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Jorge Furtado filma seu alter ego
Lázaro Ramos vive, em "Saneamento Básico", cineasta do interior que tenta se firmar na carreira sem ir para a capital
Com traço político, título está sendo rodado na serra gaúcha; "anarquista" tardio, Furtado pede que não sigam seu voto em Lula
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A BENTO GONÇALVES (RS)
"Saneamento Básico, o Filme" tem Jorge Furtado como
diretor e roteirista. E tem o ator
Lázaro Ramos como Jorge Furtado. Ou melhor, como o alter
ego de Furtado, no papel do jovem e empolgado cineasta Zico.
Zico vive no interior gaúcho e
dirige "O Monstro do Fosso",
impulsionado por uma verba
federal destinada a fomentar a
produção audiovisual em cidades de pequeno porte.
O ponto de partida da ficção
de Zico é a inexistência de um
sistema de tratamento de água
e esgoto na cidade, com suas
conseqüências sobre a vida e a
saúde dos moradores e seu efeito de restrição ao desenvolvimento da economia local.
"Há uma cena engraçadíssima em que ele diz: "Isso é para
provar que, para ser artista, não
é preciso mudar para Porto
Alegre!'", conta Furtado.
O paralelo com a vida do diretor é óbvio. No mapa do cinema
nacional, que tem o Rio de Janeiro como capital da produção, a Porto Alegre onde Furtado construiu sua carreira figura
como um interior longínquo.
"Saneamento Básico, o Filme" é o quarto longa-metragem de Furtado e o terceiro de
sua parceria com Ramos, que
protagonizou os dois anteriores -"O Homem que Copiava"
e "Meu Tio Matou um Cara".
O diretor conta que escreveu
cada personagem pensando no
ator que iria interpretá-lo. Decidiu permanecer no universo
da comédia, ambientada no inverno da serra gaúcha, onde o
longa está sendo filmado.
Desviou-se, assim, da trama
centrada no "garoto tímido que
quer conquistar um amor", comum aos seus três últimos filmes -os dois já citados e também o seu longa de estréia,
"Houve uma Vez Dois Verões".
Agora, cada personagem é
movido por um objetivo e tem
por trás de si um dos arquétipos
da commedia dell'arte. O diretor cita ambos -arquétipo e
objetivo, nesta ordem: "Marina
[Fernanda Torres] é a mulher
laboriosa, que quer provar ao
pai ser capaz de realizar uma
obra que ele mesmo não pôde;
Joaquim [Wagner Moura, casado com Marina] é o arlequim e
quer provar para Marina que é
um homem, não um menino;
Silene [Camila Pitanga] é a mocinha desfrutável, seu objetivo
é sair daquele lugar e ser uma
celebridade; Fabrício [Bruno
Garcia] é o galã que ser ser prefeito; Otaviano [Paulo José, pai
de Marina] é o nobre decadente, que quer morrer em paz; Antônio [Tonico Pereira] é o burguês ascendente, cujo negócio é
ganhar dinheiro".
Saudades de Lula
Em torno dessa trupe, Furtado escreveu seu roteiro que julga "o mais explicitamente político". Antes, as idéias à esquerda do diretor ficavam restritas à
sua atuação longe das telas.
Na campanha de 2002, quando a atriz Regina Duarte gravou
o depoimento em que afirmava
temer a vitória da candidatura
Lula da Silva, Furtado redargüiu com o manifesto "Eu Tenho Medo de Regina Duarte!".
Hoje, o diretor reitera tudo o
que disse, mas adota outro bordão: "Eu tenho saudades de Lula!". A explicação: "Naquele
momento, Regina Duarte estava expressando um medo da
mudança, não da continuidade,
que foi o que de fato ocorreu".
O fato de "o PT ter errado onde não podia, na questão ética",
mudou as feições da paixão política de Furtado. "Estou vivendo uma fase anarquista, um retorno adolescente de achar que
todo aquele que quer me governar é meu inimigo", afirma.
O desconforto com o processo eleitoral, no entanto, não o
levará a boicotar o pleito de outubro. Furtado revela seu voto
e faz um anticonvite: "Vou votar no Lula, mas ninguém precisa me seguir, não".
A jornalista SILVANA ARANTES viajou a convite da produção do filme
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