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Crítica/ "Mother - A Busca pela Verdade"
Thriller sul-coreano leva amor de mãe pelo filho aos extremos
Novo filme de Bong Joon-ho, do sucesso "O Hospedeiro",
mostra mulher que batalha para provar inocência de rapaz
BRUNO YUTAKA SAITO
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
A
cena inicial de "Mother
- A Busca pela Verdade"
parece confirmar a
ideia (equivocada) de que o cinema sul-coreano tira seu impacto do registro de esquisitices pouco compreensíveis para
as plateias ocidentais.
Nela, uma senhora de idade
caminha em meio a um deslumbrante campo de trigo.
Com expressão impassível, ela
se aproxima da câmera e inicia
uma estranha dança solitária,
levando os braços ao ar.
É uma comédia pastelão? Ela
é louca? Ou apenas excêntrica?
O diretor, Bong Joon-ho, dá a
dica quando termina a sequência e entra o nome do filme:
"Mother" (mãe). Nada é muito
racional, assim como o instinto
maternal de proteção ao filho.
É esse instinto, levado ao extremo da obsessão e da loucura,
que move a personagem-título,
interpretada por Kim Hye-ja,
famosa na Coreia do Sul pelos
papéis de mães tradicionais.
No filme, ela é a mãe solteira
de Do-jun, rapaz de 27 anos limitado, quase deficiente mental. Ele é dependente, tratado
como se ainda fosse uma criança. Chegam até a dividir a mesma cama.
A tranquilidade familiar vai
acabar quando, numa noite de
bebedeira, sedento por sexo,
Do-ju segue uma estudante colegial. Aparentemente, ao menos no que é mostrado ao espectador, nada acontece. No
dia seguinte, no entanto, ela
surge morta, e o rapaz vai preso, acusado de assassinato.
Quando percebe que de nada
adianta lutar contra a polícia
preguiçosa e um advogado parasita, a mãe, certa de que o filho é inocente, decide levar
adiante uma investigação para
achar o verdadeiro culpado.
Essa é a trama propriamente
dita, mas o diretor Bong Joon-ho vai além. Não é à toa, já que
seus filmes nunca são convencionais. Em "Memórias de um
Assassino" (2003), ele invertia
expectativas em uma história
sobre um assassino em série.
"O Hospedeiro" (2006) foi o
maior sucesso de bilheteria da
história da Coreia do Sul e desmontou convenções sobre o gênero "filme de monstro".
Método hitchcockiano
Em "Mother", não são apenas as grades que prendem o
rapaz. Seu atraso mental o impede de fixar lembranças. Nem
ele mesmo lembra o que aconteceu na noite do assassinato.
Cabe à mãe a atuação física, de
mover o céu e o mundo para
provar a inocência. Quem prestar atenção na relação entre os
personagens principais vai se
lembrar da criatura mutante de
"O Hospedeiro". Mãe e filho
são quase um organismo único.
Em "Mother", Bong usa o
método hitchcockiano, mas
não chega a desmontá-lo. Dá,
ao menos, uma boa mexida nele. Se, nos longas de Hitchcock,
o personagem principal costuma ser acusado de um crime
que não cometeu, e tem que
suar a camisa para provar a inocência, com o diretor coreano
não temos certeza de nada.
Com Hitchcock, sabemos desde o início quem é o culpado e
nos tornamos cúmplices.
Com Bong, somos cúmplices
e testemunhas ao mesmo tempo. Ele induz o espectador a tomar conclusões para logo em
seguida puxar o tapete e instaurar novas dúvidas. Do diretor
inglês o coreano ainda segue o
rigoroso apuro técnico (as cenas de plano geral que enfatizam a mãe em meio à natureza
são de rara beleza plástica) e a
certeza de que todos carregam
um pecado nas costas.
MOTHER - A BUSCA PELA VERDADE
Diretor: Bong Joon-ho
Produção: Coreia do Sul, 2009
Com: Kim Hye-ja, Won Bin
Onde: em cartaz nos cines Frei Caneca
Unibanco Arteplex 4 e Cine Bombril 2
Classificação: 18 anos
Avaliação: ótimo
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