDs)
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