São Paulo, sábado, 04 de maio de 2002

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LIVRO/LANÇAMENTO

"Q - O CAÇADOR DE HEREGES"

Roberto Bui, do Luther Blissett, nega que projeto tenha sido inventado por escritor italiano

"Não assistimos às aulas de Umberto Eco"

DA REDAÇÃO

Leia a seguir entrevista com o italiano Roberto Bui, co-autor de "Q - O Caçador de Hereges". Por exigência dele, todas as respostas serão dadas em nome do coletivo Wu-Ming. (DIEGO ASSIS)

Folha - "Q" tem um ritmo bastante fluido, uma mudança constante de personagens e cenários. Quais foram suas influências?
Wu-Ming -
Primeiramente os livros de James Ellroy, cujas construções foram praticamente plagiadas em "Q". Depois, autores latino-americanos como Paco Ignacio Taibo 2º e Daniel Chavarria.

Folha - Uma das condições para publicar seus livros é a impressão de uma advertência contrária aos direitos autorais. Como impor isso a grandes editoras?
Wu-Ming -
A lógica do copyright tem de ser desafiada onde ela existir, na barriga da besta. Não faria sentido, político ou cultural, adotarmos uma prática marginal para os "poucos privilegiados" do underground esnobe. De qualquer forma, mantemos uma clara distinção entre os royalties -isto é, nosso percentual sobre cada edição vendida- e o direito do leitor de reproduzir a obra. Você pode scannear, digitar e colocar em seu site para outras pessoas baixarem de graça. Isso é possível até em nosso site. Mas, se você fizer as pessoas pagarem por isso, aí, sim, vamos processá-lo.

Folha - Como foi escrever esse romance a quatro mãos?
Wu-Ming -
Teria levado dez anos para cada um de nós fazermos toda a pesquisa histórica necessária para escrever algo como "Q". Em grupo, levou três anos.

Folha - Qual a relação desse processo com o conceito de linguagem tamariana, do seriado "Star Trek"?
Wu-Ming -
Os tamarianos se comunicam por meio de narrativas, de histórias compactas, de parábolas, em suma, de mitos. Construção de mitos, eis o que temos feito desde o início dos anos 90.

Folha - Existe alguma diferença entre os personagens "reais" e os "míticos" em "Q"?
Wu-Ming -
Todos os nomes que você leu podem ser encontrados nas crônicas originais da época.

Folha - É possível traçar uma fronteira entre ficção e realidade no romance?
Wu-Ming -
De jeito nenhum.

Folha - Luther Blissett, Harry Kipper, Wu-Ming. Qual é a importância de um nome?
Wu-Ming -
Ninguém sabe realmente o que é um nome.

Folha - Por que vocês se escondem atrás de uma identidade múltipla? Tem certeza de que não é o Umberto Eco?
Wu-Ming -
Não nos escondemos. Já falamos em público uma centena de vezes. Só não permitimos câmeras no recinto. Simplesmente não somos palhaços. Um certo Andrea Ridolfi redigiu um panfleto, em 1997, relacionando Luther Blissett a uma criatura de grupos judaico-maçônicos, anti-Cristo, antieuropeus etc. De acordo com ele, uma leitura detalhada (isto é, paranóica) dos trabalhos de Eco seria suficiente para perceber que foi Eco quem inventou Blissett, uma espécie de Frankenstein saído do departamento de semiologia. Na verdade, nenhum de nós Luther Blissett baseados em Bolonha assistimos às aulas dele.

Folha - Até que ponto ações promovidas na internet podem afetar eventos exteriores?
Wu-Ming -
Afetam muito. O novo movimento global anticapitalista, nascido das manifestações de Seattle em 1999, não teria sido possível sem a internet.


Q - O CAÇADOR DE HEREGES. Autor: Luther Blissett. Lançamento: Conrad Editora. Quanto: R$ 55 (598 págs.).



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