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Leveza de Rohmer destoa em Veneza
Festival também assistiu às novas obras de Ken Loach e Paul Haggis, marcadas pelo esquematismo de denúncias sócio-políticas
Filme do francês é poético, enquanto novas fitas de inglês e americano tratam de questões de imigrantes e efeitos da Guerra do Iraque
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA, EM VENEZA
Dois legítimos representantes da grande tradição do cinema de autor europeu -o francês Eric Rohmer e o inglês Ken Loach- e um nome em ascensão na indústria do cinema
americano -Paul Haggis-
marcaram o quarto dia da competição do Festival de Veneza.
Aos 87 anos, Rohmer não
veio defender pessoalmente
"Les Amours d'Astrée et Céladon" (seu 27º longa-metragem), mas mandou uma mensagem justificando a ausência:
"Veneza já honrou muitos de
meus filmes [...]. Já recebi até
um Leão de Ouro especial pelo
conjunto de minha obra. Mas
não quero que ninguém pense
que vou começar uma criação
de leões. Apenas meu precário
estado de saúde me impede de
estar com vocês para acompanhar Astrée e Céladon, levados
a Veneza pelo vento que eu gosto tanto de filmar, e que talvez
sintam passar pela laguna".
O bilhete de Rohmer soou especialmente comovente dado o
frescor e a leveza de seu filme,
em nada parecido com a obra
de um homem velho. A partir
de um clássico da literatura
francesa escrito por Honoré
d'Urfe no começo do século 17,
o diretor retoma o estilo dos
outros filmes de época de sua
carreira, recusando-se a encenar diante da câmera uma representação pseudo-realista do
passado. Prefere investir em
um visual inspirado em pinturas e gravuras da mesma época
e em diálogos não-atualizados,
que mantêm a poética muito
particular do período.
Com toda sua poesia, o filme
de Rohmer pareceu deslocado.
Os outros dois filmes da competição exibidos no sábado reafirmaram a vocação política
dessa 64ª edição do Festival de
Veneza. Em "It's a Free World",
Ken Loach ataca a maneira hipócrita com que o trabalho dos
imigrantes ilegais é encarado
na Inglaterra.
Em seu primeiro trabalho
depois da Palma de Ouro em
Cannes (pelo drama histórico
"Ventos da Liberdade"), Loach
narra a história de uma jovem
desempregada que monta sua
própria agência de empregos
-para acabar reproduzindo,
com os imigrantes, as formas
de opressão que havia sofrido.
Paul Haggis, por sua vez,
apresentou seu primeiro filme
depois do Oscar de "Crash - No
Limite". Em "In the Valley of
Elah", Tommy Lee Jones interpreta o pai de um jovem veterano da Guerra do Iraque, brutal
e misteriosamente assassinado
pouco depois de voltar aos Estados Unidos. O personagem de
Jones acaba descobrindo horrores que vão contra seu conservadorismo. O "vale" do título original é a região em que se passou a história bíblica de Davi e Golias, onde hoje estaria situada Bagdá -uma "parábola" que pretende engrandecer a relevância do filme.
As boas intenções das denúncias sócio-políticas de Loach e
Haggis resultam um tanto esquemáticas, na medida em que
impõem ao comportamento de
seus personagens atitudes que
só se justificam para comprovar suas teses.
O jornalista PEDRO BUTCHER se hospeda a convite do Festival de Veneza
LEIA CRÍTICA DE "CASSANDRA'S DREAM", NOVO FILME DE WOODY ALLEN www.folha.com.br/ilustradanocinema
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