São Paulo, terça-feira, 03 de maio de 2005 |
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FERNANDO BONASSI Os filhos da mãe
Não é agora, que se aproxima
vosso dia grandioso, que vamos ficar aqui chorando o precioso leite derramado em nosso benefício, reiterando o sacrifício que fizeram ao nos desejar, nos gerar,
nos gestar e nos criar... Acontece,
no entanto, que ficamos malcriados. Não foi por falta de aviso, de
cuidado ou de educação, que nem
todos tivemos, mas pelo que fizemos de nós mesmos, quer as senhoras quisessem, quer não. Até
que fomos sãos em vossos braços,
no calor dos seios dos colos e entregues ao langor de vossos beijos,
mas apesar de todos os gracejos recebidos, há muitos que perderam
o juízo ou caíram em desgraça assim que cresceram nas calças e puseram as mangas para fora de casa. Os mais burros dentre os pobres de carga atacaram escolas do
Estado, roubando dos outros coitados a mesma esmola do saber;
alguns agrediram professores mal
pagos com a ignorância de renegados que não querem aprender;
os menores mesquinhos que puderam contar com instrução particular não saíram maiores do que
entraram para estudar, pois há
mais pequenos sacanas entre os
grandes bacanas que podem pagar para passar do que entre os
bananas que barganham baganas
para esquecer que vão estacionar,
repetir, parasitar. Ficam assim como insetos em volta das lâmpadas, à mercê da mendicância e a
fumar cigarros cancerosos achando que posam de gostosos ou cheirando a farinha da merenda
amassada pelo Diabo do pão. São
os seus filhos, mas não são a sua
evolução. Muitos procuram por
vós entre as mulheres e não encontram melhores, arrastando-se em
Édipos intermináveis, tornando-se adultos insuportáveis de quereres impossíveis. Dormem até tarde
quando deviam estar bem acordados e em pé, exigem café na cama,
fazendo-as de empregadas confinadas, dão trabalho para arranjar um nada de emprego, fazem
de conta que tudo compram
quando se vendem e ainda querem riquezas... mas se defrontam
com avareza dos salários pagos
pelos filhos daquelas outras, mais
folgadas, perdidas ou taradas. As
senhoras sabem muito bem que
há filhos da mãe de todo tipo: são
traficantes que se consomem em
carreiras de cocaína, são carreiristas que se exibem em surdina nas
revistas, são terroristas que se explodem em usinas, espalhando
moléstias e vísceras calcinadas;
são jovens miseráveis que roubam
velhas aposentadas nas esquinas
mais manjadas; são até mesmo esses assassinos disfarçados de fardas ou gravatas matando a esmo
nas avenidas das mamatas ou juizes togados que agem como ladrões mancomunados nas piores
decisões dos tribunais venais, aplicando na veia essas leis penais que
segregam pais e filhos onde todos
deveriam dar a cara para bater ou
ajoelhar no milho ao menos uma
vez... @ - fbonassi@uol.com.br Texto Anterior: Crítica: Grupo faz "música de Deus" Próximo Texto: Dança: Projeto quer público perto da dança contemporânea Índice |
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