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São Paulo, sábado, 03 de maio de 2003

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CRÍTICA

Autor faz um elogio à diversidade da percepção

SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

Pesa contra o crítico o duplo estigma de ser aquele que, em poucas horas de trabalho, pode inviabilizar meses de criação e, por outro lado, ao se pautar apenas por parâmetros consagrados, ter uma espécie de cegueira sistemática diante do inovador. Por isso, há uma certa expectativa irônica quando uma coletânea de críticas é publicada: saindo do reino do efêmero, do jornal que embrulha o peixe no fim do dia, a crítica se torna alvo da crítica. É chegado o momento de checar, com o distanciamento no tempo, o quanto se errou ou se acertou nos diagnósticos e prognósticos.
O interesse é maior quando esse crítico tem a importância de Sábato Magaldi, cuja polivalência fica clara nesse "Depois do Espetáculo", antologia de críticas e palestras organizada por temas e não cronologicamente. Superando a mera atribuição de valores, o crítico se situa "depois do espetáculo", livre da obrigação de recomendar ou não a montagem.
Sábato se mostra então seguro não só na apreciação crítica de autores consagrados como Goldoni, Beckett e Brecht, além dos brasileiros Plínio Marcos, Maria Adelaide Amaral e seus colegas imortais da Academia Brasileira de Letras, mas ao traçar retratos de atores, de Duse a Fernanda Montenegro, assim como ao fazer a crítica dos críticos -de Léautaud, crítico francês do começo do 19, a Anatol Rosenfeld e Decio de Almeida Prado- ou dando dedicação especial à cenografia de Santa Rosa, Aldo Calvo ou dos tchecos Svoboda e Vychodil.
Lado a lado, as críticas de Magaldi revelam a sua meticulosidade. Não raro cita parágrafos inteiros do texto analisado, o que tem larga função didática. Não se reduza porém sua importância a uma prudência acadêmica. Quando desafiado, sabe se mostrar um polemista vigoroso. A polêmica com José Celso Martinez Corrêa, em torno de "Gracias Señor", que fecha o volume, supera o anedótico quando o obriga a explicitar o princípio que o norteia: o elogio à diversidade.
Enquanto ao artista se perdoa previamente a defesa apaixonada de uma linha de pesquisa particular, o crítico deve se manter sempre aberto a qualquer estética, cobrando apenas coerência interna. Assim, seguindo o princípio do mestre Decio de Almeida Prado, de "acreditar no Destino com os gregos", louva em Brecht a luta contra a opressão tanto quanto em Ionesco a defesa do individualismo. E assume, entre o orgulho e a humildade, o direito de errar do crítico. Cabe agora ao leitor julgar o quando acertou Magaldi.


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