São Paulo, terça-feira, 04 de março de 2003 |
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Herói fora-da-lei
DIEGO ASSIS DA REPORTAGEM LOCAL A América pode dormir tranquila. Em uma cidadezinha do sul da Califórnia, ao lado da mulher, Suzanne Chorna, o ora degenerado Robert Williams não passa agora de um sessentão pacato, pintando quadros sob encomenda para uma lista de bacanas de Hollywood. Nos finais de semana, quando passeia com algum de seus carrões "hot rods" (veículos modificados) construídos pelo lendário Ed "Big Dady" Roth, o artista que ajudou a dar sentido ao termo underground, nos quadrinhos americanos, hoje só assusta ele mesmo. Não por muito tempo, a julgar pela nova exposição que Williams abre no final do ano em Nova York e pela antologia "Hysteria in Remission", que a editora americana Fantagraphics colocou nas prateleiras no mês passado. "Ninguém se lembra de mim por causa dos quadrinhos. Hoje vivo bem graças às pessoas que apóiam e gostam das minhas pinturas. Mas tem muita gente que odeia as minhas coisas. Sou provavelmente o artista mais odiado do país." Nessa outra lista, figuram os grupos feministas, a direita conservadora e o FBI, que no final dos anos 60 perseguiu Williams por ser um desertor em plena guerra do Vietnã e principalmente por suas ligações com a turminha da revista "Zap", que incluía Robert Crumb, S. Clay Wilson e Gilbert Shelton. "O artista underground nos anos 60 e 70 era um criminoso, havia drogas, pornografia e uma ética em ser fora-da-lei em um país que estava à beira do fascismo", contou o artista à Folha, em uma de suas raras e mal-humoradas entrevistas. "Há um mundo completamente diferente hoje. Passados 35 anos, não há um movimento jovem agressivo como antes. Certamente eles são contra essa guerra [contra o Iraque", mas suas causas pessoais são mais preciosas do que isso. Mas, se a batalha se arrastar muito, acredito que o velho quadrinho underground erguerá sua cabeça novamente." Alvo de um documentário em andamento, Williams, editor da conceituada revista de arte "Juxtapoz" e cuja mistura de linguagens pop e clássica acompanhou recentemente trabalhos de bandas de rock como Guns'n'Roses e Butthole Surfers, descansou seu pincel afiado por alguns minutos -"comecei a desenhar aos quatro anos e nunca mais parei"- e resolveu tirar proveito de sua segunda arma: o uso da palavra. O PESO DAS IMAGENS - "Eu olho
para os meus trabalhos da década
de 60 e 70 e fico orgulhoso, mas,
por outro lado, me assustam muito. A coisa toda parece muito intensa hoje. Os dias de bater pesado acabaram. Na literatura você
ainda pode, porque não é algo como uma foto ou uma pintura, que
está sempre lá para ser esfregada
na sua cara. Você precisa usar a
imaginação". ARTE COMO CRÍTICA POLÍTICA -
"Eu tento evitar isso. Sempre me
imaginei como um artista de belas
artes. Se você se envolve demais
com a política, a política muda e o
que você faz fica datado. Nos anos
60, sim, eu era muito mais rebelde. Havia uma tremenda repressão e os EUA estavam à beira de se
tornar uma nação fascista. A polícia tinha carta branca. Todos os
artistas sabiam que, se o país movesse um pouco mais para a direita, eles iam começar a reprimir indiscriminadamente as pessoas". GUERRA CONTRA O TERRORISMO
- "Sob um certo sentido eu sou um
patriota. E acho que os EUA foram justos ao atacar o Afeganistão para procurar o Osama bin
Laden. Mas arrastar essa guerra
para o Iraque é ridículo. Eu gosto
deste país, mas ele precisa ser vigiado como qualquer outro, porque sempre haverá a tendência de
se tornar excessivamente policiador. Tem dinheiro envolvido nessas decisões de governos, não é só
uma gangue de caras em busca de
vingança. O presidente Bush é um
texano, e o Texas é o maior Estado
petrolífero deste país". PAIXÃO PELOS "HOT RODS" -
"Não há muita intelectualidade
nisso. É só o meu gosto pela mecânica dos carros, pelo perigo de
dirigir rápido e o desafio de preocupar as autoridades nas estradas.
As mulheres adoram". FEMINISMO E PORNOGRAFIA -
"Eu provoco as feministas e elas
tentam me pegar só porque eu
pinto imagens de mulheres nuas.
E não vou parar de fazer isso. Antes do 11 de setembro, Bush e seu
grupo começaram a planejar um
gigantesco ataque à pornografia.
Eles tinham de ter um inimigo e
iam limpar a pornografia. Você
imagina o que aconteceria? A indústria de filmes pornôs fatura
hoje mais dinheiro do que todas
as produções milionárias de
Hollywood". SAIR DOS ESTADOS UNIDOS - "Para onde eu poderia ir? Você acha
que a França não tem seu lado nacionalista também? Canadá? Não
quero congelar até a morte no Canadá. E o Brasil também não é
uma das melhores economias do
mundo. Eu gosto do meu luxo.
Vocês têm leis severas contra a
pornografia aí no Brasil?!". |
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