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Grupo faz "artivismo" em ação em São Paulo
Experiência Imersiva Ambiental propõe questionamento da vigilância
Performance em câmeras instaladas na cidade se inspira em exemplos anteriores; projetos como esse estão na Bienal de SP
ADRIANA FERREIRA SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL
Numa cidade como São Paulo, não é novidade andar pelas
ruas e assistir a cenas inusitadas, que parecem ter saído de
um filme. Hoje, no entanto, alguns movimentos duvidosos
podem fazer parte de um projeto artístico.
A partir das 11h, num local
não-divulgado -para não estragar a surpresa-, cerca de 25
pessoas irão protagonizar performances diversas diante das
câmeras que vigiam as ruas. A
atuação, batizada de "Atitude
Suspeita", faz parte da semana
de eventos proposta pelo Experiência Imersiva Ambiental
(EIA), grupo que reúne artistas
de todo o país para fazer trabalhos de arte pública, que tanto
podem ser uma festa como uma
ação, como a desta manhã.
Essa atividade se encaixa em
duas categorias que, segundo o
pesquisador Ricardo Rosas, 36,
criador do site Rizoma (endereço ao lado), têm proliferado
no Brasil: a da "mídia tática" e a
da "arte ativista", engajada ou
"artivista". A exemplo de artistas, grupos e coletivos espalhados pelo mundo todo, os brasileiros têm desenvolvido trabalhos que questionam a mídia, a
política e a própria arte por
meio de instalações, performances, vídeos etc.
Por trás das ações que irão
ocorrer hoje -que também não
foram descritas, para não estragar a surpresa- estão questões
como "Quais são os direitos sobre o uso da imagem?" ou "Por
que devemos ser vigiados?" .
"Recebemos pela internet o número de câmeras que existe em
SP e o local onde se encontram.
Pensamos que seria engraçado
se estivessem acontecendo coisas suspeitas em frente a elas",
explica Eduardo Verderame,
35, integrante do EIA.
Vigiados
Críticas tendo como ponto
de partida as câmeras de vigilância estão longe de ser uma
novidade. Em Nova York, o
grupo Surveillance Camera
Players (www.notbored.org/the-scp.html) mapeia locais
onde estão esses equipamentos
em cidades americanas e realiza performances.
Na 27ª Bienal de São Paulo, o
paulistano Marcelo Cidade espalhou câmeras de papelão pelo prédio da mostra. "A câmera
de vigilância faz parte de nosso
cotidiano. Cada vez mais as
imagens ali geradas podem ser
também assistidas em público.
Isso sugere que, na sociedade
em que vivemos, o espetáculo e
a vigilância se sobrepõem.
Questões ligadas à privacidade,
ao direito individual, ao testemunho legal se interpenetram
com a arte", explica Cristina
Freire, 44, co-curadora da Bienal e professora do MAC-USP.
"Acredito que não basta apenas valer-se das imagens da câmera de vigilância, mas refletir
sobre seu sentido e significados
mais profundos", completa
Freire. No caso do EIA, Verderame diz que o grupo prefere
acreditar no "poder simbólico"
da "Atitude Suspeita".
"A atuação vai repercutir em
outros lugares, os registros serão mostrados para outras pessoas, e o número de pessoas a
tomar contato com a questão
cresce, outros se envolvem",
aposta Verderame.
O inusitado é que a crítica ao
uso desses dispositivos pelo
poder público para vigiar os
paulistanos foi desenvolvida
dentro de um órgão público: a
Oficina Oswald de Andrade,
onde o EIA realizou o curso
"Vigilia", que preparou os artistas para a "Atitude Suspeita".
"Nós usamos o equipamento
público para o que ele deve ser
usado: em prol das pessoas, da
liberdade de pensamento e expressão", fala Verderame.
Engajados
As ruas não são o único cenário dos "artivistas". Na Bienal,
além de Marcelo Cidade, houve
a controversa participação do
coletivo dinamarquês Superflex, que ficou de fora da mostra
porque pretendia reapropriar-se dos ingredientes de um refrigerante e, eliminando a marca,
converter o lucro aos produtores comunitários.
Ainda na Bienal, Cristina
Freire destaca a instalação da
brasileira Renata Lucas e a obra
da mexicana Minerva Cuevas,
que, descreve a curadora,
"criou a empresa virtual Mejor
Vida Corporation, com estrutura similar à das grandes corporações". "Essa corporação
artística opera na "www" [internet], subverte o sentido de comércio na rede e questiona dali
a paisagem social em tempos de
globalização", diz a curadora.
De longa data
Ricardo Rosas destaca que as
ações de mídia tática e arte ativismo -veja definições ao lado- estão, "aos poucos", amadurecendo no Brasil. Um
exemplo disso é o curso sobre
intervenção urbana ministrado
pelo artista catalão Antoni
Muntadas, na USP.
Mas Rosas faz questão de
lembrar que os que atuam hoje
são herdeiros de grupos como o
3Nós3, formado por Mario Ramiro, Rafael França e Hudnilson Jr.. Em 1979, o trio fez a intervenção "Ensacamento", cobrindo com sacos de lixo a cabeça de esculturas e monumentos públicos de São Paulo.
"Nos anos 60 e 70, muitos artistas no Brasil e em outros países da América Latina valeram-se de estratégias e práticas que
extrapolaram o restrito campo
da arte em seus meios e técnicas convencionais. A situação
política vivida naquele momento é importante para compreender essas proposições",
avalia Freire.
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