São Paulo, quarta, 4 de novembro de 1998

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Biólogo recupera toda obra de Noel Rosa


Omar Jubran compilou em nove discos cerca de 228 das 259 canções da discografia original do "poeta da Vila"; apenas nove pessoas têm acesso à obra, que levou 11 anos para ser organizada


PAULO DANIEL FARAH
da Redação

A cultura brasileira ganha uma contribuição singular de um pesquisador para combater sua histórica falta de memória. Todas as gravações originais de Noel Rosa acabam de ser recuperadas para garantir que suas composições não se tornem uma vaga lembrança.
O professor de biologia Omar Jubran levou 11 anos para resgatar a discografia original completa do "poeta da Vila", e só nove pessoas têm acesso à obra. Nenhuma instituição cultural ou comercial se dispôs a divulgar o trabalho até agora.
A coleção de nove CDs contém todas as primeiras gravações das composições de Noel Rosa, com intérpretes como o próprio Noel, Mário Reis, Francisco Alves, Ruth Franklin e Araci de Almeida.
Apesar do pouco tempo de vida (1910-1937), Noel deixou um repertório considerável. Das 259 composições conhecidas do compositor carioca, 228 foram gravadas e estão reunidas nessa coletânea. Algumas músicas foram gravadas 70 anos atrás, como a valsa "Ingênua". Em 95% dos casos, Jubran trabalhou com discos de 78 rotações por minuto, que têm apenas uma faixa em cada lado.
Os CDs possuem um encarte com a letra de cada composição, o ano da realização e da gravação, a gravadora, o ano de lançamento e o número do disco original.
As gravações estão em ordem cronológica (de 1928 a 1980) e foram remasterizadas digitalmente com a ajuda do programa "Sound Forgie". Jubran pacientemente procurou não sacrificar nenhum instrumento. Diferentemente do que ocorre em muitas remasterizações, a voz aparece limpa e é possível ouvir com clareza o som do clarinete, do piano, do bandolim ou do cavaquinho.
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Disco em três pedaços
O professor chegou a recuperar um disco que estava quebrado em três pedaços. Juntou os pedaços com uma lupa, casou os sulcos, colou-os com Super Bonder e raspou os excessos com estilete. Após cinco dias, era impossível descobrir de que disco se tratava. E ele faz questão de não revelar qual é.
Jubran, 44, produziu apenas nove exemplares da coleção. Uma para ele e as remanescentes para oito amigos que se reuniram para colaborar financeiramente na fase final do projeto -Ivan Gonçalves dos Anjos, Jair Trentino, José Eduardo Wiering, Manoel Antonio do Vale, Mário Gaspar Gabbay, Miguel Paulo Jardini, Nelson Henrique de Castro e Sérgio Laurinavicius.
O equipamento utilizado por Jubran não possuía um duplicador de CDs. Portanto ele foi obrigado a "fabricar" um CD de cada vez, faixa por faixa.
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Site de apoio
Ao claro interesse das pessoas, que levou inclusive à realização da Campanha de Lançamento da Obra de Noel Rosa na Internet (www.samba-choro.com.br), opõe-se a indiferença de gravadoras, instituições culturais, rádio e televisão.
Apesar de a questão dos direitos autorais ser complexa, é difícil entender a desconsideração.
Uma participação no programa "Jô Soares Onze e Meia", por exemplo, parece ter sido considerada "inadequada" pela produção do talk show.
Jubran também realiza programas de rádio num estúdio em sua casa. Permeado com trechos de suas canções, o artista comenta sua obra e conta um pouco de sua vida sem que a voz do entrevistador apareça. Inezita Barroso (interpretando, entre outras músicas, "Meu Cafezal em Flor"), Teo de Barros, Tom Zé e Roberto Correa são alguns dos convidados.
Apesar do apoio insuficiente para que o público em geral tenha acesso a essa coleção, o professor e pesquisador planeja, como projeto futuro, reunir as músicas de Ari Barroso e de Adoniran Barbosa.



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