São Paulo, sábado, 04 de dezembro de 2004

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"ROBERTO MARINHO"/BIOGRAFIA

Bial reverencia o "Doutor Roberto"

RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL

Não é fácil escrever sobre um homem para quem se trabalhou desde sempre. Menos ainda quando se continua a trabalhar para seus herdeiros. E em especial se o homem é Roberto Marinho.
Essa dificuldade original não é superada na biografia que Pedro Bial lança em São Paulo nesta quarta-feira. Em "Roberto Marinho", parte de um projeto da Central Globo de Comunicação para preservação de memória, a relação do autor com seu personagem ultrapassa a fronteira da admiração. É de reverência.
Começa pela opção de referir-se ao jornalista e empresário, morto em agosto de 2003 aos 98 anos, como "Doutor Roberto" ao longo das quase 400 páginas.
Pode-se alegar que assim o chamavam os funcionários das Organizações Globo e todos os que dele se aproximavam. Mas, aliada ao recurso de continuamente convidar o "amigo leitor" a seguir a jornada de "nosso companheiro", essa forma de tratamento revela disposição para diluir contrastes e iluminar o personagem sempre com a luz mais favorável.
Tome-se a história de quando Roberto Marinho, já septuagenário, voltou a saltar a cavalo, para grande preocupação dos familiares. Segundo Bial, notícias de suas quedas não saíam no "Globo" nem em outros jornais. "Com exceção, é claro, da "Tribuna da Imprensa", do eterno e implacável adversário Hélio Fernandes."
O caso em si é lateral, mas o modo de narrá-lo deixa claro que, no entender do autor, fora de lugar está não o silêncio obsequioso dos demais, mas sim a atitude de quem "ultrapassava as raias da deselegância fazendo zombaria com a idade do competidor".
Não faltam atrativos a "Roberto Marinho", seja pela riqueza de eventos e realizações na trajetória de seu protagonista, que ontem teria feito cem anos, seja pela fartura de entrevistas e documentos de que se serviu o autor.
Estão lá os presidentes (para Juscelino, que insistia em erguer Brasília no Planalto Central: "Por que o senhor não constrói a nova capital ali na Barra?").
Estão lá os jornalistas (na correspondência entre Marinho e Evandro Carlos de Andrade se enxerga com nitidez o processo que transformou "O Globo" no jornal influente que é hoje).
Está lá uma história quintessencial sobre o significado de ser Roberto Marinho. Certo domingo, ele quis saber a que horas a TV Globo transmitiria o jogo de seu Flamengo. Ninguém ousou dizer a verdade: não transmitiria.
Foram minutos de desespero até surgir a idéia salvadora: como o sinal do estádio seria enviado à emissora, conectou-se uma linha à casa do Cosme Velho. Mandado às pressas ao Maracanã, um locutor de primeiro time narrou a partida para um homem só.
Pena que tanta matéria-prima tenha sido plasmada com olhar de deslumbramento por Bial, que ao final reflete: "Roberto Marinho... Nunca imaginei que me coubesse tal missão, escrever, com independência, um perfil biográfico de Roberto Marinho. Assim como nunca sonhei em vir a ser apresentador do "Fantástico" ou do "Big Brother Brasil'".
Se independência lhe foi dada, ele mostrou pouco interesse em utilizá-la. Não obstante o valor documental de "Roberto Marinho", resta por ser feita uma biografia que, sem deixar de reconhecer seus méritos e o papel central na história das comunicações no Brasil, seja capaz de encará-lo com algum distanciamento.


Roberto Marinho
  
Autor: Pedro Bial
Editora: Jorge Zahar
Quanto: R$ 29,50 (400 págs.)



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