São Paulo, domingo, 03 de dezembro de 2006

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Mônica Bergamo

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Dou-lhe uma... ...duas... ... três...

João Sal/Folha Imagem
Leilão de James Lisboa, há duas semanas: 220 pessoas na platéia e uma obra de Frans Krajcberg vendida a R$ 220.500


O número de leilões de arte dobra na cidade, atraindo "fornecedores" de obras como o filho de Carlos Larcerda

"Duzentos e oitenta mil, 280 mil. Quem vai levar? Só R$ 280 mil! Isso aqui é vendido por muito mais lá fora. Vamos, gente!" Assim o leiloeiro James Lisboa tentava vender a escultura "Relevo 213", de Sérgio Camargo, em um leilão nos Jardins realizado dias atrás. Na platéia, 220 pessoas. Só neste mês, estão agendados pelo menos sete leilões de arte na capital. Segundo o leiloeiro Reinaldo Marques da Silva, o número de leilões quase dobrou do ano passado para cá, de 40 para 70. O público aumentou 30%. O motivo? "O público que consumia arte era mais restrito, herdava o gosto dos pais. Hoje as pessoas jovens estão mais expostas a várias informações. Se interessam por arte contemporânea. Abrem a mão e gastam."
 

Uma senhora olha para o lado e acena para um homem, cumprimentando-o. O leiloeiro se empolga: "Ali, à minha esquerda, a senhora de blusa branca dá um lance de 281 mil". Silêncio no salão. "Ah, não, ela está só dando um "oi'", lamenta James. "Sombra", de Frans Krajcberg, é vendida pelo preço mais alto da noite: R$ 220.500. Na mesma semana, na Christie's, em NY, uma obra de Krajcberg foi vendida por valor semelhante. "Mas a obra mais barata da Christie's vale mais que o total que os leilões brasileiros arrecadam", diz o leiloeiro Jones Bergamin, da Bolsa de Arte do Rio.
 

Além de lotarem leilões na cidade, os paulistanos são também a maioria do público consumidor da obra de arte vendida no Rio. "Eles são 70% dos compradores dos leilões da Bolsa de Arte do Rio", diz Bergamin. E boa parte das obras vendidas em leilões de SP vem de coleções cariocas. "Separação, morte e falta de espaço são os motivos que levam as pessoas a vender suas obras", diz Soraia Cals, galerista do Rio.
 

O editor Sebastião Lacerda, 64, filho de Carlos Lacerda, enviou 30 obras para um leilão no mês passado, muitas delas herdadas do pai. "Resolvi me desfazer delas por falta de espaço. Eu tinha obras que ficavam guardadas no armário." Com a venda de trabalhos de Carlos Vergara, Rodolfo Amoedo e Rubens Gerchman, Lacerda faturou cerca de R$ 80 mil. "Foi melhor do que se continuassem mofando comigo", afirma o editor -cujo pai, protagonista dos grandes fatos históricos das décadas de 50 e 60, acabou voltando ao centro do debate na campanha eleitoral deste ano. "Faltou mesmo um Carlos Lacerda nesta campanha", afirma o filho, repetindo Fernando Henrique Cardoso. "Os candidatos eram frouxos."
 

"Tem muita gente que vem [ao leilão] e não dá nenhum lance", diz o analista de investimento André Salgado, 33. "A gente chama esse povo de "caroço'", conta. Ele, aliás, freqüenta leilões há três anos e só comprou sua primeira obra no leilão organizado por James Lisboa: uma tela de José Roberto Aguilar, por R$ 8.500.
 

"Vim pelo Vik Muniz, mas não comprei nada", dizia, no mesmo leilão, a galerista Regina Casillo. "Para nós, brasileiros, R$ 115 mil [lance inicial da obra de Muniz] é muito. Mas, em NY, tem quem pague." Ela achou "exagerado" um lance de R$ 110 mil por Volpi. "Pegaram pesado."
 

Dos cerca de R$ 2 milhões arrecadados, em média, em leilões com 150 obras, 5% são do leiloeiro. Para a pessoa que deixa obras em consignação ficam até 80%. Os outros 15% são gastos na organização do evento. Só para imprimir 3.500 catálogos gasta-se até R$ 100 mil.
 

Muitos compradores -como, por exemplo, o banqueiro Roberto Setubal -fazem o lance sem sair de casa. "Tá" 8.000", diz, ao telefone, a assistente Eliana Chear, em leilão organizado pelo escritório Lordello & Gobbi, nos Jardins. "Tá" muita violência. Tem gente que prefere dar o lance de casa", diz o leiloeiro Luiz Carlos Moreira.
 

"Antigamente, era mais o evento social. Hoje é pão, pão, queijo, queijo", diz Moreira, referindo-se ao glamour dos leilões nos anos 70. "Eles eram no bufê Torres, com champanhe, uísque, comida... Na saída, tinha café e docinhos... As pessoas se arrumavam para ir. Hoje, só sobrou o uísque."
 

Nos fundos do escritório, as obras são enfileiradas no chão. "Já passou bem mais de R$ 1 milhão na minha mão", diz José Rodrigues, ajudante do leiloeiro Emerson Curi, que comandou o leilão do Lordello & Gobbi. É ele quem leva as obras do "depósito" à sala de leilão. "Se pudesse, teria um quadro de paisagem", diz. "Mas pagaria no máximo uns R$ 3.000. É besteira pagar mais."
 

"Vai, é agora!", diz Célia Ianelli, viúva de Thomaz Ianelli. Ela estava lá para ajudar o amigo Pérsio Correa a comprar uma tela de Ianelli. Emerson fala o lance inicial: "R$ 3.000". "R$ 3.100", diz Pérsio. No fundo, alguém grita: "R$ 3.200". "Vai, R$ 3.300", assopra Célia. Obediente, ele dá o lance. Mas o senhor ao fundo não desiste e a disputa aumenta de R$ 100 em R$ 100. Pérsio grita R$ 4.000, mas, quando seu "inimigo" fala R$ 4.500, Célia aconselha: "Agora pára." E Pérsio sai sem a obra. "Essa tela custa R$ 20 mil, mas ele tinha um limite", diz ela. "No leilão, é tudo de graça."
 

"Para quem quer gastar pouco, o melhor é o leilão de lance livre, que começa em R$ 100", diz Luiz Drigo, organizador do leilão Tableau. Nessas ocasiões, uma gravura de Fulvio Pennacchi pode sair por R$ 300. "Ou seja, nada", diz Drigo.


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