São Paulo, segunda-feira, 03 de dezembro de 2007

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"Eu sei que tive muita liberdade", diz cantora

Ana Cañas afirma que gravadora não interferiu em nada no CD de estréia

Para intérprete, que cantava na noite e recebeu elogios de Chico Buarque e Seu Jorge, pirataria faz empresas "repensarem caminho"

Bruno Miranda/Folha Imagem
Ana Cañas em seu apartamento no bairro Itaim Bibi, em São Paulo, decorado com quadros do marido, o caricaturista Flávio Rossi


RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

Se você, como a maioria dos mortais, não freqüenta o luxuoso bar do hotel Fasano, em São Paulo, há grande chance de o nome Ana Cañas não lhe dizer absolutamente nada.
Mas é provável que em 2008 você ouça muito falar dessa moça miúda de voz potente, capaz de juntar num mesmo figurino um vestidinho largo estampado, meia-calça cinza e sapato vermelho -e ficar bem.
Num tempo em que artistas surgem às dúzias no MySpace e a indústria fonográfica tenta se reorganizar, a jovem que cantava no Baretto virou "a" aposta de uma das maiores gravadoras do país. Ela tem 27 anos e, agora, um contrato para cinco discos com a Day1, braço criado pela SonyBMG para gerenciar a carreira de artistas.
O formato é ousado até para nomes consolidados -os mais comuns hoje são os contratos para um ou três discos. Com esse respaldo, ela acaba de lançar seu disco de estréia, "Amor e Caos", em que flerta, em faixas autorais, com uma espécie de MPB com groove, influências roqueiras e pegadas jazzísticas.
Enquanto artistas como Maria Bethânia e Lulu Santos abriram mão de grandes gravadoras em nome de mais liberdade, Ana acredita ter sido beneficiada pela "nova realidade".
"Tudo o que você viu no CD, tudo, foi assinado por mim. Assim como cheguei e disse "São essas músicas, esses arranjos", também disse "São essas fotos, esse layout"." Aliás, fotos feitas por seu irmão Rafael Cañas e encarte assinado pelo marido, o artista plástico Flávio Rossi.
"A internet e a pirataria fizeram as gravadoras repensarem o caminho", diz Ana, que, como qualquer garota de sua idade, baixa músicas na internet. "Meu trabalho é fruto de um momento de recolocação. Sei que tive uma liberdade maior."
Mesmo que essa liberdade inclua a idéia de ser empresariada pela gravadora. Foi a Day1, por exemplo, que agenciou o show que Ana faz nesta sexta, dia 7, no Morro da Urca, no Rio, em noite com Bebel Gilberto como atração principal.

Péssima atriz
Ana Cañas começou a cantar na noite há quatro anos, ao terminar o curso de artes cênicas na USP. "Sempre fui péssima atriz. E também não tinha o ímpeto de ser cantora, sabe?"
Até alguns anos atrás, nunca tinha ouvido Ella Fitzgerald; há poucos meses, não conhecia nada de Bob Dylan. Quando optou pela música, ao ser escalada para um espetáculo sobre jazz, foi para pagar contas. "Ele nunca foi montado, mas no teste descobri algo profundo." Tinha (enfim) conhecido Ella, referência-mor do "scat singing", o improviso com onomatopéias que Ana explora ao cantar.
Ao estudar canto e piano, pulou a parte em que mandaram prestar atenção no diafragma. "A última coisa que vou pensar enquanto estiver cantando é que tenho diafragma. Se pensar, não emociono ninguém!"
Resolveu ignorá-lo e se jogar na noite -para cantar, bem entendido. "Vi a realidade de cantar enquanto o cara ao lado está arrotando. Isso te põe cara-a-cara com questões profundas", diz, a sério. No Baretto, ouvintes mais educados incluíam Chico Buarque, Toquinho e Seu Jorge, para citar três que elogiaram seu desempenho.
Com idéias de gravar um CD, Ana vasculhou músicas de Djavan, Paulinho da Viola e Zé Kéti, e com nada se identificou. "Queria algo que falasse para as pessoas da minha idade", conta. Daí comprou um caderno para escrever suas letras, e foi quando começou a nascer o disco. A gravação de "Devolve, Moço" fez a ponte para a SonyBMG ao chegar às mãos do diretor artístico Bruno Batista.

Cantoras
Ana gosta de Regina Spektor e Céu, mas se empolga é com Amy Winehouse. "Ela canta bêbada, ela emociona. Ela é foda", diz, sobre a cantora que, no palco, não costuma estar em condições de pensar no diafragma.
Outra inspiração é Marisa Monte. "Para Todas as Coisas", esqueceram de avisar no encarte, é uma "homenagem" à cantora, com a mesma estrutura de letra e melodia de "Diariamente" (Nando Reis). "Eu ouvia a música e pensava: "Cada um pode ter sua própria "Diariamente". Quis fazer a minha", diz.


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