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Pontos de ônibus oferecem livros
A 10 km de biblioteca inativa de Brasília, projeto de açougueiro cria espaços para retirada gratuita de volumes
Bibliotecas populares oferecem 10 mil livros, de Scott Fitzgerald a auto-ajuda e enciclopédias, sem prazo de devolução nem multa
Lula Marques - 23.ago.2007/Folha Imagem
![](../images/i0609200703.jpg) |
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Biblioteca em parada de ônibus na quadra 712, na parte norte da via W3; projeto Parada Cultural conseguiu patrocínio da Caesb e da Embaixada da Espanha
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Paralela ao Eixão, a megapista que corta de ponta a ponta as
"asas" do avião de Brasília, a via
W3 reúne elementos urbanos
que, da capital planejada, são o
que mais lembra o centro de
uma metrópole convencional:
um comércio profuso e desordenado, sinais de trânsito e,
mais estranho ainda ao Plano
Piloto, muitas esquinas.
A novidade que difere a W3
de qualquer outra avenida do
país está em pontos de ônibus
da sua parte norte. Entre as
quadras 712 e 713, a 10 km da
inaugurada mas inativa Biblioteca Nacional, nasceu há dois
meses e meio um projeto que,
engenhoso, barato e de alto retorno ao público, é uma antítese da empreitada na Esplanada.
A Parada Cultural impressiona pela singeleza: uma biblioteca pública foi montada em pontos de ônibus, de onde qualquer
um, passageiro ou não, pode retirar livros de graça. Durante o
dia, um funcionário registra as
retiradas; a partir das 18h, basta
ao usuário pegar o livro e anotar nome e contato numa papeleta. Não há prazo para devolução, cobrança nem multa.
Com o sucesso da matriz, minibibliotecas foram instaladas
em outras quatro paradas. Ao
todo, são quase 10 mil livros.
Concebido pelo baiano Luiz
Amorim, 42, misto de açougueiro e agitador cultural alfabetizado aos 16 anos, o projeto
reflete idéias singulares. "Minha inspiração é a literatura. Se
você lê grandes pensadores,
Gramsci, Sartre, Nietzsche,
Hobsbawm, é levado a refletir:
"Que ação posso fazer para chegar a uma sociedade melhor?"."
"Veja o modelo de biblioteca
pública no país", prossegue, "é
difícil e burocrático, fica longe
de casa, tem de levar documento, pagar multa por atraso...".
Amorim conseguiu patrocínio da Caesb (companhia de saneamento do DF) e da Embaixada da Espanha, R$ 40 mil por
um ano. Agora, busca parceiros
que possam adotar outras paradas. Os livros vieram de doações e de seus empreendimentos, o Açougue Cultural T-Bone, que vende carnes e empresta livros, e uma ONG que promove palestras, shows e saraus.
Há de tudo nas prateleiras,
inclusive literatura de primeira. Tolstói, Júlio Verne, Camus,
Monteiro Lobato e Scott Fitzgerald se misturam a livros escolares, de auto-ajuda, Seleções
Reader's Digest e enciclopédias. Até hoje, ele jura, nenhum
livro foi furtado das paradas.
Numa noite de agosto, enquanto esperava o ônibus para
casa, em Riacho Fundo 1, periferia de Brasília, a comerciária
Tânia Cruz lia em pé "Amor de
Perdição", de Camilo Castelo
Branco, que pegara dias antes.
"É uma história de amor proibido, superando barreiras. Não
tenho tempo de ir à biblioteca,
então leio nas viagens."
O estudante de história
Eduardo Silva trazia junto à
axila um "Síntese de História
da Cultura Brasileira", de Nelson Werneck Sodré, que acabara de retirar. "O diferencial é a
facilidade de pegar o livro, a fé
no público. Ele pensa na construção de valores, a reciprocidade entre a sua intenção e a intenção dele. Deixa uma expectativa boa."
(FÁBIO VICTOR)
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