São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

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Tempos bem modernos

Filmes em 3D lotam salas; no Brasil, o formato, restrito a 70 cinemas, responde por um terço do faturamento de uma produção e incentiva empresários a renovarem projetores

ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL

Parece até efeito especial. "As salas respondem por um terço da bilheteria", crava Paulo Sérgio Almeida, diretor do Filme B, que segue os números cinematográficos no Brasil. "Faremos R$ 1 bilhão em bilheteria neste ano. Se não fosse o 3D, não chegaríamos perto disso." Em 2008, foram R$ 700 milhões em bilheteria.
O tom entusiasmado indica que Hollywood, que entrou nos anos 2000 abatido, talvez tenha encontrado um atalho para sair da mesmice. "Essa é a indústria. Hollywood sempre tenta oferecer um novo atrativo", diz Rodrigo Saturnino Braga, da Sony Pictures. "O Cinemascope foi uma resposta à TV." O 3D é uma resposta ao home-theater, à internet e à pirataria. Trata-se, de quebra, de turbinar uma técnica menos acessível e garantir hegemonia.
Se são corriqueiras as invenções embaladas como "novidade", menos comuns são os números deste ano. E enquanto os filmes se revelavam um pote de ouro, a aceitação "cultural" viria com os tapetes vermelhos estendidos pelos festivais de Cannes e Veneza para o formato. No Brasil, a virada econômica se deu com "A Era do Gelo 3". "É um atrativo no estilo parque de diversões", define Adhemar Oliveira, dono da rede Arteplex. "O cinema passou por evoluções no som, no sistema de exibição, mas, desde os anos 60, a imagem estava parada."
Os donos de salas esfregam as mãos. A despeito dos altos custos de instalação, até mesmo empresários menores, como Marcos Araújo, que possui salas em 18 cidades -do interior de São Paulo ao Acre-, espantou a cautela e adquiriu nove projetores novos. "A sala 3D valoriza as outras salas de um complexo", diz. "Com "Avatar", a gente paga o projetor."
"Avatar" virou palavra mágica. O thriller de James Cameron, que testa limites entre real e virtual e estreia no fim do ano, é alardeado como a grande revolução digital. A palavra revolução tem, na indústria cultural, muito de marketing, mas é fato que os exibidores têm corrido atrás de projetores aptos a receber o filme-sensação.
Se o oba-oba se espalha é porque, por enquanto, o público tem respondido na mesma moeda. Apesar dos ingressos de até R$ 26, as salas 3D têm uma taxa de ocupação, no mínimo, duas vezes maior do que as demais. "É bom lembrar que a oferta é menor e, por isso, são mais concorridas", diz Marcelo Bertini, presidente do Cinemark. Uma consequência do pequeno número de salas é a fila de filmes à espera de uma tela. "Up - Altas Aventuras" não estreou em julho porque não teria como disputar espaço com "A Era do Gelo". "Não havia complexos em que os dois filmes pudessem ser exibidos ao mesmo tempo. No ano que vem, deve haver um congestionamento", diz Saturnino Braga.
A quem se apressa a incluir o 3D na linha do tempo que inclui a passagem do cinema mudo para o sonoro e o nascimento do technicolor, Bertini pondera: "Quando surgiu o cinema sonoro, todos aderiram. Com o 3D não vai ser assim. Esse formato é para determinados tipos de filme, sobretudo ação e animação".
Luiz Gonzaga de Luca, PhD em Ciências da Comunicação pela ECA-USP, estica um olho para o futuro. E discorda. Para ele, este 3D não permanecerá. Mas outro, "holográfico", deixará tudo novo de novo. "Haverá o 3D sem óculos, que já está sendo pesquisado. Esse virá para ficar", aposta. Para exemplificar as mudanças sem volta, Gonzaga relembra um causo. "Quando garoto, ouvi um homem perguntar ao bilheteiro se o filme era preto-e-branco ou colorido. Ao saber que era P&B, ele questionou: "É mais barato?". Um dia dirão: se existe 3D porque este filme é 2D?". O futuro aos óculos pertence.


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