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Biógrafo diz que, como Gardel, Sosa "não morreu"
Rodolfo Braceli, que coescreveu livro com artista em 2003, prepara nova edição da trajetória de vida da argentina
Jornalista conta como discutiu com cantora sugestões de mudança no hino nacional argentino; "morrer" daria lugar a "viver"
DENISE MOTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE
MONTEVIDÉU
Amigo de quatro décadas da
cantora argentina, autor de
"Mercedes Sosa, La Negra" (ed.
Sudamericana, 2003), que escreveu ao lado da artista, o jornalista e dramaturgo Rodolfo
Braceli, 69, diz que Sosa, como
Carlos Gardel, "não morreu".
"Cada dia canta melhor", afirma, em alusão à famosa frase
reservada, até anteontem, ao
célebre cantor de tango.
Ainda sob o impacto da notícia da morte da cantora, no domingo, Braceli, que prepara um
volume atualizado com histórias da vida de Sosa, falou à Folha sobre as memórias com "La
Negra", como era chamada.
Uma delas viveu com Milton
Nascimento dentro do carro da
cantora, que adorava dirigir em
alta velocidade. "Íamos sete
pessoas no automóvel -Mercedes, Milton e eu na frente.
Perto do Aeroparque [aeroporto para voos domésticos em
Buenos Aires], o carro parou
em plena linha de trem. Ao longe, vinha uma locomotiva e, naturalmente, vivemos segundos
de inquietação. Milton, não. Ele
aumentou o volume do toca-fitas. Depois do susto, perguntei
porque fez aquilo e ele disse:
"Porque, se aquele era o final,
seria o final mais feliz da minha
vida". Escutávamos a Negra
cantando uma música dele."
Sosa conheceu o jornalista
no começo dos anos 60, quando
estava casada com Manuel Oscar Matus, pai de seu filho Fabián- e acabava de chegar a
Mendoza. "Vivia rodeada de escritores, pintores, poetas. Era
vaidosa, tinha uma cinturinha
de vespa e era uma esponja que
absorvia tudo. Suas noites terminavam entre intelectuais e
com ela cantando. Mercedes vivia uma dupla gravidez: a de Fabián e a do novo cancioneiro
(movimento lançado em 1963
que tinha entre os objetivos integrar o cancioneiro popular ao
desenvolvimento criador do
povo). Aí se tornou mulher,
mãe, quebrou a casca do ovo como cantora e viveu entre amigos luminosos. Éramos felizes e
não sabíamos."
Do livro fazem parte passagens "belas e dolorosas" da vida
de Sosa. "Ali estão o aborto, a
vida com o filho, com os netos,
com a mãe, o pensamento."
Também as ameaças de morte
que recebeu em 1975 da organização Triple A, o exílio e a volta
à Argentina, em 1982.
Na última vez em que conversou com a cantora, por telefone, há dois meses, o hino nacional foi tema do bate-papo.
Sosa concordava com o que havia proposto o escritor em artigo de jornal: que o verso "o juremos con gloria morir", parte
do estribilho da composição argentina, fosse substituído por
algo "mais modesto": "o juremos con gloria vivir". No álbum
"Cantora", ela deixa registrada
essa versão do hino de seu país.
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