São Paulo, quinta-feira, 04 de março de 2004

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MULTIMÍDIA

Projeto coordenado pelo crítico de cinema Jean-Claude Bernardet mostra monólogo de Annette Ramershoven

"Fátima" interpõe teatro e cinema sob mesmo texto

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A questão das fronteiras entre as formas de expressão, cada vez mais em pauta na cultura contemporânea, ganha estímulo para debate com o espetáculo e o filme homônimos "Fátima".
O público entra na sala, assiste ao curta-metragem de 27 minutos. À subida dos créditos, funde-se a encenação da peça, que dura meia hora. Dramaturgia e roteiro são tratados como monólogo.
"Fátima" é uma co-produção da Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (ECA), por meio do seu Núcleo de Dramaturgia Audiovisual (Nudrama), e o Centro Cultural São Paulo, onde o projeto estréia hoje na sala emblematicamente batizada com o nome do crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977).
O texto é da dramaturga e diretora alemã Annette Ramershoven. Foi selecionado na oficina de monólogos realizada em 2002 pelo Nudrama, coordenado pelo escritor, crítico de cinema e professor Jean-Claude Bernardet.
Peça e filme expõem o fluxo de consciência de uma mulher, dona de galeria de artes que sofre doença terminal e, presume-se, também atravessa crise conjugal.
A estrutura paralela de "Fátima" mantém o texto e atrizes, repetição que quer evidenciar as propriedades de cada linguagem.
No teatro, o monólogo contrapõe as vozes e as ações da mulher (Zezeh Barbosa) e da possível amante do marido, Luiza (Ondina Castilho), estagiária na galeria. Tudo se passa num apartamento.
Já o filme foca também o marido (João Carlos Andreazza), ampliando os planos. Além do ambiente fechado, há o tempo real da rua, onde o marido caminha angustiado, e o plano propriamente dos delírios de Fátima, enciumada de Luiza.
"O que o marido está supostamente fazendo ou vendo é o que ela vê. O subjetivo do personagem masculino é todo dela", diz Rossana Foglia ("Mutante", 2002), co-diretora do filme com Ramershoven. Evita-se também que a informação visual reitere a narrativa predominantemente em "off" da protagonista.
Como diretora da peça, Annette Ramershoven procura sair do realismo. "Interesso-me pelo subtexto, pela atitude da personagem. Busco outras janelas que o teatro permite", diz. Ramershoven, 40, está radicada no Brasil desde o início da década e desenvolve pesquisa ligada ao teatro-dança.
Em cena, o monólogo configura mais um "biólogo", como diz Zezeh Barbosa, comediante que experimenta registro de interpretação dramático. Fátima e a Luiza de Ondina Castilho, ex-atriz do CPT de Antunes Filho, chegam a ser confundidas, no bom sentido da cena.
"Uma coisa à qual queríamos absolutamente escapar é o mecanismo de adaptação. Nas duas linguagens, respeita-se o mesmo texto", diz Bernardet, 67.
O projeto reflete ainda a expressão teatro filmado. "[O crítico francês André] Bazin falava em "cinema impuro". [O cineasta dinamarquês Lars] Von Trier optou por um espaço teatral em "Dogville". Não vejo problema, não sou dogmático", diz Bernardet. No dia 11/3, após a sessão, ele participa de debate sobre "Fátima" com o dramaturgo Rubens Rewald e o crítico de teatro da Folha, Sergio Salvia Coelho.


FÁTIMA.
Cenografia, iluminação e direção de Arte: Roberto Eiti Hukai. Onde: Centro Cultural São Paulo - sala Paulo Emílio Salles Gomes (r. Vergueiro, 1.000, tel. 0/xx/11/3277-3611). Quando: estréia hoje, às 21h; qui. a sáb., às 21h; dom., às 20h. Quanto: R$ 10 (R$ 1,20 no dia 14/3). Até 21/3.



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