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MEMÓRIA
Denoy de Oliveira distinguiu-se pelo afeto
da Redação
Foi, em todo caso, um modo de
morrer coerente: do coração, como Denoy de Oliveira (morto anteontem) sempre viveu, e não dos
rins, que o ameaçaram seriamente,
anos atrás. Naquela ocasião, Denoy foi salvo por um transplante, o
órgão tendo sido doado, salvo engano, pelo irmão, o também cineasta Xavier de Oliveira.
O coração é possivelmente o que
distinguiu Denoy desde que chegou a São Paulo, nos anos 70. Trazia embaixo do braço a comédia
"Amante Muito Louca", seu primeiro filme (para o meu gosto, seu
melhor trabalho, com Thereza Rachel como a amante que punha em
questão convenções sociais).
Denoy de Oliveira parecia desde
então incapaz de uma atitude atritiva. Talvez por isso tenha adquirido rapidamente a confiança dos cineastas paulistas, a ponto de se tornar presidente da Apaci (Associação Paulista dos Cineastas). Não é
dizer pouco, pois a Apaci fora fundada num momento em que cineastas de Rio e São Paulo viviam
às turras, porque São Paulo sentia-se discriminado pela Embrafilme.
Denoy era um cineasta simples.
Filmava com orçamentos baixos, e
em geral seus filmes davam a impressão de serem feitos às pressas,
como se o fazer cinematográfico o
irritasse, como se o cinema fosse
uma espécie de exílio a que fora
constrangido pelo acaso (ele tinha
formação originalmente teatral).
Nunca conversamos mais de
dois minutos sobre nossas divergências, que eram muitas, em parte porque Denoy parecia não se interessar muito por isso, como se
buscasse ter com as pessoas um relacionamento direto, que passasse
ao largo das idéias. O mais estranho é que conseguia.
Se alguém perguntar qual o
maior legado de Denoy de Oliveira
para o cinema brasileiro, será possível pensar em algum de seus filmes, em alguma idéia.
Mas sua principal contribuição
terá estado, talvez, em um modo
de ser. Fazia política sem se indispor com quem divergia de suas
idéias, mas também sem abrir mão
delas. Se discutia, evitava que isso
alterasse a cordialidade e o afeto.
Num meio por vezes toldado por
relações de concorrência muito
fortes, Denoy de Oliveira estabeleceu um patamar de relacionamento tanto pessoal como político baseado no cavalheirismo e no afeto
que dedicava às pessoas. Muitas
vezes, era o que fazia a diferença.
(INÁCIO ARAUJO)
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