São Paulo, domingo, 05 de dezembro de 2004

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MÔNICA BERGAMO

Ana Ottoni/Folha Imagem
JOSIANE SARTORI, 30, ENFERMEIRA "Toda mulher sonha em se casar", diz Josiane, que se unirá a José Nelson, 57, em janeiro. No detalhe, as fotos do casal, que se conheceu por meio do "Virando a Noite", da Rádio Globo

Nas ondas da madrugada

No fim de setembro, a enfermeira Josiane Sartori viveu uma madrugada diferente ao lado do inseparável rádio de pilha. Ela, que trabalha à noite como acompanhante de uma senhora de 80 anos, sintonizou o programa "Virando a Noite", da Globo AM, e ouviu pela primeira vez a voz do mineiro "Ramón". "Tenho 44 anos e estou em busca de uma namorada, que tenha de 16 a 24 anos", disse ele, informando seu telefone no ar. Josiane tem 30. Sem namorado há dois anos, decidiu arriscar. "Senti na hora: era o homem que eu procurava. Coisa do coração."

"Ramón" é, na verdade, José Nelson, 57. Ao atender o telefone, contou vantagem: "O telefone não pára. Várias meninas já ligaram". Josiane retrucou: "Sou especial e quero ser a sua escolhida". Encontro marcado, ela viajou para Tebas (MG) e passou dez dias ao lado dele. "Vamos nos casar em janeiro", anuncia ela, que vai deixar a casa da mãe e se mudar para MG. "Em São Paulo, você encontra muita gente no metrô, no ônibus. Mas dá medo de falar com as pessoas."

"Muitos casamentos já começaram aqui", conta Álvaro Gimenez, locutor do programa, transmitido das 2h às 4h. Aos 45 anos, cabelo loiro cortado à moda Xororó, Gimenez é ídolo dos ouvintes. Ganha presente no Natal, lembrancinha de viagem, bolo caseiro, cesta de café da manhã. No meio da madrugada, ajuda as pessoas a encontrarem parentes, empregos e grandes amores. Gimenez comanda o "Virando a Noite" há dois anos. Antes, passou pela rádio Transamérica e chegou a trabalhar como operário no Japão.

O programa tem cerca de 10 mil ouvintes, segundo o Ibope. Começa com notícias e flash-backs da MPB. Os ouvintes ligam para se inscrever numa fila. São cerca de 50 por dia. Depois de 20 minutos no ar, Gimenez entra em contato com o primeiro da fila. Às 2h20 da terça, ele falou com "Ariel", da Vila Nova Cachoeirinha: "Gostaria de um futuro companheiro que tenha entre 48 e 55 anos". A ficha dela: 1,50 m, signo de capricórnio, 48 anos. "Está na flor da flor da idade", brinca o locutor.

No dia seguinte, "Ariel", na verdade Maria da Silva, já tinha atendido 20 ligações. "Tenho até um encontro marcado", comemora ela, que trabalha de madrugada, fazendo artesanato. "Ariel" já namorou dois ouvintes, mas não deu certo. Ela continua tentando.

Severino Pedro da Gama é porteiro de um edifício na Pompéia. No marasmo da madrugada, ele liga da portaria para o "Band Coruja", programa de Marcelo Batista, 33, na Band FM. "Adoro as piadas", conta.

"Se Deus é pai, Daniel é Filho e Boni é Sobrinho, Fábio é Júnior", diz o locutor da Band, para deleite do porteiro. Marcelo tem como assistente Rodrigo Muniz, o "Diguinho", 23, que já foi um fã do programa. "Eu tinha um problema de pulmão e passava a metade da semana no hospital sozinho. De madrugada, ligava para o Marcelo." Curado, Rodrigo trocou a faculdade de engenharia pela de rádio e TV e foi contratado.

O programa "Momentos Inesquecíveis", da Tupi FM (22h às 2h), procura fazer reflexões. "A paciência, por vezes, é amarga. Mas seus frutos são doces", diz o locutor Edi Barbosa, 40. Com seu jeito romântico, Edi ganhou fãs como a ouvinte Odete, que já foi recebida por ele no estúdio e lhe envia cartas de amor. "Quando nos encontramos, me contenho e sufoco meus desejos de te agarrar, beijar loucamente."

"Ela se apaixonou", diz Edi, de camisa e calça social. No pescoço, uma corrente de ouro. "Presente da mãe. Tem que usar."

O aposentado Maurício Cândido Vilares, 64, está "cansado de ficar sozinho". Nascido em Portugal, viúvo há dez anos, os filhos todos casados, ele se deita "depois do "Jornal Nacional'", acorda por volta das 2h e sintoniza o "Virando a Noite", da Globo AM. Na terça, telefonou para o estúdio. Seu objetivo: arrumar uma namorada. "Eu queria mesmo era uma portuguesa, que é a mulher mais fiel que existe. Mas é muito difícil encontrar uma "patrícia" de 60 anos disponível. Elas ficam viúvas e não largam mais o luto."

Fã de Roberto Leal e torcedor da Portuguesa, ele recebeu 12 telefonemas de pretendentes no dia seguinte. Com três delas, Hilda, Alice e Mara, decidiu manter contato. Hilda, 60, soma pontos por ser de família lusitana. Alice, 60, nasceu na Espanha e "é muito simpática". Mara, 57, mora até hoje com os pais. "Gostei do jeito dela."

Maurício ainda não se encontrou com elas, mas já tem uma predileta. "Por enquanto, a Mara é a que tem mais chances."


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