São Paulo, segunda-feira, 03 de setembro de 2007

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Leveza de Rohmer destoa em Veneza

Festival também assistiu às novas obras de Ken Loach e Paul Haggis, marcadas pelo esquematismo de denúncias sócio-políticas

Filme do francês é poético, enquanto novas fitas de inglês e americano tratam de questões de imigrantes e efeitos da Guerra do Iraque

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA, EM VENEZA

Dois legítimos representantes da grande tradição do cinema de autor europeu -o francês Eric Rohmer e o inglês Ken Loach- e um nome em ascensão na indústria do cinema americano -Paul Haggis- marcaram o quarto dia da competição do Festival de Veneza.
Aos 87 anos, Rohmer não veio defender pessoalmente "Les Amours d'Astrée et Céladon" (seu 27º longa-metragem), mas mandou uma mensagem justificando a ausência: "Veneza já honrou muitos de meus filmes [...]. Já recebi até um Leão de Ouro especial pelo conjunto de minha obra. Mas não quero que ninguém pense que vou começar uma criação de leões. Apenas meu precário estado de saúde me impede de estar com vocês para acompanhar Astrée e Céladon, levados a Veneza pelo vento que eu gosto tanto de filmar, e que talvez sintam passar pela laguna".
O bilhete de Rohmer soou especialmente comovente dado o frescor e a leveza de seu filme, em nada parecido com a obra de um homem velho. A partir de um clássico da literatura francesa escrito por Honoré d'Urfe no começo do século 17, o diretor retoma o estilo dos outros filmes de época de sua carreira, recusando-se a encenar diante da câmera uma representação pseudo-realista do passado. Prefere investir em um visual inspirado em pinturas e gravuras da mesma época e em diálogos não-atualizados, que mantêm a poética muito particular do período.
Com toda sua poesia, o filme de Rohmer pareceu deslocado.
Os outros dois filmes da competição exibidos no sábado reafirmaram a vocação política dessa 64ª edição do Festival de Veneza. Em "It's a Free World", Ken Loach ataca a maneira hipócrita com que o trabalho dos imigrantes ilegais é encarado na Inglaterra.
Em seu primeiro trabalho depois da Palma de Ouro em Cannes (pelo drama histórico "Ventos da Liberdade"), Loach narra a história de uma jovem desempregada que monta sua própria agência de empregos -para acabar reproduzindo, com os imigrantes, as formas de opressão que havia sofrido.
Paul Haggis, por sua vez, apresentou seu primeiro filme depois do Oscar de "Crash - No Limite". Em "In the Valley of Elah", Tommy Lee Jones interpreta o pai de um jovem veterano da Guerra do Iraque, brutal e misteriosamente assassinado pouco depois de voltar aos Estados Unidos. O personagem de Jones acaba descobrindo horrores que vão contra seu conservadorismo. O "vale" do título original é a região em que se passou a história bíblica de Davi e Golias, onde hoje estaria situada Bagdá -uma "parábola" que pretende engrandecer a relevância do filme.
As boas intenções das denúncias sócio-políticas de Loach e Haggis resultam um tanto esquemáticas, na medida em que impõem ao comportamento de seus personagens atitudes que só se justificam para comprovar suas teses.


O jornalista PEDRO BUTCHER se hospeda a convite do Festival de Veneza

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