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HISTÓRIA
O agitador Sílvio Romero
REYNALDO JARDIM
ESPECIAL PARA A FOLHA
Uma introdução à "Introdução à Doutrina contra
Doutrina", de Sílvio Romero, presume-se que escrita pelo "organizador" da edição Alberto Venâncio Filho, pois não está assinada,
dá conta, com precisão, da vida
do historiador brasileiro e resume
o espírito do livro.
Trata-se de um trabalho sobre a
política brasileira nos primeiros
tempos da República, publicado
em 1894 e reeditado em 1895.
O país ainda tentava recompor-se do trauma institucional causado pela queda da monarquia e o
advento da República. Surgiram
os primeiros partidos políticos
numa capenguice ideológica ainda não sanada.
Casuísmo, interesses sectários e
pessoais, irracionalismo, desinteresse real pelo destino das populações ainda perduram.
Um tanto panfletário, o autor
parece estar num palanque vociferando apaixonadamente contra
fatos e idéias dominantes. Perde a
serenidade de historiador e prejudica suas análises sociológicas.
As constatações e críticas adjetivas deixam-se levar pelo seu ânimo belicoso, polêmico, militante.
Não consideremos inteiramente
negativos esses fatores.
É um testemunho vivo e participante de quem viveu e vivenciou
o capítulo conturbado da transição monarquia-república.
As mazelas daqueles idos e vividos atravessaram séculos e aí estão em sua maioria bem ostensivas: a desigualdade de classes e raças; o papel intervencionista das
Forças Armadas (que o autor louva, mas não as quer no jogo político civil); a falta de consistência
dos partidos políticos; a pobreza
nacional; escritores, sem editores;
as péssimas condições sociais do
povo brasileiro.
Sílvio Romero gasta muito papel para esclarecer as calúnias
orais "ditas à socapa nos conciliábulos dos sectários, à luz privada
das confabulações irresponsáveis".
Esgota a paciência do leitor ao
demonstrar o quanto é querido
pelas Forças Armadas e o quanto
as respeita.
O trabalho de Sílvio Romero ganha consistência ao expor as vísceras do positivismo, em sua ação
nefasta.
A tentativa inglória de convencer d. Pedro 2º a se transformar
em ditador republicano. A mesma investida é feita sobre o general Deodoro.
É estarrecedora a proposta de
constituição formulada pelos positivistas: "O governo federal
competirá a um ditador...".
Aos socialistas, Sílvio Romero,
mesmo louvando a doutrina,
mostra que um país sem classe
operária não está em condições
de adotar o sistema social igualitário. Temos baixa densidade populacional, não há um parque industrial, nosso comércio está engatinhando, a população é praticamente analfabeta, as capitais
não passam de vilarejos e os municípios não podem ser considerados centros urbanos.
É impressionante que cenário
paupérrimo e conturbado tenha
gerado complexidades intelectuais e bem informadas como o
próprio Sílvio Romero, Tobias
Barreto, Rui Barbosa e o gênio
Machado de Assis.
Naqueles tempos, como agora,
o país merecia uma classe política
à altura de seus artistas, pensadores e escritores.
Leia essa "Introdução à Doutrina contra Doutrina". É instigante
e faz pensar.
Reynaldo Jardim é poeta e jornalista
Introdução à Doutrina contra
Doutrina
Autor: Sílvio Romero
Organização: Alberto Venâncio Filho
Editora: Companhia das Letras - coleção
Retratos do Brasil
Quanto: R$ 23 (176 págs.)
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