São Paulo, sexta, 4 de setembro de 1998

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CINEMA ESTRÉIAS

"Garotas Selvagens" é bom, mas é uma porcaria

Divulgação
Neve Campbell (esq.) e Denise Richards, em cena de "Garotas Selvagens", no filme de John McNaughton


SÉRGIO DÁVILA
Editor da Ilustrada

"Garotas Selvagens" (Wild Things), que estréia hoje em São Paulo, é bom, mas é uma porcaria (o contrário seriam os filmes de Ed Wood, que eram uma porcaria, mas eram bons). O filme gira em torno da rica Kelly (Denise Richards, do fascistóide "Tropas Estelares") e da pobre Suzie (Neve Campbell, de "Scream" e da série de TV "Party of Five"), as tais "coisas selvagens" do título original.
Ambas são bonitas, gostosas e alunas do dublê de professor e rei da cocada preta Sam Lombardo (Matt Dillon, de qualquer filme), que acaba sendo acusado pela dupla de estuprá-las. Para investigar o caso, é chamado o detetive Ray Duquette (Kevin Bacon, faça-me o favor), que termina por se envolver com o trio.
As duas não são boas atrizes, principalmente Neve Campbell, com seu cacoete de semicerrar os olhinhos para fazer charme, mas só Richards aparece pelada, pois é menos famosa.
Os dois não são bons atores, principalmente Matt Dillon -se até hoje você suspeitava, mas não tinha certeza da canastrice dele, assista ao filme-, e Kevin Bacon ainda faz uma cena de nu frontal (faça-me o favor 2 - a missão).

O filme
Em palestra anteontem na Folha, o escritor chileno Ariel Dorfman disse que um de seus segredos era se apropriar das estruturas do que define como "classe dominante" para dar seu recado.
Assim, teria usado a biografia confessional tão comum aos norte-americanos para escrever seu último livro, "Uma Vida em Trânsito", assim como usara antes o thriller hollywoodiano para urdir "A Morte e a Donzela".
Compreensível e até admirável nesse caso. O que não dá para entender é, em "Coisas Selvagens", Hollywood plagiar a si mesmo pela enésima vez, algo como irmão beijando irmã.
Usa à exaustão a estrutura do "whodunit" (quem fez, quem cometeu o crime, quem matou), que teve sua invenção, sucesso e auge com Alfred Hitchcock -o que de algum valor veio depois quase sempre é homenagem ou referência ao cineasta britânico.
À exaustão porque, principalmente no final, cai no recurso fácil do efeito "montanha russa", com surpreendentes reviravoltas. O problema é que na terceira vez que se mostra que nada é o que parece ser o espectador começa a pensar que está fazendo papel de bobo.
(Ele está mesmo fazendo papel de bobo, afinal, uma das principais virtudes do cinema, mas jogar isso na cara mais de uma vez e sem sutileza no mesmo filme é esgarçar até o insuportável o acordo prévio selado na compra do ingresso.)
Fora isso, temos Theresa Russell em "grande momento" (como dizem os antigos), atriz quase sempre desprezada pelos grandes estúdios, mas de ótimos filmes. Theresa Russell é uma espécie de Harvey Keitel de saias, e "Tentação Perigosa" seria seu "Vício Frenético".
A cena em que está transando com seu mordomo latino, interrompida no meio por um telefonema da escola da filha (Russell é a mãe de Denise Richards no filme), tem mais raiva e sensualidade do que qualquer camiseta molhada da dupla jovem do elenco.
Um toque: se você for assistir, fique além do "the end".

Filme: Garotas Selvagens
Produção: EUA, 1997
Direção: John McNaughton
Com: Kevin Bacon, Neve Campbell, Denise Richards, Matt Dillon
Quando: a partir de hoje, nos cines Studio Alvorada 1, Top Cine 1 e circuito



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