São Paulo, sábado, 04 de fevereiro de 2006

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MEMÓRIA/"INTELECTUAIS E POLÍTICA NO BRASIL - A EXPERÊNCIA DO ISEB"

A história do Iseb, de JK à propaganda

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A história do Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) é a de uma organização que, em apenas nove anos de existência, entre 55 e 64, se transformou de candidata a "think tank" em arremedo de "agitprop".
Quando se fala em Iseb, portanto, é preciso perguntar: qual deles? O da primeira fase, até 59, coincidindo com o mandato de Juscelino Kubitschek, se propôs a pensar um modelo de desenvolvimento para o Brasil, com a contribuição de intelectuais de diferentes matizes ideológicos. O da segunda fase, o "último Iseb", esteve dominado por comunistas, cuja militância os colocou na mira dos golpistas de 64.
A cisão está refletida em "Intelectuais e Política no Brasil - A Experiência do Iseb", uma reunião de artigos de pessoas ligadas à história do instituto. Os autores divergem até sobre a própria existência de uma burguesia nacional nos anos 50, sem o que não faria sentido o projeto nacional-desenvolvimentista.
Hélio Jaguaribe, líder da primeira fase e defensor de um modelo capitalista de desenvolvimento, identificava uma burguesia nacional. O Partido Comunista Brasileiro também, e pregava sua aliança com a classe trabalhadora. Já o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, citado por Jaguaribe, discordava: para ele, o Brasil tinha uma burguesia internacionalizada que usava o nacionalismo apenas com fins retóricos para justificar vantagens e proteções. O sociólogo Jorge Miglioli, que participou da segunda fase, explica a diferença entre burguesia brasileira e nacional: a brasileira é apenas a que detém capital; a nacional está envolvida com a defesa dos interesses do país. Havia uma burguesia assim? "Se ela existia, então aderiu inteiramente às forças do golpe", conclui Miglioli.
Outro debate travado pelos autores é sobre a encampação do projeto isebiano pelo governo JK. Para Jaguaribe, foi isso o que aconteceu, "quase que formalmente". Já para a pesquisadora Alzira Alves de Abreu, houve uma defasagem: o projeto nacionalista chegou quando os tecnocratas de JK já tinham outro projeto, baseado na cooperação internacional. "Os integrantes do Iseb não perceberam a política econômica de Kubitschek como uma política em contradição com (suas) idéias. Foi a partir de 1958 que ficou mais claro que a política de Kubitschek era desenvolvimentista, mas não nacionalista."
O livro sofre com a irregularidade típica do formato. Além da excessiva redundância, há artigos estilisticamente pedregosos, como o de Candido Mendes, que destoam do tom mais coloquial dos depoimentos interpretativos. A ausência de um conjunto, porém, é compensada pelo resgate de idéias de um período efervescente.


Oscar Pilagallo, jornalista, é editor das revistas "EntreLivros" e "História Viva" e autor de "A História do Brasil no Século 20" (Publifolha)

Intelectuais e Política no Brasil - A Experência do Iseb
  
Organização: Caio Navarro de Toledo
Editora: Revan
Quanto: R$ 38 (264 págs.)


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