São Paulo, quarta-feira, 05 de novembro de 2008

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Música

Tom Zé se rende à bossa nova

Compositor diz que "Estudando a Bossa - Nordeste Plaza" é seu primeiro disco com músicas "cantáveis'

Álbum tem participações de David Byrne e cantoras como Zélia Duncan, Mônica Salmaso, Fernanda Takai, Badi Assad e Marina de la Riva


AUDREY FURLANETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Tom Zé vem tendo "pesadelos sensacionais". Gravou o que considera seu primeiro disco de músicas "cantáveis", chamado "Estudando a Bossa - Nordeste Plaza". "Eu inauguro um novo espaço na minha vida, onde faço pela primeira vez músicas melódicas, cantáveis", diz.
"As transformações são assim. Todos os pesadelos meus têm uma mortandade enorme. Eu mato milhões de pessoas e estou o tempo todo ameaçado de morrer", conta, rindo. Por outro lado, com "Estudando", diz que vive uma das fases mais felizes de sua vida ao descobrir que suas músicas, agora, são "fáceis de se amar".
"Estudando a Bossa", que sai pela Biscoito Fino, tem menos ruídos e mais melodias suaves, como em "Barquinho Herói", "Filho do Pato" e "Roquenrol Bim-Bom", com delicadas vozes femininas de Fernanda Takai, Andréia Dias, Jussara Silveira e Anelis Assumpção, entre outras cantoras.
O resultado são faixas distantes do Tom Zé que diz ter feito música "crua e bárbara" enquanto os "bossa novistas finíssimos" Caetano Veloso e Gilberto Gil, nos anos 60, investiam em sons muito "depurados, muito perto da compreensão do que [Tom] Jobim, João [Gilberto] e [Carlos] Lyra estavam fazendo".
"Esses são verdadeiros homens finos", diz. "Tentei fazer essa coisa [em "Estudando a Bossa'] já que meu próprio espírito, graças ao tipo de leitura que tenho feito, graças ao tai chi [chuan] que pratico, graças à mulher com quem sou casado, que é uma mulher culta [Neusa Martins], passou por uma transformação até ser capaz de criar um disco de bossa nova."
Segundo o músico, sua relação com os "homens finos" foi de "fã à distância cósmica e, por isso, apaixonado". "Não sou do cacife desses grandes artistas."

Nave extraterrestre
A idéia de "Estudando a Bossa" aproveita a efeméride dos 50 anos da bossa nova e, se tem algo em comum com "Estudando o Samba" (1976) e "Estudando o Pagode" (2005), o músico diz que é apenas o fato de se debruçar sobre um gênero que, neste caso, ele viu nascer.
"Na rádio Excelsior da Bahia, em agosto de 58, de repente tocou uma coisa que era imensamente absurda, uma nave extraterrestre pousando em nossos ouvidos e, ao mesmo tempo, estava entranhada em toda a história do samba que a gente conhecia", lembra o músico.
A partir daquele dia, avalia Tom Zé, os músicos de sua geração tiveram de "exacerbar sua capacidade perceptiva, para poder conviver com a chegada no planeta Terra da gravação de "Chega de Saudade'".
Dias depois de ouvir a canção inaugural da bossa, ele soube que seu compositor era baiano ("outro susto cósmico!"), chamava-se João Gilberto e que estava na Bahia um moço que sabia fazer sua "levada" com o violão. "Eu cheguei à casa dele e já tinha cinco ou seis amigos para aprender a levada do violão de João", conta.
O momento seguinte à chegada daquela nave, ele resume como "uma febre de neurônios, ansiedade e paixão" -ou, como diz na letra de "João nos Tribunais", "diante do desafinado, o mundo curva-se, desova".


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