São Paulo, sexta-feira, 04 de julho de 2008

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Última Moda

ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@grupofolha.com.br

100% independente

Sonia Rykiel, que será homenageada em Paris com uma retrospectiva dos 40 anos de criação de sua grife, defende a liberdade do estilista na era dos grandes grupos de moda

DANIELA FERNANDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS

Em maio último, quando a França celebrava as quatro décadas do movimento estudantil de 68, a grife Sonia Rykiel também comemorou seus 40 anos.
Como os jovens daquela época, a estilista francesa fez sua própria revolução na moda, incitando as mulheres a criarem um estilo próprio, conforme a sua personalidade.
Em novembro, Rykiel será homenageada por suas quatro décadas na moda com uma exposição no Museu de Artes Decorativas, em Paris. A grife, uma das mais prestigiosas da Europa, faturou 105 milhões em 2007 (cerca de R$ 260 milhões), possui 50 lojas em vários países e é "100% independente", diz a estilista. A sua filha, Nathalie Rykiel, é a atual presidente da companhia. Em 2007, a alemã Gabrielle Greiss se tornou diretora de criação da marca.
Leitora voraz e autora de nove livros, Rykiel, quando criança, pensava em fazer teatro ou escrever. Nunca estudou moda e começou criando roupas de tricô para a loja de seu marido.
Um dia, a atriz Audrey Hepburn comprou na loja 14 peças de uma só vez, de diferentes cores. Em 1970, quando Rykiel já tinha uma butique própria, a publicação "Women's Wear Daily" a chamou de "rainha mundial do tricô".
A seguir, Rykiel, 78, conta como sobreviveu à perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra e explica por que não quis vender a sua grife para um grande grupo de moda. "É muito importante poder fazer seu trabalho sozinho, sem ter alguém nas tuas costas dizendo: "Faça isso ou aquilo'", afirma.

 

FOLHA - O que mudou no mundo da moda nos últimos 40 anos?
SONIA RYKIEL
- Tudo. Quando eu comecei, as roupas eram cortadas à mão, costuradas e depois alguém experimentava. Era esse o sistema. Hoje, as roupas são cortadas a laser e tudo é feito por computador, mesmo a definição das cores. No início, eu fazia roupa por roupa, uma peça de cada vez. Hoje, são feitas dez unidades de uma vez.

FOLHA - Por que a sra. nunca vendeu sua marca para um grande grupo de luxo ou financeiro?
RYKIEL
- Claro que recebemos ofertas, mas até o momento não quisemos vender. É muito importante poder fazer seu trabalho sozinho, sem ter alguém nas suas costas dizendo: "Faça isso ou aquilo".

FOLHA - Os grandes grupos sufocam a independência do estilista?
RYKIEL
- Não vendi até agora por esse motivo. Preservar a independência é muito importante. Mas, hoje, não fazemos mais projetos de longo prazo. A política e a economia internacionais não nos permitem saber o que o futuro nos reserva.

FOLHA - Que conselho a sra. daria para os estilistas que estão pensando em vender suas marcas?
RYKIEL
- Se os costureiros têm talento, eles podem fazer qualquer coisa. O talento não é algo simples. E é preciso ter muito talento para ser um estilista.

FOLHA - Por que a sra. decidiu interromper a sua linha masculina?
RYKIEL
- Por razões estratégicas decidimos nos concentrar na linha feminina Rykiel. Mas ainda não tenho a data do encerramento da linha Rykiel Homme nem do fechamento das lojas masculinas.

FOLHA - Seu trabalho sempre misturou moda e literatura?
RYKIEL
- Sempre. Fiz meus estudos secundários em um colégio literário. Foi muito difícil para mim criar moda. Era algo fútil. Não que eu não quisesse fazer isso, mas não teria encontrado tempo se não tivesse me casado com alguém que já trabalhava com moda. Então, aproveitei para atuar nos dois campos e continuo vivendo dessa forma. Tenho vários livros publicados e me sinto próxima dos escritores em relação ao trabalho que eles fazem. Isso quer dizer que eu acredito no que faço, no que crio. Não vou fazer algo apenas por fazer.

FOLHA - Quando começou a Segunda Guerra, a sra. tinha nove anos. Como viveu o período de perseguição aos judeus na Europa?
RYKIEL
- Nós fomos viver no campo. Ficamos escondidos em uma fazenda e fomos ajudados por uma outra família judia. Uma das primeiras coisas que a Gestapo fez foi apreender listas de nomes de judeus que integravam associações culturais, entre outras, que existiam principalmente em centros urbanos. Quem não participava de nenhuma associação ou movimento teve mais facilidade para passar incógnito. Eu nunca usei a estrela amarela, mas percebia que estavam acontecendo coisas muito graves.

FOLHA - Há 40 anos, a sra. incentivou as mulheres a criarem um estilo próprio. A proposta ainda é válida?
RYKIEL
- Ela não pode ser praticada da mesma maneira, mas o conceito das mulheres usarem a cabeça para pensar em uma moda adaptada aos seus corpos continua funcionando, desde que o costureiro coloque nas roupas tudo o que ele recebe da sociedade. Um vestido deve ser um caldo de cultura. Para mim, o que conta é estar atenta a essa mulher que eu sigo há 40 anos, que corresponde à minha mãe, à minha filha, às minhas amigas e a essas mulheres que, como eu, têm uma certa idéia da personalidade feminina -mulheres inteligentes, intelectuais, mas que gostam de sair, de cozinhar e de serem sedutoras. O que me interessa nas mulheres são suas particularidades, suas diferenças, que elas não sejam todas iguais.

Fast fashion

IMPÉRIO 1
Termina hoje a ótima exposição "Mulheres Reais - Modas e Modos no Rio de d. João 6º", na Casa França-Brasil, no Rio de Janeiro. Criada por Kika Gama Lobo, com curadoria da figurinista Emilia Duncan e consultoria de Bruno Astuto, a mostra conta de maneira muito didática e interessante a história da vestimenta no Brasil durante o Império.

IMPÉRIO 2
Parte das roupas de "Mulheres Reais" foi recriada para a exposição. Outras peças são originais e vieram de acervos de museus europeus. A mostra deve vir para São Paulo nos próximos meses.

PÓLO DELUXE
A nova edição da revista "Visionaire" homenageia a Lacoste, que faz 75 anos. A publicação traz imagens de 12 camisas pólo com estampadas criadas por um time de celebridades. Entre elas, Pedro Almodóvar, Karl Lagerfeld e o músico Michael Stipe, da banda R.E.M. A festa de lançamento, só para VIPs, rolou na quarta-feira, em Paris.


com VIVIAN WHITEMAN


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