São Paulo, sexta-feira, 06 de fevereiro de 2004

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CINEMA/ESTRÉIAS

"TERRA DE SONHOS"

Filme do diretor irlandês narra trajetória de família que emigra para NY e enfrenta perda de filho

Sheridan vasculha a memória da morte

DO "THE INDEPENDENT"

É domingo à noite no pub Black Lion, na Kilburn High Road, em Londres. O "jukebox" está tocando "Dirty Old Town", de Shane MacGowan. Os clientes estão sentados em grupinhos de dois ou três, cada um com sua cerveja à frente, falando animadamente, arrancando da noite as últimas gotas possíveis de diversão. Sentado em meio às outras pessoas, anônimo, está Jim Sheridan, o várias vezes nomeado ao Oscar diretor responsável por filmes intransigentes como "Meu Pé Esquerdo" e "Em Nome do Pai".
A cena acima descrita aconteceu há 18 meses, e foi um momento memorável para nós, as 60 pessoas que se reuniram para assistir ao filme ainda inacabado, "Terra de Sonhos". Na época, ele ainda se chamava "East of Harlem".
Nascido de uma família com raízes no teatro, Sheridan participou na fundação da Companhia de Teatro Projeto Dublin, nos anos 1970, com seu irmão Peter, que hoje é escritor. Em 1981 ele entrou nos EUA clandestinamente e tomou as rédeas do Centro de Artes de Nova York, antes de estudar cinema na Universidade de Nova York.
"Terra de Sonhos" parece hoje, na sua estréia, estar prestes a dividir as opiniões dos cinéfilos e da crítica. Alguns saúdam essa história catártica de uma família que encontra sua alma como o melhor trabalho do diretor, outros criticam seu final muito adocicado e desigual.
O filme é estrelado pelo relativamente desconhecido Paddy Considine, no papel de Johnny, um ator irlandês desempregado que emigra para Manhattan com sua mulher, Sarah (Samantha Morton), e duas filhas (representadas pelas irmãs na vida real Sarah e Emma Bolger). Ostensivamente, eles estão em Nova York para começar vida nova. Na realidade, estão fugindo da morte do filho menor, na Irlanda.
Sheridan convocou suas duas filhas mais velhas, Naomi e Kirsten, para que cada uma escrevesse um esboço de roteiro do filme baseado em suas memórias de Nova York.
Quando volto a falar com Sheridan a situação já é muito diferente. Ele está em sua casa em Dublin numa bela manhã de outono e me recebe à porta usando robe azul.
"Fiz esse filme porque os irlandeses têm uma ligação íntima com a cultura da morte", diz Sheridan, devagar. Os pais em meu filme amam o filho morto mais do que qualquer outra pessoa.
As irmãs Emma e Sarah Bolger, ambas novatas como atrizes, são uma revelação nos papéis das filhas de Sheridan na telona. "Foi como brincar com meninas pela primeira vez em minha vida", declara o diretor. "Quando eu era menino, não havia meninas na minha escola. Minha mulher disse que eu parecia gostar das crianças no filme mais do que das minhas próprias filhas. Naomi, minha filha mais velha, falou: "É claro que sim. Ele pode reescrever essas meninas do jeito que quiser"."


Tradução Clara Allain

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