São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2011

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CRÍTICA CINEMA

Lars von Trier capta mal-estar do mundo atual em "Melancolia"

Novo filme do cineasta dinamarquês, que estreia hoje no Brasil, narra o estado de desolação de duas irmãs

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

No último Festival de Cannes, "Melancolia" foi soterrado pela coletiva de imprensa de... "Melancolia".
As piadas de Lars von Trier, goste-se delas ou não, tornaram-se o assunto: seria ele nazista ou, pior, pornógrafo?
O fato é que o filme existe e que a melancolia é uma das experiências mais complexas da cultura.
Não será exagero dizer que cada teórico tem a sua definição. E que cada melancólico tem a sua melancolia particular. Entre eles, as irmãs Justine (Kirsten Dunst) e Claire (Charlotte Gainsbourg).
Cada uma tem o seu episódio. No primeiro, Justine é apanhada no dia de seu casamento, em uma rica festa promovida pelo cunhado.
No início, tudo é mesmo uma festa. Até a limusine que não consegue fazer uma curva parece divertir os noivos.
Na festa, as coisas nem sempre correrão tão bem. É como se Justine se desse conta da ausência de sentido tanto da cerimônia como do casamento propriamente dito.
Melancolia, uma definição: o motivo de alegria ou felicidade não é reconhecido.
Mas uma dúvida pode vir a complicar um pouco essa definição. Por exemplo, alguém escreve nos "Cahiers du Cinéma" definindo a melancolia como um mal do excesso de saber.
Nesse caso, não é que Justine não soubesse apreciar os motivos de alegria que tem, mas, ao contrário, ela sabe que a cerimônia não passa de vazio (impressão, no mais, compartilhada pela mãe e pelo pai, de formas diferentes).
No segundo episódio, enquanto o marido John (Kiefer Sutherland) espera com entusiasmo a passagem do planeta Melancolia próximo da Terra, Claire consulta a internet, onde os chutadores de sempre dizem que haverá uma colisão com a Terra.
Os cientistas dizem que não, sustenta John. A dúvida, porém, está instalada e será vivida como iminência de catástrofe por Claire.
Para Vladimir Safatle, num artigo recente na Folha, o planeta vindo de encontro à Terra constitui uma metáfora, que "não poderia ser mais clara a respeito desta doença que assombra a época e retira nossas forças a ponto de dissolver o mundo de nossos interesses".
O sentimento de vazio é sintoma desse mal do "século dos antidepressivos".
Mas podem-se ver as coisas por um outro lado: não seria esse choque de planetas, com seu sentimento de fim de mundo iminente, uma premonição do selvagem ataque contra um acampamento de adolescentes por um neonazista norueguês?
E não seria esse ataque metáfora de um fim de mundo, ou do fim de percurso de uma Europa que reluta em aceitar a existência do outro?
"Melancolia" está longe de ser um filme inatual, clínica e politicamente. (E, em tempo: claro que Von Trier não é nazista.)

MELANCOLIA
DIREÇÃO Lars von Trier
PRODUÇÃO Dinamarca, 2011
COM Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg
ONDE nos cines Bristol, Espaço Unibanco Augusta e circuito
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo




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