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DEBATE
No lançamento de "Uma Vida em Trânsito', escritor chileno fala ainda que a esquerda de seu país pare de mentir
Spielberg é o Donald dos 90, diz Dorfman
CYNARA MENEZES
da Reportagem Local
O escritor chileno Ariel Dorfman
quer que a esquerda latino-americana pare de mentir sobre o regime
militar. "Nós nos mentimos muito
no Chile, mas agora é hora de enfrentar a verdade. Dizer, por exemplo, que Salvador Allende foi morto é uma mentira. Ele se suicidou",
disse Dorfman.
O escritor participou na última
quinta-feira de um debate na Folha, ao lado do também escritor
Moacyr Scliar, com mediação do
editor da Ilustrada, Sérgio Dávila.
O debate foi promovido pelo jornal e pela editora Objetiva, que está
lançando no Brasil a autobiografia
de Dorfman, "Uma Vida em Trânsito".
Scliar concordou com o escritor
chileno sobre os exageros da esquerda, quando narra os fatos da
ditadura militar. "Eu me lembro
que os stalinistas diziam que há
verdades reacionárias e mentiras
progressistas", disse o colunista da
Folha. "A gente não sabia mais
quando estava inventando ou dizendo a verdade."
Um dos capítulos do livro de
Dorfman é dedicado a "reconhecer" o suicídio de Allende. A oposição ao general Augusto Pinochet
dizia que, na verdade, ele havia sido morto pelos militares durante o
golpe.
Dorfman também acha que a ida
de Pinochet ao Senado, onde vai
ocupar uma cadeira vitalícia, tem
seu valor. "Significa que uma parte
do povo chileno o aceita como
profeta do capitalismo moderno,
do consumismo."
Mortes
O escritor chileno desmentiu
ainda o número de mortos estimado pela esquerda em seu país.
"Não houve 100 mil mortos, houve
3.500, e já é muito. Um morto já seria demasiado", disse. "Vão me
criticar por dizer isso, mas minha
tarefa é dizer a verdade. Ou não teremos possibilidade de enfrentar a
direita."
No debate, Ariel Dorfman contou histórias de seus exílios, fugindo do regime militar na Argentina
e no Chile, e falou da importância
da comunicação e da linguagem
para a manutenção da paz no planeta -apesar dos paradoxos que
isso representa.
Instrumento de sobrevivência
"Eu proclamo o uso do idioma
como instrumento de sobrevivência no mundo globalizado. Mas
compartir o mesmo idioma não é
garantia de que o outro não irá eliminá-lo. Os judeus alemães são
um exemplo disso", afirmou.
Para ele, "a verdadeira paz só
vem quando se reconhece o outro
como diferente. Para isso, é preciso saber usar as palavras certas".
Pato Donald
Ele fez uma releitura de seu livro
mais famoso, "Para Ler o Pato Donald", uma crítica ao contexto subliminar da história em quadrinhos de Walt Disney.
"Não renego nada que tenha escrito, mas não voltaria a dizer algumas coisas porque o mundo mudou muito, o livro pertence ao momento em que foi feito", disse.
Questionado sobre quem seria o
Pato Donald dos anos 90, no sentido que fala o livro, Dorfman não
hesitou em responder: "Steven
Spielberg. Ele possui um conceito
de fazer filme que não deixa margem às contestações".
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