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Livros
Obra vê guerra em dez passos
Estudo do britânico Ian Kershaw analisa tomadas de decisão que definiram conflito entre 1940-41
Historiador, que começou como medievalista, é também autor de biografia que pesquisou Hitler como produto da sociedade alemã
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Numa distante tarde chuvosa de 1972, o britânico Ian
Kershaw, então um historiador
especialista em Idade Média,
entrou num pub de Munique e
começou a conversar com um
estranho. Não demorou muito
para perceber que se tratava de
um velho nazista. E daí a pouco
escutou a frase: "Vocês ingleses
deveriam ter entrado na Guerra do nosso lado. Juntos teríamos destruído o bolchevismo e
mandaríamos no mundo".
Não deu para ficar quieto.
Imediatamente, Kershaw decidiu que precisava estudar aquele fenômeno. Mudou completamente de área e tornou-se
não apenas um especialista em
nazismo como o autor de uma
acurada e gigantesca biografia
de Hitler, em dois volumes.
Nela, o historiador demonstrava que as estruturas do Estado nazista e o modo de pensar
da sociedade alemã da época
permitiram que o monstro surgisse e de algum modo legitimaram suas ações.
Agora, chega ao Brasil "Dez
Decisões que Mudaram o Mundo", em que Kershaw analisa as
ações dos líderes das principais
potências durante a Segunda
Guerra Mundial e como elas
definiram o conflito. O livro sai
pela Companhia das Letras,
que também editará "Hitler
-1889-1936" e "Hitler - 1936-1945", em um volume único.
A obra trata de mostrar como
cada atitude, que hoje, aos
olhos da história, ganha ares de
algo consolidado e inevitável,
na verdade era apenas uma alternativa entre muitas possíveis. Ao mesmo tempo, com a
mesma seriedade de trabalhos
anteriores, Kershaw evita elocubrar a partir do apelativo: "E
se tivesse sido de outro jeito?".
Leia trechos da entrevista
que Kershaw, 65, deu à Folha.
FOLHA - O sr. trata de um período
específico da história da Segunda
Guerra Mundial, 19 meses entre os
anos de 1940 e 1941. Em algum outro momento da história houve tanta transformação concentrada em
tão pouco tempo?
IAN KERSHAW - Uma outra passagem de intensidade vital e
que produziu mudanças fundamentais, com efeitos de largo
prazo, foi o período entre a Revolução Russa, em outubro de
1917, até a primavera de 1919,
quando o ímpeto revolucionário em muitas partes da Europa
começou a se diluir. Outro momento dramático foi entre os
anos de 1989 e 1991, que viu o
colapso do comunismo soviético, com conseqüências profundas que ainda hoje sentimos.
FOLHA - Como o seu trabalho anterior sobre Hitler colaborou para a
idéia deste novo livro?
KERSHAW - Na época, tive de fazer um exame detalhado sobre
o processo de tomada de decisões no Reich, e as incertezas
de estratégia dos alemães durante o verão e o outono de
1941. Isso fez com que eu me interessasse a estudar como se
deram, nas outras potências, os
mesmos processos.
FOLHA - O sr. acredita que hoje estejamos longe o suficiente da Segunda Guerra Mundial para entendê-la melhor do que se fazia nas décadas anteriores?
KERSHAW - As mudanças ocorridas entre os anos de 1989 e
1991 podem ser consideradas
como o encerramento do período do pós-Guerra. Antes
dessa data, o mundo produzido
pela Segunda Guerra ainda não
tinha conhecido seu fim.
Hoje conseguimos vê-la numa perspectiva de longo prazo,
e observamos melhor como a
constelação de poderes produzida a partir dela terminou.
Também as políticas genocidas podem agora ser vistas numa perspectiva mais ampla,
permitindo-nos reconhecer
sua absoluta centralidade e importância no conflito.
Ambos, guerra e genocídio,
tiveram um lugar definidor na
história do século 20. E isso é
algo que não podia ficar claro
aos contemporâneos ou aos
que analisaram os episódios logo depois de terem ocorrido.
DEZ DECISÕES QUE MUDARAM O MUNDO
Autor: Ian Kershaw
Tradução: Berilo Vargas, Celso Mauro Paciornik, Clóvis Marques e Fernanda Abreu
Lançamento: Companhia das Letras
Quanto: R$ 64 (687 págs.)
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