São Paulo, sábado, 05 de agosto de 2006

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4ª FESTA LITERÁRIA INTERNACIONAL DE PARATI

Foer revê o 11/9 pelos olhos de uma criança

Uma das estrelas da Flip, escritor americano lança seu segundo romance

Best-seller aos 25 anos, autor, que já teve obra adaptada para o cinema, diz que o debate sobre os atentados têm evoluído


MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma das estrelas da Flip, Jonathan Safran Foer ganhou a fama de "menino prodígio" em 2002, aos 25 anos, quando seu primeiro livro, "Tudo se Ilumina", virou best-seller e recebeu diversos prêmios, como o Guardian First Book Award.
Com humor, irreverência e alguma ousadia formal, o livro contava a história do próprio autor quando buscou as raízes familiares na Ucrânia. O escritor está lançando seu segundo livro, "Extremamente Alto & Incrivelmente Perto", em que um menino de nove anos procura pela cidade de Nova York a memória emocional de seu pai, morto nos ataques do 11 de Setembro.
Foer vem para Parati com a mulher, Nicole Krauss, escritora que também ganha prestígio crescente. Em entrevista, ele diz que os EUA sempre estiveram abertos a discutir os atentados, afirma que não liga para a crítica e relata suas impressões sobre São Paulo, cidade que já visitou e que abriga parte de sua família.

 

FOLHA - Passados quase cinco anos do 11 de Setembro, o cinema e o mercado editorial nos EUA parecem estar mais à vontade para abordar o assunto. Você concorda?
JONATHAN SAFRAN FOER -
Sempre estivemos prontos para debater o assunto. No começo, a discussão soou como medo, raiva. Então se tornou mais uma conversa sobre luto, talvez. Daí se tornou mais política. Esse debate nunca se encerrará. Sempre haverá novos sentimentos envolvidos. Como americano, pessoalmente, é interessante ver como todo o debate tem mudado. Acho que meu livro é uma parte dessa conversa.

FOLHA - Seus dois livros lidam com a memória. Por que esse tema?
FOER -
Não sei se é tão pessoal para mim. Talvez tenha a ver com a minha família. A história tirou muito da minha família. Sendo judeu, você é encorajado a buscar a memória de uma forma muito específica. E, diferentemente das gerações passadas, a memória na minha geração é muito "externa". Ninguém se lembra dos números dos telefones, porque eles já ficam guardados nos celulares. Não precisamos lembrar datas porque temos organizadores eletrônicos. Temos o Google. Não precisamos "interiorizar" as informações. Mas acho que isso também pode criar um tipo de relação com o mundo, um sentimento de solidão e deslocamento. Vários escritores da minha geração tendem a escrever sobre a memória.

FOLHA - Seu último livro é muito visual. Qual sua relação com artes visuais ou com HQ?
FOER -
Gosto de HQ e costumo ler. Mas acho que não me influencia tanto quanto as minhas leituras ou quanto as artes visuais. Um amigo diz que todo escritor tem a fantasia secreta de ser artista. E todo artista tem a fantasia secreta de ser escritor. Sendo escritor, você sempre está tentando se explicar. Como artista, você só deseja fazer sentido, criando uma atmosfera e um sentimento, em vez de contar uma história.

FOLHA - De certa forma "Extremamente Alto & Incrivelmente Perto" lembra a "Trilogia de Nova York", de Paul Auster, ou o universo de Borges. Eles influenciaram você?
FOER -
Bem, vivo na mesma rua em que Paul Auster mora [Brooklyn, em Nova York], mudei-me para cá em boa parte por causa dele. Gosto dele e leio sua obra, mas acho que escrevemos de forma muito diferente. Adoro Borges. Acho que meus livros têm mais relação com ele. Ele tem um tipo de imaginação que eu adoro.

FOLHA - O personagem de seu livro chama-se Oskar. Tem alguma relação com o personagem de "O Tambor", de Günter Grass?
FOER -
Sim, tem... Adoro esse livro. Os dois são crianças, observam o que os adultos fazem. Até certo ponto rejeitam o que os adultos fazem... Mas o Oskar de Grass se recusa a ficar adulto. O meu não, ele se joga no mundo, em vez de receber dele.

FOLHA - Você foi elogiado por escritores como Salman Rushdie e John Updike e já chegou a ser chamado de "genial" pelo jornal "The Times". Também já foi muito criticado. Como você reage à crítica?
FOER -
Prefiro quando me chamam de idiota... Não levo em conta o que a crítica diz, em parte porque não tenho como objetivo escrever um grande romance, no sentido do que os críticos gostam. Tenho o objetivo de fazer algo mais pessoal. Faço coisas sem pensar nas idéias por trás. Nunca refleti se faço realismo mágico ou sátira, paródia ou literatura judaica.

FOLHA - Você gostou da versão de Liev Schreiber para "Tudo se Ilumina" ["Uma Vida Iluminada"]?
FOER -
De muitas coisas eu gosto, de outras não. Evito falar sobre o filme, fiquei amigo dele. Bem, é minha resposta oficial...

FOLHA - Você se considera um autor "independente"?
FOER -
Não me encaro como escritor. Não vou a festas, não tenho nenhum interesse particular em conhecer outros escritores. Não sei de nada sobre o mundo editorial. Meu objetivo nunca foi ser escritor. Quero expressar algo que valha a pena, que seja essencial para mim, necessário. Até agora a maior parte desse trabalho se expressou na forma de livros. Talvez nem continue assim. Meu último livro é bastante visual.

FOLHA - Você tem uma biografia muito diversificada. É verdade que já trabalhou numa joalheria?
FOER -
Meu avô tinha uma joalheria, trabalhei lá um verão. É divertido convencer as pessoas a comprar algo de que elas absolutamente não precisam. Diamantes são como uma obra de ficção. Não há nada de intrinsecamente valioso neles, você cria uma história que os torna valiosos. Trabalhar numa joalheria e escrever romances são coisas similares...

FOLHA - Seu irmão, Franklin Foer [editor da revista "New Republic"], escreveu o livro "Como o Futebol Explica o Mundo". Você também gosta do esporte?
FOER -
Sim, acompanhei a Copa, torci para o Brasil, como meu irmão. Metade da minha família mora em São Paulo. Já estive duas vezes na cidade, é um lugar incrível. Há tantas coisas que você deseja ver. E tantas de que quer desviar o olhar. Fico com minha família, não tenho uma visão de turista. Tenho uma visão especial.


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