|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Música
Tom Zé se rende à bossa nova
Compositor diz que "Estudando a Bossa - Nordeste Plaza" é seu primeiro disco com músicas "cantáveis'
Álbum tem participações de David Byrne e cantoras como Zélia Duncan, Mônica Salmaso, Fernanda Takai, Badi Assad e Marina de la Riva
AUDREY FURLANETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Tom Zé vem tendo "pesadelos sensacionais". Gravou o que
considera seu primeiro disco
de músicas "cantáveis", chamado "Estudando a Bossa - Nordeste Plaza". "Eu inauguro um
novo espaço na minha vida, onde faço pela primeira vez músicas melódicas, cantáveis", diz.
"As transformações são assim. Todos os pesadelos meus
têm uma mortandade enorme.
Eu mato milhões de pessoas e
estou o tempo todo ameaçado
de morrer", conta, rindo. Por
outro lado, com "Estudando",
diz que vive uma das fases mais
felizes de sua vida ao descobrir
que suas músicas, agora, são
"fáceis de se amar".
"Estudando a Bossa", que sai
pela Biscoito Fino, tem menos
ruídos e mais melodias suaves,
como em "Barquinho Herói",
"Filho do Pato" e "Roquenrol
Bim-Bom", com delicadas vozes femininas de Fernanda Takai, Andréia Dias, Jussara Silveira e Anelis Assumpção, entre outras cantoras.
O resultado são faixas distantes do Tom Zé que diz ter
feito música "crua e bárbara"
enquanto os "bossa novistas finíssimos" Caetano Veloso e
Gilberto Gil, nos anos 60, investiam em sons muito "depurados, muito perto da compreensão do que [Tom] Jobim,
João [Gilberto] e [Carlos] Lyra
estavam fazendo".
"Esses são verdadeiros homens finos", diz. "Tentei fazer
essa coisa [em "Estudando a
Bossa'] já que meu próprio espírito, graças ao tipo de leitura
que tenho feito, graças ao tai chi
[chuan] que pratico, graças à
mulher com quem sou casado,
que é uma mulher culta [Neusa
Martins], passou por uma
transformação até ser capaz de
criar um disco de bossa nova."
Segundo o músico, sua relação com os "homens finos" foi
de "fã à distância cósmica e, por
isso, apaixonado". "Não sou do
cacife desses grandes artistas."
Nave extraterrestre
A idéia de "Estudando a Bossa" aproveita a efeméride dos
50 anos da bossa nova e, se tem
algo em comum com "Estudando o Samba" (1976) e "Estudando o Pagode" (2005), o músico
diz que é apenas o fato de se debruçar sobre um gênero que,
neste caso, ele viu nascer.
"Na rádio Excelsior da Bahia,
em agosto de 58, de repente tocou uma coisa que era imensamente absurda, uma nave extraterrestre pousando em nossos ouvidos e, ao mesmo tempo, estava entranhada em toda
a história do samba que a gente
conhecia", lembra o músico.
A partir daquele dia, avalia
Tom Zé, os músicos de sua geração tiveram de "exacerbar
sua capacidade perceptiva, para poder conviver com a chegada no planeta Terra da gravação de "Chega de Saudade'".
Dias depois de ouvir a canção
inaugural da bossa, ele soube
que seu compositor era baiano
("outro susto cósmico!"), chamava-se João Gilberto e que estava na Bahia um moço que sabia fazer sua "levada" com o
violão. "Eu cheguei à casa dele e
já tinha cinco ou seis amigos
para aprender a levada do violão de João", conta.
O momento seguinte à chegada daquela nave, ele resume
como "uma febre de neurônios,
ansiedade e paixão" -ou, como
diz na letra de "João nos Tribunais", "diante do desafinado, o
mundo curva-se, desova".
Texto Anterior: MASP Próximo Texto: Disco faz Zé rimar com Gilberto Índice
|