São Paulo, quarta-feira, 07 de março de 2007

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Nerds encontram sua turma no rap

Conhecido também por "geeksta rap", gênero é formado por hackers e graduados em cursos de ciências da computação

Em entrevista à Folha, Dan Lamoureux, diretor do documentário "Nerdcore for Life", fala sobre esse subgênero do rap


Divulgação
A "primeira-dama do nerdcore", MC Router


ADRIANA FERREIRA SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

De porta-voz da periferia, o rap passou a ser referência para outra turma de excluídos: os "nerds". Mas, ao contrário dos CDFs retratados num clássico da "Sessão da Tarde", o filme "A Vingança dos Nerds", esses rappers não estão nem aí para a garota mais bonita do colégio. O que eles querem é cavar um espaço no "mainstream" da música e, para isso, formaram sua própria cena, o "nerdcore".
A estratégia de conquista "nerd" vem dando certo. Antes conhecidos apenas em comunidades na internet, os "nerdcores" já são tema de dois documentários independentes, "Nerdcore for Life!" e "Nerdcore Rising", a serem lançados este ano nos EUA -ainda sem previsão para o Brasil. A história desse subgênero do rap foi contada ainda por revistas como "Newsweek" e "Wired".
Chamado também por "geeksta rap" -do termo "geek", obcecado por tecnologia-, esse cenário é formado por hackers, além de graduados ou mestres em cursos como ciências da computação, cujas letras versam sobre videogames, computadores, HQs etc.
"Eles não têm garotas, bons carros, jóias ou bling bling [pingentes brilhantes usados por rappers]. Não têm nada em comum com outros artistas do rap", descreve Dan Lamoureux, autor de "Nerdcore for Life".
"Em vez de rimarem sobre isso, os "nerdcores" falam sobre como eles são bons como "crackers" [tipo de hacker], com videogames ou como são espertos com sistemas de computadores. Eles fazem rap sobre coisas nerd", diz Lamoureux.
O diretor enveredou pelo mundo dos gênios em 2005, depois de assistir a um show. "Amei a música, o público e a atitude. Não podia imaginar que algo como isso existia e quis saber qual a origem do "nerdcore" e quantos rappers "nerds" existiam. Voltei para casa e comecei a planejar o documentário", lembra ele.

Comunidades
Uma música que fala sobre o namoro de dois "nerds" num encontro de fãs de "Star Wars" pode render uma boa piada. Mas não para os "nerdcores", que, segundo Lamoureux, se "levam muito a sério". "Eles têm sua própria sociedade em comunidades on-line."
Foi assim que MC Router, 20, a "primeira-dama do nerdcore", encontrou sua turma. "Até conhecer [o MC] YTcracker, não sabia que fazia parte desse subgênero", diz a moça.
"Passei a procurar por outros artistas e me identifiquei com as letras, sobre computadores, videogames, tecnologia. Coisas que preenchem meu dia-a-dia", afirma Router. Para ela, ser uma "nerdcore" é "deixar florescer tudo o há de "nerdy" dentro de você e processar isso por meio do hip hop."

Solitários
Certamente há gênios no rock e na música eletrônica, mas, segundo Lamoureux, a maioria aderiu ao rap porque ""nerds" não têm amigos".
"Conversei com muitos, e eles disseram que, se você faz rock, precisa ser sociável, estar em uma banda. O hip hop é algo que se pode fazer sozinho."
A maior parte dos "nerdcores" cria suas músicas em estúdios caseiros e despeja a produção em sites pessoais ou em páginas do MySpace e YouTube. Estrelas da cena, como seu criador, o MC Frontalot, além dos rappers YTcracker e Plus+, lançam CDs independentes. Há também coletâneas com faixas desses artistas.
Além disso, eles reproduzem estilos do hip hop, como o gangsta -vertente cujas rimas tratam de brigas de gangues, mulheres. O grupo Futuristic Sex Robotz é um representante do gangsta "nerdcore", com suas letras pesadas, que mesclam tecnologia e sexo.
Muitos deles citam como referência superstars do rap como Missy Elliott e Tupac Shakur. Mas, apesar disso, são desprezados. "Os rappers odeiam os "nerdcores'", acredita Lamoureux. "Eles acham que os "nerds" estão roubando a cultura hip hop, fazendo um clone no sentido negativo."
O diretor acha que isso é uma bobagem: "Eles respeitam a história do hip hop. Só não gostam do estilo tradicional".
É por preconceitos como esses que um dos mais importantes "nerdcores", o MC Plus+, 24, escolheu se desvincular da cena. "Prefiro chamar o que faço de "chip hop'", explica Plus+.
"Gosto de enfatizar como o hip hop é importante para a música. Mais do que o aspecto "nerdy'", diz ele. "Se deixar a escola e me tornar um garçom, rimarei sobre isso."


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