São Paulo, sábado, 06 de julho de 2002

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"OCAS"

Projeto brasileiro segue a inglesa "The Big Issue", que é vendida nas ruas

Revista dá trabalho e voz a sem-teto

LINO BOCCHINI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Acostumados a mendigar, vender chicletes ou guardar carros por uns trocados, alguns moradores de rua de São Paulo e do Rio vão se tornar, a partir de hoje, os principais personagens de uma experiência inédita no Brasil.
Graças ao trabalho de um grupo de jovens e ao patrocínio de uma grife de roupas, será lançada hoje em São Paulo e segunda-feira, no Rio (18h, no Largo São Francisco), a revista "Ocas", uma espécie de "The Big Issue" brasileira.
Comum em Londres há mais de dez anos, "The Big Issue" (algo como "o grande assunto") é a primeira revista no mundo, ao lado da nova-iorquina "Street News", a ser vendida apenas pela população de rua.
A "Ocas" será vendida por R$ 2, e o lucro do vendedor será de R$ 1,50, já que comprará as revistas a R$ 0,50. Os cinco primeiros exemplares serão gratuitos, para que o vendedor possa se capitalizar.
O primeiro número da revista, produzida por profissionais, tem 32 páginas, é bem diagramado e traz como reportagem de capa uma entrevista com o cineasta Walter Salles. Há também um texto sobre Benedito "Sai do Lixo", morador de rua que já compôs e gravou dezenas de canções.
Por enquanto não há nenhum texto de sem-teto, mas, segundo o fotógrafo Luciano Rocco, 35, diretor da Organização Civil de Ação Social (ONG cuja sigla dá nome à publicação), "este é nosso objetivo, está até em nosso estatuto".
Neste primeiro número há também dez páginas com anúncios publicitários, sendo que sete delas com anúncios da M.Officer.
A "Ocas" terá, neste início, aproximadamente 25 vendedores no Rio (para tiragem de 5.000 exemplares) e cerca de 40 cadastrados em São Paulo (para tiragem de 10 mil). "A maioria dos moradores dorme em albergues, mas alguns dormem nas ruas", diz Rocco. Segundo ele, os vendedores passaram por treinamento e devem respeitar um código de conduta que explicita, por exemplo, que serão desligados do projeto os que oferecerem a revista bêbados, sob efeito de drogas ou acompanhados por crianças.
Hoje, são dezenas de publicações deste tipo no mundo, somando cerca de dois milhões de exemplares ao mês, de acordo com a INSP (The International Network of Street Papers), entidade à qual a "Ocas" pleiteia filiação.
Na América Latina já existem essas publicações. Na Argentina circula há dois anos a "Hecho en Buenos Aires", hoje com tiragem de 30 mil exemplares. Recentemente foi lançada a "Diagonal", também em Buenos Aires. Os moradores de rua uruguaios vendem a "Fator S" em Montevidéu, e em breve será lançada a "Hecho en Chile", em Santiago.
No começo da década de 90, foi lançado no Brasil o jornal "O Trecheiro", com o apoio da editora Paulus e de responsabilidade da Rede Rua, organização com participação da Igreja Católica. Seus textos são feitos por moradores de rua e tratam de temas de seu interesse. O jornal é mensal, tem tiragem de 6.000 exemplares e é distribuído gratuitamente por sem-tetos para sem-tetos.
Outra iniciativa circula há dois anos nas ruas de Porto Alegre. "Boca de Rua" é um jornal de quatro páginas, feito por moradores de rua e por eles vendido à população em geral, a R$ 1. Com edições trimestrais, o "Boca de Rua" tem tiragem de 3.000 exemplares, que são entregues gratuitamente aos sem-teto cadastrados.


LANÇAMENTO DA REVISTA "OCAS".
Quando: hoje, às 11h. Onde: Pátio do Colégio (Centro), São Paulo. Informações sobre a revista: (0/xx/11) 229-8400 e (0/ xx/21) 9676-1241.




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