São Paulo, terça-feira, 06 de agosto de 2002

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CULTURA SOB INTERVENÇÃO

Candidatos prometem ações contra pirataria e debate para controle da programação de TVs

Cultura é vista como meio de inclusão social

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia a seguir a continuação das respostas dadas pelos quatro principais candidatos à Presidência da República para questionário da Folha. (FRANCESCA ANGIOLILLO E SILVANA ARANTES)

Folha - O sr. pretende implementar ações específicas para o combate no país à pirataria na indústria musical, audiovisual e do livro?

Lula - O tratamento dessa questão deve responder a dois requisitos: a proteção do direito autoral e o barateamento do custo do produto que, no Brasil, é extorsivo. Uma prática antiga e aceita no mundo civilizado é a numeração do produto como mecanismo de controle e transparência na comercialização.

Ciro - Proteger a propriedade intelectual e artística é um dever imposto às autoridades pelo Estado de Direito democrático. Mas precisamos que a comunidade artística e cultural procure se interessar pela questão geral do país e milite na causa da mudança do modelo econômico e na modernização da administração pública.

Serra - Toda pirataria será combatida em meu governo. Pretendo definir ações políticas junto com os representantes das indústrias culturais e também com amplo esclarecimento da opinião pública sobre os efeitos negativos da pirataria sobre a renda, o emprego e os direitos de nossos artistas.

Garotinho - A pirataria é, hoje, um dos graves problemas do país. Propomos uma nova lei de direito autoral e mecanismos mais eficientes e eficazes de repressão e fiscalização para assegurar aos autores o direito de utilização e reprodução de suas obras.

Folha - Seu governo promoveria mudanças na relação entre o poder público e TVs abertas? Pretende impor controle às programações?

Lula - A relação entre o poder público e os meios de comunicação num país como o Brasil é um desafio para a sociedade inteira. A instalação do Conselho Nacional de Comunicação Social foi um passo importante e tardio nesse sentido. Temos agora que democratizá-lo. O governo e a sociedade devem construir os necessários mecanismos de controle das programações.

Ciro - A Constituição de 88, no seu artigo 224, previa um Conselho de Comunicação Social, que só agora foi nomeado. Podemos imaginar que estamos entrando numa nova etapa, em que poderemos colocar em prática, por exemplo, princípios da regionalização da produção audiovisual.
O Estado deve assumir o papel de agente de intermediação entre as TVs e a produção audiovisual independente. Penso também em apoiar e financiar a criação de cooperativas de jornalistas e produtores culturais, para democratizar o acesso à informação pluralista e à difusão cultural.

Serra - Minha história pessoal e minhas convicções me colocam radicalmente contra qualquer censura. Porém as empresas que têm concessão pública dos canais de TV devem ter grande responsabilidade educativa e de formação dos cidadãos brasileiros.
A este respeito, considero necessário abrir um debate entre o governo, as TVs e os telespectadores sobre a natureza da programação. Gostaria de ver nossas TVs atuando para a diminuição da violência e para a difusão dos valores da cultura brasileira.

Garotinho - Creio que a TV brasileira desenvolveu um padrão de qualidade particular, que só não conseguiu de todo a expressão que desejamos por causa do isolamento e da auto-suficiência. A TV no Brasil é mais a produtora do que a difusora dos programas brasileiros que apresenta. Para o desenvolvimento de uma expressão audiovisual brasileira, uma relação mais íntima entre TV e cinema é fundamental.

Folha - Como o sr. acha que a recém-criada Agência Nacional do Cinema (Ancine) deve fomentar a produção audiovisual brasileira? O sr. considera acertada sua criação?

Lula - O nosso governo não apenas vai prosseguir apoiando e estimulando a produção audiovisual brasileira mas deve pautar com a sociedade o debate em torno da distribuição e exibição dos filmes produzidos, para que eles tenham o maior alcance possível.
É preciso fixar uma política que estabeleça, como em outros países, um estreito vínculo entre a produção audiovisual e sua difusão, com as modificações que se fizerem necessárias na legislação. A criação da Ancine é positiva pois fornece mecanismo concreto para a atuação do poder público.

Ciro - A Ancine é fruto de uma demanda do setor audiovisual e como tal deve ser saudada como avanço. É necessário que disponha de recursos para fazer frente a todas as suas atribuições, que não são apenas o fomento mas também a regulação e a fiscalização do mercado. Pelos dados de hoje, já se pode antever a necessidade de ampliar suas receitas.

Serra - O governo Fernando Henrique deu importantes passos para a retomada da produção cinematográfica. Saímos de uma produção de dois filmes ao ano no início dos 90 para a média de 28 filmes nos últimos sete anos. A Ancine foi criada para permitir consolidar uma indústria cinematográfica no país, e seu papel será de continuar investindo na produção, mas buscando atender também distribuição e a exibição.

Garotinho - Tenho certeza de que ganhamos todos com a criação da Ancine, que poderá regular a atividade cinematográfica. Tenho a impressão de que, na maior parte do tempo, as políticas cinematográficas desenvolvidas pelo Estado procuravam atender só à questão da produção, deixando os filmes desassistidos depois de prontos. Vejo essa agência como a soma do melhor da experiência das últimas três décadas. Ela dará nova dinâmica à atividade.

Folha - O sr. considera válida a utilização da cultura como forma de inclusão social?

Lula - Devemos compreender o acesso aos bens culturais como um direito básico do cidadão, como o direito universal à educação e à saúde, por exemplo.
Entendo que o exercício desse direito à cultura é condição para o exercício da cidadania, ou seja, para a inclusão social. Não podemos, porém, pensar as políticas públicas de cultura fora do contexto social, fora da situação de desemprego e marginalização em que vive uma vasta parcela da sociedade brasileira. E atribuir a elas o poder milagroso de resolver o problema da inclusão social.
Nesse contexto, as políticas públicas de cultura podem e devem desempenhar, mais do que papel de inclusão, uma tarefa gigantesca de regeneração da sociedade.

Ciro - A identidade cultural de um povo é fundamental para que ele se afirme internacionalmente e para que ele se imponha às estruturas de dominação de minorias. É aí que se forma, por exemplo, seu padrão de consumo, sua estética, sua perspectiva diante da vida. Cultura, portanto, deve ser uma centralidade num modelo nacional de desenvolvimento.
É preciso democratizar o acesso da população brasileira aos seus bens culturais e isso só será possível se houver uma ampliação considerável dos espaços públicos. Começaremos por mapear, recuperar e ativar espaços hoje existentes que, em grande parte, estão degradados ou ociosos.

Serra - Em primeiro lugar, quero homenagear artistas e iniciativas culturais responsáveis por projetos comprometidos com um esforço de inclusão social. Carlinhos Brown e o Olodum, na Bahia, a Escola de Samba Mangueira, no Rio, e o projeto Guri, em SP, são alguns dos que poderia citar.
Em meu governo, o apoio à multiplicação de projetos como esses será uma prioridade. Além disso, a implantação de centros culturais nas periferias das cidades e no interior do país será instrumento de afirmação de nossa cultura, descoberta de talentos e diminuição da violência.

Garotinho - A cultura é elemento fundamental de inclusão social. Temos que desenvolver programas de inclusão social e de uma cultura de paz, como a abertura das escolas nos fins de semana, com a promoção de atividades artísticas e de lazer para as comunidades, e engajamento dos jovens em atividades que estimulem a sua livre expressão. Acredito que isso contribui para a diminuição da violência e da criminalidade.



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