UOL


São Paulo, segunda-feira, 03 de novembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

4ª BIENAL DO MERCOSUL

Mostra derrapa ao atrelar identidade a países distintos

TIAGO MESQUITA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Por si só, a quarta edição da Bienal do Mercosul é um fato importante. Permite um contato mais franco com a produção dos nossos vizinhos.
A arte brasileira recente é posta ao lado da dos outros artistas latino-americanos (nas mostras nacionais), de medalhões do continente (nas exposições "Icônicas"), além de incorporar outros nomes de países de fora da América Latina (como alguns artistas da exposição "Transversal").
A curadoria busca estabelecer um novo acordo diplomático na visualidade sul-americana. A conversa não seria mais pautada pelas questões levantadas pelo eixo do norte. As referências ao núcleo central da arte permaneceriam.
Mas, ao procurarmos relações entre trabalhos recentes argentinos, uruguaios, mexicanos, paraguaios e brasileiros, poderíamos levantar outra ordem de discussão. Abordaríamos questões que produções dos países centrais não dão conta, fortalecendo uma conversa em outro eixo, sem ficar a reboque das vogas dos países centrais nem sob a desconfortável posição do exótico, atribuída pelo multiculturalismo.
Essa possibilidade, anunciada pela curadoria, não aparece como defesa de um regionalismo. Pelo contrário, é uma visão otimista e internacionalista.
Talvez venha da promessa de uma produção mais universal, como a das abstrações geométricas no Brasil e na América Latina. Que não se curvem a cores locais e respondam à produção internacional de igual para igual.
Nesta exposição, esse caráter universal, surgido no meio do século 20, é representado por Lygia Pape e Maria Freire.
Por outro lado, a mostra traz um importante movimento para o Brasil. A iniciativa é descentralizada, sai das maiores cidades do Sudeste e se mostra muito bem em Porto Alegre. Forma público e profissionais de arte-educação e de montagem de exposições.
A formação de um meio moderno, com autonomia regional e possibilidade de reflexão sobre a arte, em todos os níveis, me parece louvável. No entanto, a bienal derrapa no risco ao atrelar uma origem e uma identidade comum a países tão diferentes.
Deixamos de ser parceiros, gente que inquieta uns aos outros e voltamos a ser "hermanos". Não por acaso, Orozco é o astro da mostra. Acaba parecendo um paladino que irá unificar a arte latino-americana desde o período pré-colombiano até hoje.
Isso não parece ser posição da curadoria, mas aparece em trabalhos e no interesse "diplomático" da mostra. Como se coubesse a nós a anedota cultural que o mundo desenvolvido determinou.
Contudo muitos trabalhos parecem falar dessa consciência altiva dos países em desenvolvimento no mundo internacional. Ao modo de um grupo de Cancún das artes, Tato Taborda, José Damasceno, Virgínia Errazuriz, o coletivo Terceruquinto, Laércio Redondo, entre outros, falam à arte de igual para igual, têm alternativas para o mundo. Interessam-se por ele, não em se reconhecer como filhotes de um funil genético.


Tiago Mesquita é crítico de arte
4ª Bienal de Artes Visuais do Mercosul
  
Onde: Usina do Gasômetro, Cais do Porto, Museu de Arte do Rio Grande do Sul, Memorial do Rio Grande do Sul e Santander Cultural, em Porto Alegre (RS)
Quando: de ter. a dom., das 9h às 21h; até 7 de dezembro
Quanto: entrada franca
Site oficial: www.bienalmercosul.art.br






Texto Anterior: Mônica Bergamo
Próximo Texto: Multimídia: "Metacorpos" exibe o corpo globalizado
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.