São Paulo, sábado, 06 de novembro de 2004

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Achados e perdidos

Luiz Novaes/Folha Imagem
Paulo Leminski (1944-89), que tem seu livro "Gozo Fabuloso" lançado agora


Após 15 anos de sua morte, Paulo Leminski tem seu último livro inédito lançado e obra reeditada

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Pouco antes de morrer, em junho de 1989, o escritor Paulo Leminski selecionou três dezenas de contos e crônicas seus, nunca publicados em livro. Organizou os textos em um índice, escreveu uma introdução, enfiou tudo em uma pasta, e colou sobre ela um adesivo escrito "Gozo Fabuloso".
Passou um ano, passaram cinco, e a pasta verde, de plástico, continuava fechada, passeando perdida em fundos de gavetas de editoras. Passaram 15 anos, e chega enfim o "abre-te Sésamo".
Último livro inédito organizado por Paulo Leminski (1944-89), "Gozo Fabuloso" será lançado nesta quarta-feira, em São Paulo. E desta vez o poeta de "ai do acaso se não ficar do meu lado" teve o pedido (ameaça) atendido.
Sua última obra vem com embalo de nova, puxando o lançamento de uma ambiciosa coleção de literatura, a "Risco: Ruído", primeira incursão da tradicional editora de livros de arte DBA no campo da ficção.
Com a publicação, chega ao fim uma "lenda urbana" cochichada de ouvido a ouvido na nada pequena panelinha leminskiana (no site Orkut, uma das comunidades dedicadas ao escritor curitibano tem mais de 2.300 inscritos).
O escritor Joca Reiners Terron é um dos que sempre escutou a tal história do "livro perdido", a "obra inédita" de Leminski.
Quando foi chamado para ser um dos curadores da coleção da DBA, arregaçou as mangas da camiseta e foi atrás. Com a ajuda de Alice Ruiz, musa e mulher do poeta, localizou, decifrou, organizou e posfaciou "Gozo Fabuloso".
Terron e Ruiz, que assina o prefácio, relembram uma curiosidade da relação do criador com a criatura. No final dos anos 60, Leminski e sua mulher chegaram a protestar contra o formato de narrativas curtas, então muito na moda e objeto de um famoso concurso oficial em Curitiba.
Foram a uma das cerimônias de entrega do prêmio de contos com cartazes. "O meu simulava uma TV com os dizeres "Pena o conto não ser em cores'", lembra a também poeta Alice Ruiz. O de Leminski estocava mais fundo: "O conto é o soneto de hoje".
O tempo deu suas voltas, e o poeta acabou fazendo aqui e acolá também seus "sonetos": contos e crônicas que produzia para publicar em jornais pequenos do Paraná ou em revistas literárias.
Autor de dois livros de prosa, o lendário "Catatau", que teve recentemente caprichada reedição, e o enigmático "Agora É que São Elas", Leminski é outro nestas 29 crônicas e contos. "É um trabalho bem diferente dos demais dele. E os textos são bem diversos entre si. Tem desde algo meio pornográfico até coisas quase bangue-bangue", diz Ruiz.
Terron afirma que vê como elo entre "Gozo" e os demais trabalhos leminskianos o seu lirismo e o gosto pela brincadeira com a linguagem. "Mas são contos no sentido mais estrito do termo."
Como dizia o próprio Leminski na apresentação, "quem conta, tem que contar". E ele conta, seja a história de índios que descobrem pedras que falam, seja de um suicida que narra sua queda de um prédio, andar por andar.
Estatelado fica o leitor, ao final das histórias. Fã do judô, Leminski não "perde a forma". Mais uma vez, ganha por ippon.


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