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NA REDE
Brincando com as palavras
Com referências literárias, o site Wordtoys recria de forma poética a experiência da escrita
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Estamos ao mesmo tempo
num mundo medieval, feito de
mitos e mistérios; num mundo
borgeano, costurando histórias
inacabadas e com mentiras que
parecem verdades e num mundo tecnológico, em que a Idade
Média e Borges só podem acontecer por causa de botões.
A tecnologia é grande, mas
surpreendentemente delicada.
Como se não estivéssemos
acionando teclas, mas tivéssemos voltado a usar a pena e o
mata-borrão.
E a proposta do site Wordtoys (findelmundo.com.ar/wordtoys) faz coincidirem, como que por necessidade, possibilidades modernas oferecidas
pelo computador com a nostalgia do artesanato.
Wordtoys são brinquedos de
palavras. Mas são brinquedos
literários e bibliotecários. O site é um livro-biblioteca, em que
cada página convida o leitor a
uma brincadeira diferente, todas absurdas e oníricas.
Na página "Escreve o Teu
Próprio Quixote", surge uma
tela branca e, independentemente do que o leitor digite,
aparece o texto de Dom Quixote. Não haveria outra maneira
de realizar o sonho possível e
impossível de Borges, que não
fosse por meio do computador.
Não há outra maneira não
verbal de fazer com que uma
pessoa sempre escreva o mesmo texto. E o efeito é tão ilusionista que, após algum tempo,
nós nos sentimos como autores
do texto, que agora deixou de
ser de Cervantes.
Em "Por que a Senhorita
Chao se Suicidou?", após contar a triste história de uma jovem chinesa que esfaqueia a si
mesma no momento de ser levada ao casamento arranjado, o
leitor depara com a pergunta e,
no lugar de letras coloridas, ele
é convidado a criar sua própria
resposta para a pergunta.
Em um "Processador de Textos Rimbaudiano", após a leitura do poema "Voyelles" (Vogais), de Rimbaud, em que se
comparam as vogais a cores, o
leitor pode escrever seu próprio poema, que terá suas letras
transformadas em diferentes
cores, segundo estabelecido
por Rimbaud.
Há uma coleção de mariposas-citações, porque, é claro, as
mariposas se parecem com livros e, como dizia Galileu, a natureza inteira é um grande alfabeto; há poemas feitos de água
(lembrando Joan Brossa), que
escorrem quando se abre a torneira; há o idioma dos pássaros
e os céus do sul, por onde passa
um avião antigo.
Há o barulho das páginas virando, as páginas marmorizadas ou as iluminuras e o site da
autora, Belén Gache, uma artista argentina (findelmundo.com.ar). A internet é, para
quem quiser e souber, um
mundo sem fim. As artes são,
também para quem pode, o fim
do mundo, o fim de um mundo,
o mundo num lugar onde ficamos felizes em nos postar à
beira do abismo.
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