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CRÍTICA
"Saia Justa" deixa mulheres no mesmo lugar
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
No fim -e no começo-, o
programa acaba por dizer a
que veio. Nas cenas iniciais, elas
se maquiam, se arrumam, se embelezam. Nos últimos segundos
no ar, o letreirinho do patrocinador se insinua: "O que você faria
com uns quilos a menos?". O recheio pode até tentar parecer
consistente, mas as pontas acabam por ser mais reveladoras.
Não que não haja esforços honestos e, bem, um projeto simpático em "Saia Justa". A idéia de levar mulheres de idades e, portanto, experiências diversas, poderia
funcionar como uma espécie de
chope entre amigas televisivo;
aquela situação em que se fala
um pouco de tudo, alguma confidência escapa, o clima esquenta,
mas, ao fim e ao cabo, está tudo
bem e somos amigas de novo.
E a combinação de simpatia
pessoal e a seriedade jornalística
de Monica Waldvogel cai como
uma luva para um programa
com esse perfil. Ali está a diplomacia para lidar com "personalidades" distintas, ali estão os dados de realidade, ali está uma interpretação mais compreensiva e
menos simplesmente pessoal.
O diabo é que suas companheiras de tricô seguem seu comando
por mais ou menos duas frases,
depois descambam para a exibição despudorada de seu narcisismo, para a falação desordenada.
É disso mesmo que as conversas
entre amigas são feitas, mas
quem quer assistir a papos de
amigas que não as próprias?
E, mais, por que há tanta conversa de e sobre a mulher, fenômeno do qual "Saia Justa" é só
um exemplo? Mesmo que admitamos que há mais o que discutir
na condição contemporânea da
mulher do que na do homem e
que concordemos que há uma
espécie de ânsia feminina em falar de si e talvez haja uma escuta
mais apurada para as questões
do outro, ainda sobra uma pulga
atrás da orelha. Tanta falação não
pode ser só porque é relevante
culturalmente.
De um lado, por mais que se faça esforço no sentido contrário, é
necessário botar a mulher em seu
devido lugar: de imagem no espelho do olhar do outro -daí a
obsessão em exibir, reiterar, educar e insistir tanto nos cuidados
com a imagem. Mulher que não
cuida da imagem tem algo a ser
corrigido -e rápido. Eloqüente
a esse respeito foi a cena em que a
"neoconvertida" Márcia Tiburi,
antes, dizia ela mesma, uma mulher "só intelecto" (o que quer
signifique isso), agora, depois de
rendida à maquiagem, à dieta e
outras milongas mais, foi agraciada com um "você é linda"
unânime das colegas de programa. Será que na fase intelecto ela
mereceria o mesmo elogio? Ou
ser linda depende de uma conversão?
De outro lado, tem a propaganda, mais uma vez. Há uma tonelada de produtos no mercado para serem vendidos em nome do
bem-estar, da aparência, da
"saúde", da "qualidade de vida".
É para isso, no fundo, que se bota
tanta mulher no ar. A inteligência ou interesse das conversas é
mero ornamento -a pergunta
que importa responder é aquela
que aparece por último.
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