São Paulo, segunda-feira, 06 de março de 2000


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"The New Yorker" faz 75


Reprodução
Capa da edição em comemoração aos 75 anos da "New Yorker"



Revista semanal norte-americana, em cujas páginas já figuraram Nabokov, John Updike e Edward Wilson, completou 75 anos no último dia 21 e segue ainda a linha da "alegria, sátira e presença de espírito"


Revista ainda mantém princípios

AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas

Nunca houve outra revista como a "The New Yorker", o mais sofisticado dos semanários americanos, celebrando desde o último dia 21 seus 75 anos de publicação ininterrupta. E talvez jamais haverá outra igual. O excesso de celebrações da efeméride transmite certa ansiedade, como a do fim de uma era da revista, com suas recentes mudanças de editor e de endereço, e mesmo da imprensa escrita em meio ao turbilhão causado pela Internet.
Fundada em 1925, "The New Yorker" é o que mais próximo de uma real instituição cultural foi gerado pela indústria editorial dos EUA. É mais velha que o MoMA (1929) e que o Oscar (1928), embora muito mais nova que a Broadway e o Metropolitan, que se tornaram marcos culturais nova-iorquinos nas duas últimas décadas ainda do século 19. Entre seus pares, "Vanity Fair" a precedeu em 12 anos, enquanto "Time" e "Reader's Digest" lhe foram contemporâneas.
A revista surgiu como um projeto do jornalista Harold Ross. Financiada pelo magnata Raoul Fleischmann, "The New Yorker" tornou-se tudo aquilo que Ross sonhava: elegante, cosmopolita e, sobretudo, bem-humorada.
""The New Yorker" será um reflexo em palavra e imagem da vida metropolitana", definia Ross no texto de lançamento de 1924. "Seu tom geral será de alegria, sátira e presença de espírito, será uma revista tão divertida e informativa que se tornará uma necessidade". Sua fórmula encerrava-se com uma frase que se tornaria tão polêmica quanto lendária: ""The New Yorker" será a revista que não será editada para a velha dama de Dubuque" -o que por aqui equivaleria à famosa velhinha de Taubaté.
Sete décadas, cinco editores, quatro sedes e quase 4.000 edições depois é incrível como "The New Yorker" ainda segue aplicadamente a declaração de princípios firmada por Ross. Abre-se a revista e, depois do índice, da biografia dos colaboradores e da seção de cartas -todas adições recentes ao cardápio da revista-, eis "Goings On About Town", que traz a programação cultural nova-iorquina em notas breves.
A seguir, "The Talk of the Town" resume os temas do momento em crônicas, perfis e reportagens. Tantas vezes imitada, é a seção mais identificada com o mundo " The New Yorker". De E. W. White (o autor da história original do delicioso "O Pequeno Stuart Little") e Joseph Mitchell ao incansável John Updike, muito do melhor da prosa não-ficcional americana deixou lá sua marca.
O coração da revista inicia-se então, "cobrindo eventos contemporâneos e gente de interesse", trazendo "prosa e verso, curta e longa, humorística, satírica e variada", seguindo o modelo do criador, numa fórmula elevada a extremos de sofisticação pela arte maior do editor que sucedeu a Ross, William Shawn (1907-1992).
Nos 35 anos que permaneceu no cargo, sempre de terno e gravata, inverno ou verão, Shaw tornou-se o mais mitológico dos editores, acompanhando passo a passo a preparação de cada texto. Não estamos falando de textos quaisquer: Edmund Wilson sobre os manuscritos do mar Morto, Truman Capote e "A Sangue Frio", Mary McCarthy flanando por Florença e Veneza.
Um bloco de resenhas encerra a revista, com a exceção de uma cíclica página de humor final. Edmund Wilson, em sua melhor fase, e John Updike, até hoje, destacam-se entre os comentaristas de livros. A grande dama da crítica cinematográfica americana, Pauline Kael, lá fez carreira, sendo hoje substituída por David Denby e, sobretudo, por Anthony Lane, talvez a maior revelação da década passada.
"Palavra e imagem", exigia Ross, e é assim que "The New Yorker" tornou-se a casa de vários de grandes cartunistas (Thurber, Steinberg, Spiegelman, Mankoff, Charles Adams, a lista é imensa). Talvez nenhuma outra publicação americana tenha contribuído tanto para o reconhecimento do cartum como forma nobre de arte gráfica.
Desde 1985, "The New Yorker" é uma publicação do conglomerado jornalístico Advance Publications, que edita "Vanity Fair", sim, mas também "Mademoiselle" e "Glamour". Aos 79 anos, William Shawn foi abruptamente substituído por um editor de livros sem experiência jornalística, Robert Gottlieb, que cinco anos depois já passara o cargo para a poderosa jornalista britânica Tina Brown. Há dois anos, Brown passava o cetro para um jovem articulista, David Remnick, especialista em Rússia e esportes, e ia criar a concorrente mensal "Talk", para a Miramax.
"The New Yorker" reagiu com altos e baixos às mudanças, sem jamais descer do topo. Neste período, vendendo cerca de 800 mil exemplares semanais -e com as contas no vermelho-, pautou a imprensa, quando não o próprio governo, em questões internacionais e adiantou extratos de romances de Philip Roth, Salman Rushdie e Updike, entre vários. Se há paraíso, lá se lê "New Yorker".


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