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São Paulo, sexta-feira, 04 de julho de 2003

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CINEMA

Ator fala sobre as dificuldades para o financiamento de suas produções e a oposição francesa à guerra no Iraque

John Malkovich amplia frentes de atuação

"Acho que a credibilidade decorre apenas de você ter uma conta bancária recheada. É assim que as coisas funcionam."

GEOFFREY MACNAB
DO "INDEPENDENT"

John Malkovich, 49, acaba de ser convidado a comentar a deterioração das relações franco-americanas decorrente da oposição francesa à guerra no Iraque. Na condição de americano residente na França e de ator que já foi visto nos filmes de arte mais rarefeitos da Europa e também nos filmes de estúdio mais estúpidos, é um tema que ele é capaz de enxergar.
""Quem insistiu que se entrasse na Bósnia para fazer alguma coisa, Bill Clinton ou Jacques Chirac? Vamos buscar um livro de história. Eu sei a resposta." Ele diz que a onda atual de sentimento antifrancês foi provocada por eles mesmos. "Quando você estapeia alguém 200 vezes e esse alguém dá o troco, não faz sentido se queixar. Quando você diz coisas duras, pode esperar ouvir o mesmo. Mas isso se aplica a ambos os lados. Essa história já se arrasta há 200 anos e é meio chata. Se eu a levo a sério? Não."
Ele não é autoridade em calma. As observações que fez em 2002 em Cambridge, dizendo que gostaria de dar um tiro no jornalista Robert Fisk ("The Independent") no Oriente Médio, e no deputado George Galloway, tiveram repercussão desastrosa.
Hoje ele demonstra um misto estranho de diplomacia e contestação, tanto assim que menciona a questão dos franceses diversas vezes. "Se me criticarem por 200 anos e eu os criticar de volta, não me importo se ficarem magoados ou não", diz ele. Mas faz questão de insistir que ainda é francófilo. Admite que está prestes a deixar a França, sim, mas por razões ligadas aos impostos.
Malkovich está sentado num iate no porto velho de Cannes. É o tipo de ambiente em que Tom Ripley, o psicopata elegante e culto que ele representa em "Ripley's Game" (adaptação de "O Talentoso Ripley", sem data de estréia no Brasil) se sentiria à vontade. Representado por Malkovich, Ripley é capaz de estrangular capangas russos e lidar com seu antigo parceiro britânico sem perder a pose.
Malkovich esteve em Cannes para anunciar um projeto da Mr. Mudd, a produtora que ajudou a fundar em 1998. "The Libertine" (O Libertino) é uma adaptação da peça de Stephen Jeffrey sobre John Wilmot, conde de Rochester, que viveu no século 17 e é tão famoso por ter morrido de alcoolismo e doença venérea aos 33 quanto por sua filosofia. No cinema, Malkovich será o rei Charles 2º e Johnny Depp, o protagonista.
"The Libertine", que será rodado em 2004, é "uma história contada de maneira muito forte, muito sexy, muito dark e muito malcheirosa". Seus potenciais financiadores acharam que cheirava mal demais. O filme parece ter encontrado financiamento, cinco anos após ser concebido.
Em 1998, quando Malkovich e seus sócios, os produtores Lianne Halfon e Russell Smith, criaram a Mr. Mudd, "The Libertine" foi um dos primeiros filmes que anunciaram. Ele foi concebido ao mesmo tempo que o filme de estréia de Malkovich na direção, "The Dancer Upstairs" (O Dançarino do Andar Superior, sem data de estréia no Brasil). Malkovich recebeu a promessa de apoio financeiro para ambos os filmes da empresa britânica J&M, hoje extinta. "Acho que ela não pretendia realmente fazer nenhum dos dois -só queria fazer o anúncio."
Quando a J&M não cumpriu o que prometera, a Mr. Mudd formou uma parceria com a Granada, mas o acordo caiu por terra quando a empresa de TV britânica decidiu que não iria mais produzir longas. Agora Malkovich e sua produtora estão com outra parceira britânica, a Odyssey. Ele acha que o filme será feito.
Cada filme que a Mr. Mudd produz é uma batalha. Malkovich diz que precisou convencer financistas céticos de que seria possível fazer "The Dancer Upstairs", sua adaptação do romance de Sebastian Shakespeare, de 1997, sobre o grupo terrorista peruano Sendero Luminoso, por US$ 5,3 milhões (cerca de R$ 14,95 milhões).
Malkovich se vê como alguém cujo dever é proteger cineastas jovens, como Dunmore. O projeto ficou pronto há dois anos mas só agora está sendo lançado. Malkovich diz que não entende porque levou tanto tempo. "Se a Mr. tivesse mais controle sobre o projeto, isso não teria acontecido", comenta o ator, que tem mais uma função de consultor criativo.
Quando "The Libertine" estiver concluído, ele vai enfrentar uma batalha ainda mais árdua para o financiamento do suspense cômico de Hugh Laurie "The Gun Seller" (O Vendedor de Arma), que será o maior projeto da Mr. Mudd até agora. "É difícil encontrar financiamento." E ele não nutre ilusão de que sua vida como produtor possa ser facilitada pelo fato de ser famoso. "Acho que a credibilidade decorre apenas de você ter uma conta bancária recheada. É assim que as coisas funcionam. Não adianta reclamar."


Tradução de Clara Allain


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