São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2005

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Cadão Volpato encontra sua MPB

BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO

Cadão Volpato é um homem que tem várias coisas para falar. Na enxurrada de palavras, nem sempre o conteúdo de seu discurso é interessante para ele mesmo. Trabalha como jornalista, profissão que encontrou para seguir vivendo a vida de contas a pagar.
Mas Volpato, 48, tem sua válvula de escape, talvez a sua verdadeira vocação. Nas brechas entre uma reportagem e outra, cria um tempo para expor sua veia criativa. É escritor e ficou mais conhecido pelo seu gogó -cantor, foi o vocalista do Fellini, uma das bandas paulistanas de menor sucesso, e mais cultuadas, dos anos 80.
Agora, parte para empreitada solitária. Encara, pela primeira vez, uma carreira solo, com "Tudo que Eu Quero Dizer Tem que Ser no Ouvido", disco simples, mas não simplório, composto apenas por voz e guitarra -tocada pelo próprio Volpato- e produzido por Maurício Bussab (do eletrônico Bojo). Como numa liberação de criatividade reprimida, o escritor/músico lança também novo livro, "Questionário", inspirado em Marcel Proust.
"Nessas horas, é como se eu fosse "O Médico e o Monstro", me alternando entre o artista e o jornalista. Aqui é o Brasil, não há meio-termo", diz Volpato.
Não surpreende, então, que o cantor desempenhe, na música, uma prática tão comum no jornalismo. Ele mesmo encarna o chamado "outro lado" da história -procedimento de reportagem em que o autor da matéria entrevista pessoas com opiniões conflitantes entre si sobre um tema.
À frente do Fellini, ele era o "outro lado" do então emergente rock brasileiro, de RPMs que lotavam estádios e Titãs que agradavam ao público e à crítica. "Éramos os chatos do período, nunca tivemos que ir ao programa do Chacrinha. Claro que nossa música não era feita para estourar..."
Hoje, ele se diverte com o revival dos anos 80 e artistas que retornam para faturar em cima da onda. "Esse mico eu não tenho que pagar, essa coisa de ficar mendigando a atenção do público, aqueles caras com barrigão competindo com o Felipe Dylon. Claro que eu adoraria viver de música e literatura, mas aquelas foram minhas opções na época [do Fellini], seja aquilo correto ou apenas esnobe."
"Tudo que Eu Quero Dizer..." tem o impacto da estranheza que fez o som do Fellini, mas caminha por outras direções. Volpato busca um caminho mais melódico, uma "MPB esquisita", em que a poesia de versos deliciosamente surrealistas -a melhor delas, "Carrossel", é inspirada em René Magritte- encontra o som limpo, mas ainda assim cortante, de uma guitarra acústica. De mansinho, Volpato entra na música popular brasileira de um Brasil utópico feito de sonhos.


Tudo que Eu Quero Dizer Tem que Ser no Ouvido
   
Artista: Cadão Volpato
Lançamento: Outros Discos
Quanto: R$ 25, em média


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