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Supernovas
Novas cantoras surgem com trabalhos autorais em meio à crise da indústria fonográfica
RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O mercado fonográfico vem
enfrentando uma lenta morte,
anunciada há quase dez anos.
Mas, em vez de isso impedir ou
limitar o surgimento de novos
nomes, parece estar provocando o efeito contrário.
Nunca se viu tamanha efervescência na música brasileira,
com tantos novos artistas lançando discos e novas idéias. E,
cada vez mais, se ouvem novidades surgindo nesta época de
reinvenção de dogmas e paradigmas. Algumas dessas vozes
femininas ilustram esta página.
Na inovação, também se preserva uma tradição. A frase, tão
simples quanto fundamental, é
de Marina de La Riva, de 33
anos, uma das novas cantoras
que você ainda vai ouvir bastante se está atento para o que
acontece na música nacional
-se é que ainda não ouviu.
Marina, filha de pai cubano e
mãe brasileira, faz parte de
uma geração de músicos, compositores e cantores brasileiros
que têm como papel natural renovar nossas tradições, mas
também está inserida numa
tradição tão arraigada quanto
indelével na nossa produção: a
das cantoras e intérpretes.
Ao lado de gente como Bruna
Caram, Thaís Gulin, Tiê e tantas outras ainda escondidas por
aí, Marina faz parte da Geração
Supernova -em maiúsculas
mesmo, para marcar esse movimento- da música popular
brasileira -em minúsculas, para não confundir com a histórica MPB.
Em comum, elas têm o frescor, a disposição, a distância
dos clichês e o fato de terem
apenas um disco no currículo,
além de toda a história a acontecer em suas carreiras.
Ao lado delas, estão outras
cantoras como Mariana Aydar,
Céu, Roberta Sá, Vanessa da
Mata e Thalma de Freitas -essas já estabelecidas em suas
carreiras, funcionando como
uma espécie de norte (veja texto nesta página).
"Eu me enxergo como parte
da tradição de cantoras brasileiras, como Carmen Miranda e
Maysa, mas só posso fazer o
que faço hoje porque elas existiram", afirma Marina.
O fim das divas
Mas hoje as coisas funcionam diferente. O impulso artístico que faz alguém querer passar a vida inteira cantando pode não ter mudado tanto, mas
suas aplicações práticas, com
certeza se transformaram.
"Acho que existe essa coisa
de a minha geração ter pego logo no primeiro disco o auge da
crise do mercado fonográfico",
explica a curitibana de 28 anos,
moradora do Rio, Thaís Gulin.
"Isso gerou uma coisa nova,
uma atitude diferente para levar o trabalho adiante. Todo
mundo teve que aprender a fazer o trabalho braçal, e isso interferiu no nosso processo de
criação. Os trabalhos acabaram
ficando muito mais pessoais. É
uma coisa que assusta, mas que
fez com que a gente se descobrisse mais."
"Nós não precisamos de gravadoras, nós não precisamos
vender milhões", concorda a
paulistana Tiê, de 27 anos. "Hoje em dia é tudo mais real, não
existem mais divas. Muitas
cantoras colocam doçura no
que cantam, independente do
estilo e nos fazem nos apaixonar por elas. Mas é importante
não se distanciar, não criar paixão pelo que não existe."
Cena?
Curiosamente, apesar dos
vínculos pessoais serem quase
inexistentes entre as novas
cantoras, todas enxergam uma
movimentação com intenções
semelhantes e se identificam
entre si e com o que se faz de
novo na música brasileira.
"É todo mundo meio da mesma idade, me sinto parte da
mesma geração", diz Thaís. "A
gente acaba criando uma corrente", faz coro, sem saber, Marina de La Riva.
"Olha quantas cantoras novas estão aparecendo nos últimos tempos", observa Bruna
Caram, paulista de 21 anos.
"Costumava-se falar que a nova
música brasileira não existia,
que nunca iam superar os antigos. Mas veja quanta coisa nova
e boa temos hoje. Eu enxergo
sim uma nova MPB, mas ainda
não consigo delimitar, não sei
dizer exatamente o que é nem
onde ela começa e termina."
Realmente, talvez seja um
pouco cedo para lançar previsões ou enxergar revoluções na
música nacional. Mas as sementes foram plantadas e os
primeiros frutos estão nascendo. Só não vê quem não quer.
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