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Morre no Rio o fotógrafo Mário Carneiro, aos 77
Expoente do cinema novo sofria de câncer; corpo foi enterrado na tarde de ontem
Ele era também pintor, gravador e arquiteto e assina fotografia de clássicos como "O Padre e a Moça" e "Todas as Mulheres do Mundo"
Patricia Santos - 21.fev.1995/Folha Imagem
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O diretor de fotografia e cineasta Mário Carneiro, diante do cartaz de "Gordos e Magros" (1976), um dos filmes que dirigiu |
DA REPORTAGEM LOCAL
Morreu na noite de domingo,
em sua casa, no Rio de Janeiro,
o fotógrafo Mário Carneiro, um
dos expoentes do cinema novo.
Aos 77 anos, sofria de câncer.
"Estou arrasado. É a perda do
irmão mais velho que todos tínhamos", disse o cineasta Cacá
Diegues. Além de fotografar títulos seminais da corrente cinemanovista nos anos 50 e 60,
Carneiro atuou, "com seu senso crítico muito aguçado", conforme observa Diegues, como
interlocutor e conselheiro dos
autores desse período.
"Pintor de origem, ele fazia
da fotografia do filme uma linguagem, não um enfeite",
aponta o produtor e também
fotógrafo Luiz Carlos Barreto.
Além da pintura, Carneiro
exerceu, antes do cinema, as
atividades de gravador e arquiteto. Nascido em Paris, filho de
diplomata, ele alternou, na juventude, temporadas vividas
no Brasil e na Europa.
Depois de realizar amadoristicamente o filme "A Boneca",
foi incentivado a seguir a carreira no cinema pelo poeta Vinicius de Moraes, amigo de seu
pai, que assistiu ao título e avaliou que seu talento era mais
marcante no cinema do que nas
outras expressões artísticas.
O conselho de Vinicius e o caráter de "hit" que "A Boneca"
ganhou entre os intelectuais da
época foram lembrados por
Carneiro em longa entrevista
sobre sua carreira dada ao fotógrafo Lauro Escorel e publicada
na página da Associação Brasileira de Cinematografia
(www.abcine.org.br).
"Mário foi o primeiro diretor
de fotografia que conheci. Foi
vendo-o trabalhar que me
aproximei da arte da cinematografia. Um artista que, ao juntar à fotografia seu talento de
pintor, criou algumas das mais
belas imagens do cinema brasileiro", disse Escorel ontem à
Folha.
A estréia profissional de Carneiro no cinema brasileiro foi
com "Arraial do Cabo" (1959),
de Paulo César Sarraceni. A
parceria com o cineasta seria
repetida muitas outras vezes,
como em "Porto das Caixas"
(1961), "Capitu" (1968), "Natal
da Portela" (1987), "A Casa Assassinada" (1973) e "O Viajante" (1999).
É extensa também a parceria
de Carneiro com Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988),
para quem fotografou "Garrincha, Alegria do Povo" (1962), "O
Padre e a Moça" (1965) e o episódio "Couro de Gato" no longa
coletivo "Cinco Vezes Favela"
(1961), cuja "refilmagem" Cacá
Diegues coordena atualmente,
com o projeto "Cinco Vezes Favela - Agora por Eles Mesmos".
Carneiro assinada ainda a fotografia de dois importantes
longas do cineasta Domingos
Oliveira -"Todas as Mulheres
do Mundo" (1965) e "Edu, Coração de Ouro" (1966).
Antes do cinema novo, "a fotografia brasileira [em cinema]
não correspondia à luz brasileira", cita Barreto, que fotografou
"Vidas Secas" (1963), de Nelson
Pereira dos Santos.
"A busca que tínhamos era
no sentido de produzir uma fotografia mais representativa da
luz tropical", afirma Barreto.
"Eliminávamos todos os efeitos
típicos do mundo setentrional,
onde há falta e não excesso de
luz". O resultado é que "além de
ser um grande fotógrafo e grande pintor, Carneiro foi mestre
de tanta gente. Lauro [Escorel],
Afonso [Beato], Dib [Lutfi], todos foram discípulos dele", cita
Diegues.
Mesmo atingido pelo câncer,
Carneiro procurou prosseguir
com a carreira. Ele fotografou
"Harmada", de Maurice Capovilla, e o documentário "500 Almas", de Joel Pizzini, que estreou neste ano.
Recentemente, já abatido pela doença, suspendeu as atividades. "Nas últimas vezes em
que falei com ele, não pudemos
ter conversas longas, porque
ele se cansava rápido", afirma
Diegues.
Com Glauber Rocha, o maior
ícone do cinema novo, Carneiro realizou o curta-metragem
"Di", que foi premiado no Festival de Cannes, mas teve suas
exibições públicas interditadas,
a pedido da família do pintor Di
Cavalcanti, que considera a
obra ultrajante à memória do
artista.
Carneiro foi o câmera e diretor de fotografia do curta, que
registra o enterro de Di, no qual
Glauber executa uma feérica
performance narrativa.
"Por esses filmes e por muitos outros, como "O Padre a
Moça" e "Crônica da Casa Assassinada", ele seguirá conosco,
afirma Escorel.
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