São Paulo, sexta-feira, 05 de fevereiro de 2010

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Crítica/ "Mother - A Busca pela Verdade"

Thriller sul-coreano leva amor de mãe pelo filho aos extremos

Novo filme de Bong Joon-ho, do sucesso "O Hospedeiro", mostra mulher que batalha para provar inocência de rapaz

BRUNO YUTAKA SAITO
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

A cena inicial de "Mother - A Busca pela Verdade" parece confirmar a ideia (equivocada) de que o cinema sul-coreano tira seu impacto do registro de esquisitices pouco compreensíveis para as plateias ocidentais.
Nela, uma senhora de idade caminha em meio a um deslumbrante campo de trigo. Com expressão impassível, ela se aproxima da câmera e inicia uma estranha dança solitária, levando os braços ao ar.
É uma comédia pastelão? Ela é louca? Ou apenas excêntrica? O diretor, Bong Joon-ho, dá a dica quando termina a sequência e entra o nome do filme: "Mother" (mãe). Nada é muito racional, assim como o instinto maternal de proteção ao filho.
É esse instinto, levado ao extremo da obsessão e da loucura, que move a personagem-título, interpretada por Kim Hye-ja, famosa na Coreia do Sul pelos papéis de mães tradicionais.
No filme, ela é a mãe solteira de Do-jun, rapaz de 27 anos limitado, quase deficiente mental. Ele é dependente, tratado como se ainda fosse uma criança. Chegam até a dividir a mesma cama.
A tranquilidade familiar vai acabar quando, numa noite de bebedeira, sedento por sexo, Do-ju segue uma estudante colegial. Aparentemente, ao menos no que é mostrado ao espectador, nada acontece. No dia seguinte, no entanto, ela surge morta, e o rapaz vai preso, acusado de assassinato.
Quando percebe que de nada adianta lutar contra a polícia preguiçosa e um advogado parasita, a mãe, certa de que o filho é inocente, decide levar adiante uma investigação para achar o verdadeiro culpado.
Essa é a trama propriamente dita, mas o diretor Bong Joon-ho vai além. Não é à toa, já que seus filmes nunca são convencionais. Em "Memórias de um Assassino" (2003), ele invertia expectativas em uma história sobre um assassino em série.
"O Hospedeiro" (2006) foi o maior sucesso de bilheteria da história da Coreia do Sul e desmontou convenções sobre o gênero "filme de monstro".

Método hitchcockiano
Em "Mother", não são apenas as grades que prendem o rapaz. Seu atraso mental o impede de fixar lembranças. Nem ele mesmo lembra o que aconteceu na noite do assassinato.
Cabe à mãe a atuação física, de mover o céu e o mundo para provar a inocência. Quem prestar atenção na relação entre os personagens principais vai se lembrar da criatura mutante de "O Hospedeiro". Mãe e filho são quase um organismo único.
Em "Mother", Bong usa o método hitchcockiano, mas não chega a desmontá-lo. Dá, ao menos, uma boa mexida nele. Se, nos longas de Hitchcock, o personagem principal costuma ser acusado de um crime que não cometeu, e tem que suar a camisa para provar a inocência, com o diretor coreano não temos certeza de nada.
Com Hitchcock, sabemos desde o início quem é o culpado e nos tornamos cúmplices. Com Bong, somos cúmplices e testemunhas ao mesmo tempo. Ele induz o espectador a tomar conclusões para logo em seguida puxar o tapete e instaurar novas dúvidas. Do diretor inglês o coreano ainda segue o rigoroso apuro técnico (as cenas de plano geral que enfatizam a mãe em meio à natureza são de rara beleza plástica) e a certeza de que todos carregam um pecado nas costas.


MOTHER - A BUSCA PELA VERDADE

Diretor: Bong Joon-ho
Produção: Coreia do Sul, 2009
Com: Kim Hye-ja, Won Bin
Onde: em cartaz nos cines Frei Caneca Unibanco Arteplex 4 e Cine Bombril 2
Classificação: 18 anos
Avaliação: ótimo




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