São Paulo, segunda-feira, 05 de junho de 2006

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Massive Attack reafirma resistência

"Collected" reúne 13 das melhores canções do grupo e nove faixas raras

Em entrevista, Robert Del Naja, vocalista da dupla, fala sobre o próximo álbum e comenta a conturbada carreira de sua banda

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

Coletâneas são a melhor maneira de um(a) artista/banda lembrar o público de uma época que não volta mais. Mas, para o Massive Attack, é uma prova de resistência.
A dupla acaba de lançar, inclusive no Brasil, "Collected", disco duplo que traz, na frente, 13 das melhores canções já lançadas pelo grupo inglês, além da nova "Live with Me". No verso, estão nove faixas raras, além da inédita "False Flags".
Após separações, brigas internas, brigas com o governo britânico e acusações não comprovadas de pornografia infantil, é quase um milagre que o Massive Attack tenha sobrevivido por 15 anos.
O curioso -e talvez a principal razão de a banda ainda estar de pé- é que seus dois integrantes, Robert Del Naja (também conhecido como 3D) e Grant Marshall (Daddy G) trabalham juntos, mas separados.
Para realizar o próximo e quinto álbum, "Weather Underground", que deve sair no começo de 2007, Del Naja trabalha em seu estúdio em Bristol, com o produtor e colaborador Neil Davidge, enquanto Marshall cria suas faixas em outro local, do outro lado da cidade. Como em discos anteriores, os dois se encontram apenas depois, para selecionar e dar retoques no material.
"Acho que muitas bandas também trabalham desse jeito, com cada músico levando suas idéias separadamente para depois tentar dar uma unidade a tudo", disse Del Naja à Folha. "É muito difícil manter amizade durante muito tempo trabalhando junto. Minha relação com Daddy G nunca foi fácil. Além disso, o Massive Attack nunca foi uma banda convencional, parece que cada disco nosso representa um projeto diferente, com os músicos e cantores que convidamos."
Entre esses convidados, estão os indies norte-americanos do TV on the Radio. "Fizemos algumas faixas com eles bastante interessantes, que devem entrar no próximo disco."
Uma pista de como será "Weather Underground" é "Live with Me", uma das novas canções de "Collected" (a outra, "False Flags", é uma crítica às turbulências enfrentadas pela comunidade européia, segundo Del Naja). Com os vocais de Terry Callier, ela aponta para o blues e para a soul music. "Não sei até que ponto ela serve como referência. Ainda não sei para qual direção seguirá o próximo disco. Quero que seja soul, intenso e bonito. Mas estamos no meio do caminho."

Gênese do trip hop
Seja qual for a direção tomada, Del Naja não exagera quando diz que o Massive Attack não é uma banda convencional. O grupo é cria do Wild Bunch, coletivo artístico de Bristol que reunia artistas plásticos, grafiteiros e músicos. Além de Del Naja e Marshall, a banda tinha em seu núcleo Andrew Vowles (o Mushroom). Tricky, que depois seguiria carreira solo, também fez parte do MA.
Em 1991, lançaram "Blue Lines", disco que gerou todo um gênero da eletrônica, o trip hop, com suas influências de hip hop, jazz e soul. Músicas como "Unfinished Sympathy", "Daydreaming", "Safe from Harm" (com seu clima atmosférico e denso) inspiraram uma geração (Portishead, Morcheeba...).
"Quando éramos do Wild Bunch, tínhamos algumas características. Éramos pessoas totalmente diferentes, com famílias de culturas diferentes, produzindo juntas. Havia muitas coisas e idéias acontecendo", ele relembra. "Na época, nem sabíamos se iríamos terminar o disco. Acho que conseguimos encapsular nosso mundo naquele álbum. Foi algo contra o sistema, contra o que havia nas rádios e na TV."
Depois, vieram "Protection" (que trazia a vocalista Tracey Thorn, do Everything But the Girl), "Mezzanine" (com o hit "Teardrop") e "100th Window" (feito todo por Del Naja) -sem contar "No Protection", com versões remixadas de Mad Professor, e duas trilhas sonoras.
A fase de Mezzanine (1998) foi a mais conturbada, com o trio brigando publicamente. Em seguida, Vowles deixou a banda. Os problemas não pararam. Em 2003, Del Naja foi acusado pelo governo britânico de acessar sites de pornografia infantil. Nada foi provado.
As acusações apareceram na mesma época em que Del Naja e Damon Albarn (do Blur) compraram anúncios de página inteira em jornais e revistas ingleses para protestar contra o envolvimento do país na Guerra do Iraque. Comentários políticos não são nada comuns no mundo da eletrônica.
"É estranho. A eletrônica parece renegar a política e nunca faz comentários sociais, à exceção de alguns momentos em que está ligada a um movimento, como na época das raves."
O Massive Attack criou um universo próprio. "Mesmo estando numa major, sendo parte do show business, temos nosso mundo e um espírito underground de comportamento."


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