São Paulo, #!L#Sexta-feira, 04 de Fevereiro de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A indústria da loucura

Marlene Bergamo/Folha Imagem
A diretora Laís Bodanzky, que no próximo dia 15 começa a rodar em SP o filme "Bicho de 7 Cabeças", com investimento da Bennetton e o ator Rodrigo Santoro no papel principal



Benetton investe US$ 400 mil no longa brasileiro "Bicho de 7 Cabeças", inspirado em livro de ex-interno que hoje luta pelo fim dos manicômios


DANIEL CASTRO
da Reportagem Local

Segundo a sinopse "oficial", "Bicho de 7 Cabeças" será um filme "sobre as aventuras e desventuras de um adolescente urbano à caça de identidade numa cidade hostil e sem perspectivas".
Um argumento um tanto superficial, ou comum mesmo, para chamar a atenção da multinacional Benetton, que adora polêmicas -atualmente faz campanha contra a pena de morte. A Benetton está investindo US$ 400 mil na produção, que começa a ser rodada no próximo dia 15.
A história do pichador Neto, a ser vivido por Rodrigo Santoro, vai muito além do "conflito entre pai e filho, do abismo entre gerações", seu enredo principal.
O filme, primeiro longa de ficção de Laís Bodanzky, 30, pretende denunciar "o descalabro que é o sistema de saúde mental no Brasil", segundo o roteirista Luiz Bolognesi, 34.
A "indústria da loucura" consome cerca de R$ 400 milhões por ano dos cofres públicos só em internações. São mais de 60 mil leitos em 250 instituições manicomiais, onde morrem 1.200 pessoas por ano em decorrência de maus-tratos, da aplicação de eletrochoques e da tensão.
"Bicho de 7 Cabeças" é uma adaptação livre do livro "Cantos dos Malditos", obra autobiográfica do paranaense Austregésilo Carrano Bueno, hoje um militante da luta antimanicomial -que defende a transformação de hospícios em hospitais-dia (nos quais o paciente permanece apenas durante o dia) e o uso de tratamentos alternativos.
A história de Austregésilo se passa em Curitiba, em 1974. Ele é um adolescente de 17 anos, roqueiro, estudante do 3º ano do colegial (atual ensino médio). O pai flagra o filho com um baseado e o interna no manicômio, onde logo no primeiro dia, tido como esquizofrênico, toma 24 aplicações de eletrochoques. Virou um doente crônico.
Na versão para o cinema, a história se passa nos anos 90, na Casa Verde (zona norte de São Paulo). O garoto cabeludo agora é um pichador. O roqueiro virou rapper.
A diretora Laís afirma que tentou esconder o lado antimanicomial para não afastar investidores e para evitar polêmicas antes mesmo de começar a filmar.
"A loucura é a nossa grande chave, um tema delicado que ainda não amadurecemos. A equipe está sendo orientada para não estereotipar", afirma.
"Mas o tempo todo o que está em primeiro plano é o relacionamento pai e filho. O adolescente em crise pessoal, no labirinto da solidão. O pai que não compreende que está nascendo uma nova pessoa. O filho que não compreende esse pai. São dois mundos, uma relação que se deteriora, que vai ao fundo do poço, mas que se recupera", conta Laís.


Texto Anterior: Programação de TV
Próximo Texto: Filme quer atrair jovens
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.