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POLÊMICA TROPICAL
Nascido da visão de um quadro de Tarsila do Amaral, movimento continua determinante
Antropofagia é crítica a velhos modelos
da Reportagem Local
A polêmica gira ainda ao redor
da Semana de Arte Moderna de
1922, seus protagonistas e o legado
deixado na luta que travaram contra o academicismo reinante na
cultura brasileira do período.
Oswald de Andrade (1890-1954)
era um viajante em contato com as
vanguardas européias. Trazê-las
para o país, entendeu, não era apenas o ato de transportar uma árvore de um lugar para outro. Acreditava que a mudança climática poderia transformá-la. Do hibridismo nasceria algo belo porque novo, excitante porque inédito.
Sua visão de uma cultura antropofágica aconteceu após ganhar
um presente de sua mulher na época, a pintora Tarsila do Amaral.
Oswald de Andrade conquistou o
"Abaporu" e, baseado em suas
formas, criou um movimento artístico que misturava "o de fora"
com a tradição indígena.
A influência do ato ressoa em todos os campos. Não por acaso, o
tema da próxima Bienal Internacional de Arte de São Paulo, para
os brasileiros, será a antropofagia.
"Na pintura de Tarsila há uma
exposição natural de uma idéia: a
de que era possível a criação intelectual e artística na dependência",
diz a curadora Sônia Salzstein.
Salzstein realizou a pesquisa para
a montagem da exposição "Tarsila Anos 20", que acontece até o final de novembro na galeria de arte
do Sesi, em São Paulo.
"É necessário pensar que a antropofagia, em Tarsila, realiza uma
crítica ao modelo europeu, do colonizador, e isso é o que há de mais
instigante no movimento: revirar
o que foi achado e não tomá-lo
sem qualquer forma de crítica", fala Salzstein.
"Mas o problema", diz Olavo de
Carvalho, "é que transformamos
a hipocrisia em defesa. Macunaíma é um exagero e parece que, no
final, ficamos com dificuldade em
afirmar valores positivos. Temos
que pegar algo da cultura da humanidade e trazer para nós, e não
simplesmente o 'estrangeiro"'.
O que significaria então uma cultura brasileira? O cinema de Julio
Bressane, as canções de Caetano
Veloso e também uma confusão de
valores, tudo causado pela ação
antropofágica?
"Hoje em dia penso que o tema
está sofrendo uma perda de velocidade. Não há aposta para vencer a
dependência cultural", fala o psicanalista Octavio Souza, autor do
livro "Fantasia de Brasil".
"Curiosamente", continua,
"para defender a posição antropofágica é necessário se identificar
com a figura do índio. Como um
lampejo do poeta que era Oswald
sim, mas tentar construir uma nação com esse ideal...Confundir o
nacional com o antropofágico é limitar as nossas possibilidades".
Mas as possibilidades da antropofagia, para alguns, de certa maneira, continuam em vários aspectos da cultura brasileira. E, especialmente, nas artes.
A psicanalista Suely Rolnik prepara o lançamento, pela editora
Estação Liberdade, do livro "Inconsciente Antropofágico - Ensaios Sobre a Subjetividade", uma
coletânea de ensaios.
Rolnik defende a permanência e
as possibilidades do discurso antropofágico, vivo ainda no trabalho de um artista como Tunga (leia
texto abaixo).
"A crítica feita à antropofagia
parte de uma visão européia. Mas
de maneira alguma ela -a antropofagia como constituição da subjetividade no Brasil- é infantil. É
uma potência criadora", diz.
Para ela, vivemos sempre "um
hibridismo constante. Desde a
fundação do Brasil constituimo-nos na mistura. O manifesto
de Oswald não é um projeto teórico, mas uma visão que pode nos
ajudar muito a, finalmente, formular essa teoria".
(MARCELO REZENDE)
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