|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Tailandês exibe cinema vigoroso e político em mostra parisiense
Museu de Arte Moderna exibe produções de Apichatpong Weerasethakul
ALCINO LEITE NETO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
O nome é complicado, mas
vale aprendê-lo de cor, pois designa um dos diretores mais relevantes do cinema atual: Apichatpong Weerasethakul.
Tailandês, 39 anos, admirado
pela elite da crítica cinematográfica por filmes como "Mal
dos Trópicos" (2004) e "Síndromes e um Século" (2006),
Weerasethakul caiu agora nas
graças das artes plásticas.
Tanto assim que, na última
quinta, o prestigioso Museu de
Arte Moderna de Paris inaugurou uma exposição-instalação
do diretor, com oito curtas exibidos em telões, além de fotografias, objetos e desenhos.
Chamada "Primitive" (primitivo), a instalação esteve antes na Haus der Kunst, de Munique, e reúne parte do trabalho prévio de Weerasethakul
para seu sexto longa. Na verdade, os curtas são mais que esboços de uma obra futura. Valem
por si mesmos, tal a intensidade de cada um e a pertinência e
beleza do conjunto.
Foram todos realizados na
região de Nabua, no nordeste
da Tailândia, e têm como base o
livro "Um Homem Que se Lembra de Suas Vidas Passadas",
escrito por um monge budista.
A ideia parece um tanto
transcendental, mas foi apenas
o ponto de partida para Weerasethakul fazer uma reflexão
poético-política sobre a memória histórica, o esquecimento e
o próprio sistema de "encarnações" do cinema.
Nabua foi nos anos 60 um
ponto crítico da luta anticomunista na Tailândia. Conflitos armados, tortura e sofrimento
marcaram essa região rural,
mas toda essa história foi se
perdendo. Houve o trauma da
repressão e agora há o trauma
de não saber desse passado, diz
Weerasethakul -sobretudo da
parte dos jovens, que são protagonistas de todos os curtas. O
intuito do diretor "é reativar a
memória" dos habitantes.
Mas não há nada de didatizante nos filmes. Firmemente
ancorado no presente, Weerasethakul constrói sequências
em que o passado se manifesta
de maneira alegórica ou na forma de sinais e indícios, expressos tanto nas palavras e gestos
dos homens, quanto nas formas e forças da natureza.
Assim, no extraordinário
"Fantasmas de Nabua" (que
pode ser visto no site
www.animateprojects.org),
raios e trovões explodem num
descampado à noite, como se a
natureza guardasse a memória
das lutas noturnas travadas pelos camponeses.
Em seguida, as mesmas cenas que vimos são projetadas
numa tela de pano estendida
no campo -como se elas tivessem "desencarnado" de um
plano da imagem e "reencarnado" em outro. A sequência termina com uma perigosa partida de futebol jogada por rapazes, com bolas de fogo.
Todos os filmes tentam mostrar como o passado irradia sua
energia política sobre os habitantes de Nabua, como a utopia
coletiva continua clamando,
como um fantasma feroz, por
uma encarnação.
Texto Anterior: Trecho Próximo Texto: "Grey's" tenta juntar pontas em sexto ano Índice
|