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OUTRO LADO
Criadora do pavilhão afirma que não pertence a "patota" e que espaço é um sucesso
Lessa responde às críticas sobre Hannover
Diretora diz que ela e sua equipe, de 30 pessoas, receberam R$ 490 mil por até um ano e três meses de trabalho
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NELSON DE SÁ
EDITOR DA ILUSTRADA
Nos últimos meses, escreveu-se
sobre Bia Lessa, 42, que ela é da
"patota" das artes, sempre presente "onde circulam altas cifras
do Tesouro". E que por isso foi
chamada para criar o pavilhão
brasileiro na Expo 2000, em Hannover (Alemanha).
Escreveu-se que ela "fez a campanha eleitoral de FHC" e "é historicamente ligada ao PSDB"
-em frases acompanhadas do
registro de que foi contratada sem
licitação.
Escreveu-se que ela recebeu
quase R$ 600 mil, dos R$ 18,8 milhões gastos pelo governo no pavilhão. Que criou uma "barraca
de acarajé para gringo ver". E
mais: "Fora a Bia Lessa!".
As frases foram publicadas na
Folha -e em outros jornais, com
formulações diferentes. A diretora evitou responder às críticas na
época. A seguir, ela apresenta sua
versão da história.
Folha - Para começar, o dinheiro.
O investimento no pavilhão passou
por você?
Bia Lessa - Nunca tive acesso às
contas, aos valores, à escolha de
quem iria executar o projeto...
Antes de falar do dinheiro, quero
dizer que até agora não respondi
às acusações que me foram insistentemente feitas porque sempre
acreditei que o trabalho é capaz de
responder melhor a todas as
questões.
Mas, no caso do pavilhão em
Hannover, a obra está distante do
Brasil e são poucas as informações que chegam pelos meios de
comunicação. O pavilhão está entrando no seu quarto mês de exibição e os resultados já são bem
concretos: 1,5 milhão de visitantes, 40% dos espectadores que
passam pela Expo visitam o espaço do Brasil.
Neste momento, falo com o intuito de esclarecer as inverdades
que foram publicadas, sem reforçar um bate-boca com os jornais e
sem que as respostas pareçam
justificativas vazias de um trabalho fracassado.
Estamos num momento de comemoração, toda a equipe responsável pelo projeto, todos os
artistas, pessoas, cientistas que estão expostos no pavilhão. Aproveito para agradecer o esforço de
todos.
Folha - O dinheiro?
Lessa - Bom, quando me chamaram para fazer o pavilhão, eu disse que faria desde que tivesse absoluta autonomia e liberdade. É
uma cláusula que faz parte de
meu contrato e que prevê também a impossibilidade de alteração do projeto.
Estou dizendo isso para esclarecer que não tenho nenhum envolvimento com a execução. Meu
único envolvimento foi o de
acompanhar e orientar a obra
sempre que necessário. Mas posso atestar que a execução foi feita
com muita competência.
O que recebemos, eu e uma
equipe de 30 pessoas, entre arquitetos, engenheiros, pesquisadores, artistas, assistentes e outros,
por um período, em alguns casos,
de um ano e três meses de trabalho, foi a quantia de R$ 490 mil, já
deduzidos os impostos.
Essa verba correspondia à execução da tarefa de concepção artística do pavilhão do Brasil em
Hannover; aos trabalhos de concepção arquitetônica, o projeto
acústico, elétrico, cálculo estrutural etc.; o de pesquisa artística,
econômica, científica, social, englobando todo o território nacional; o de curadoria, para a seleção
de todo o material expositivo;
mais programação visual, supervisão artística, acompanhamento
da execução da obra e supervisão
da manutenção do pavilhão -e
todos os gastos de produção referentes a essas etapas.
Folha - As 30 pessoas que você
mencionou são da sua empresa?
Lessa - Não. Eu não sou uma
empresa, mas uma pessoa. Para
cada trabalho, chamo alguns profissionais que acho adequados
àquele projeto.
Para o pavilhão, chamei o Gringo Cardia para fazer direção de
arte; o Paulo Pederneiras para fazer o design de luz; a Maria Lucia
Montes para coordenar a pesquisa; o Luís Alberto de Oliveira para
coordenar a área científica; o
Martin Corullon para fazer o design de espaço, ele que já havia
trabalhado comigo e o Paulo
Mendes da Rocha em outros trabalhos; o Dany Roland para a pesquisa musical.
Uma equipe que pudesse cumprir a tarefa num espaço tão curto
de tempo e que tivesse indiscutíveis contribuições a fazer. Para a
etapa de execução, em torno de
300 pessoas foram convidadas:
Arnaldo Antunes, Marcelo Dantas, Etel Carmona, Raquel Arnaud, Rubens Fernandes Jr., fotógrafos, artistas plásticos etc.
Cada grampo que está exposto,
cada palavra escrita, passou por
nós. Vimos, discutimos, refizemos. E continuamos fazendo agora, durante a manutenção, para
que o trabalho não seja descaracterizado. É um trabalho diário.
Quando eu dirijo um espetáculo, depois da estréia eu assisto a
quase todas as apresentações. O
teatro tem essa vantagem. Você
pode refazê-lo diariamente. Não
tem a dor do escritor que não pode refazer um parágrafo, depois
de publicado o livro. Teatro é especial nesse sentido.
No caso da Expo, é o oposto. O
trabalho tem de ser mantido, não
pode ser descaracterizado. Essa
também foi uma de minhas exigências contratuais: que o trabalho não fosse descaracterizado.
Uma lâmpada que falte, uma publicidade que se coloque, o trabalho vai pelo ralo abaixo.
Folha - E quanto à falta de licitação?
Lessa - Eu acredito que tenha sido convidada por causa da exposição "Brasileiro Que Nem Eu.
Que Nem Quem?" e por causa do
filme "Brasil", que está em fase de
montagem e nos levou a conhecer
muitas regiões brasileiras. Quanto à contratação, ela foi feita por
meio da lei 8.666/93, que abre
mão da licitação.
Folha - Você nunca fez campanha
para Fernando Henrique?
Lessa - Eu nunca fiz campanha
para o Fernando Henrique nem
para ninguém. E, se tivesse feito, o
trabalho seria pior? Também não
conhecia o Paulo Henrique (Cardoso, filho de FHC e membro do
comissariado que organizou o pavilhão brasileiro), como foi amplamente divulgado. Não faço
parte de nenhuma patota, até sou
bem solitária.
Folha - Você não tem uma ligação
histórica com o PSDB?
Lessa - Nenhuma.
Folha - Tem também as viagens.
Lessa - É, saía no jornal: "Bia foi
dez vezes à Europa". Fomos uma
vez, eu, o Martin Corullon e o
meu assistente, para conhecer o
espaço e ter reuniões técnicas
com a Expo. Depois fomos em
maio, já para a supervisão da execução, ficando até a inauguração
em 1º de junho. Depois eu fui
mais uma vez para a manutenção.
Folha - Um procurador da República disse que iria processar você:
"Com esse processo, vou pedir que
ela devolva todo o dinheiro". Isso
foi em frente?
Lessa - Se ele de fato deu essa declaração, deveria na época estar
mal informado. E depois, de posse dos dados, percebeu que não
havia nada irregular com nossos
trabalhos. Afinal, fomos convidados a fazer um projeto, apresentamos um orçamento que foi aprovado e cumprimos a tarefa. Hoje,
o pavilhão do Brasil é o quarto
mais visitado da Expo. E é bom
lembrar que estamos ao lado de
países que gastaram US$ 140 milhões e levaram seis anos para
executar os pavilhões.
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