São Paulo, quinta-feira, 04 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NIRVANA

"Fragmentos de uma Autobiografia" traça perfil da vida do roqueiro grunge por meio de suas composições

Livro brasileiro disseca as letras de Kurt Cobain

THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Enquanto a viúva Courtney Love implica com o lançamento de canções inéditas do Nirvana, cabe ao meio literário a tarefa de, aos poucos, esmiuçar o importante legado deixado por Kurt Cobain.
Do Brasil, contribuição a essa missão aparece na próxima semana, quando chega às livrarias "Kurt Cobain - Fragmentos de uma Autobiografia", do jornalista Marcelo Orozco.
A partir da análise das letras cantadas pelo grupo, o livro traça um perfil daquele que foi o principal letrista-guitarrista-rockstar-herói de..., bem, quase todo mundo que se importa com rock.
Desde a época em que gravou o disco de estréia do Nirvana pela merreca de US$ 600 ("Bleach", em 89) até seu ápice ("Nevermind", 91) e manifesto antitudo ("In Utero", 93), Cobain sempre colocou em suas letras -muito mais do que qualquer outro de sua geração- as emoções e percepções pessoais que o afligiam, justificando, para Orozco, a forma como esta biografia foi feita.
"É interessante saber de onde surgiram as músicas, o contexto em que elas foram feitas, e não apenas dados da vida dele. Algumas letras têm versos fragmentados, meio soltos, e às vezes não se percebe a ligação com o que ele sentia no momento", diz. "Há também o lado niilista, uma herança do punk, que foi o que o motivou na carreira."
A "devassa" nas composições do ex-líder do Nirvana custou a Orozco seis meses, terminando em janeiro deste ano. Revistas, livros e sites na internet foram a base para a pesquisa. "Se eu tivesse que fazer uma biografia "a rigor", teria que estar no local, entrevistar quem estava perto dele. E esse tipo de biografia acaba passando por cima das músicas", explica.
Com esse método escolhido, o leitor é torpedeado com dados curiosos e reveladores, como no segmento destinado a "Serve the Servants", faixa que abre "In Utero". O verso "a raiva adolescente deu bons lucros" é uma alusão a um artigo sobre a banda publicado na revista "Rolling Stone" que dizia: "A alienação deu bons lucros ao Nirvana com "Nevermind'".
Essa mesma faixa é, para Orozco, uma das mais autobiográficas escritas por Cobain. "É onde ele fala explicitamente, pela primeira vez, da separação de seus pais. Outra no estilo é "On a Plain" [de "Nevermind"", que, mesmo feita de última hora, mostra bem sua personalidade ambígua", afirma.
Além da contextualização de cada letra dos seis CDs lançados pelo Nirvana, músicas que não entraram nos álbuns, lados B e covers também são decifrados. O autor ainda traça um ano a ano com os momentos mais relevantes da vida de Cobain e da banda.
A leitura de "Fragmentos" é mais uma evidência da razão pela qual o Nirvana exerce fascínio até hoje: as letras de Cobain o colocam lá em cima, ao lado de Lennon e Dylan.
Último detalhe. Sabe por que o primeiro disco do grupo, "Bleach", tem esse título? Numa passagem por San Francisco, Cobain, Krist Novoselic (baixista) e Dave Grohl (baterista) viram vários cartazes nas ruas com os dizeres "Bleach Your Works". Era uma campanha que recomendava aos usuários de drogas injetáveis que desinfetassem suas seringas para não contrair o vírus HIV. Num estalo, veio a idéia: nada se encaixaria melhor para batizar o álbum do que "bleach" (espécie de preparado químico usado para sanear e alvejar), que tem o poder de salvar vidas...


KURT COBAIN - FRAGMENTOS DE UMA AUTOBIOGRAFIA. Autor: Marcelo Orozco. Editora: Conrad. Quanto: R$ 34 (224 págs.).



Texto Anterior: Trecho
Próximo Texto: Mônica Bergamo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.