São Paulo, segunda-feira, 07 de março de 2011

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Vargas Llosa em terceira pessoa

Biógrafo de García Márquez, Gerald Martin prepara agora livro sobre o Nobel peruano Vargas Llosa

DENISE MOTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE MONTEVIDÉU (URUGUAI)

São duas da tarde na Inglaterra e Gerald Martin -professor da Universidade de Pittsburgh (EUA) e "biógrafo oficial" de Gabriel García Márquez, como o autor colombiano classificou esse inglês- acaba de voltar de uma prosaica atividade: levar a mulher ao médico.
A rotina aparentemente pacata do acadêmico de 66 anos, porém, é apenas o envoltório da exuberante missão que tem pela frente: reconstruir a vida de quem considera "um dos intelectuais literários mais importantes da última metade de século", Mario Vargas Llosa.
Por enquanto, o detalhe mais flagrante do trabalho é o amontoado de publicações peruanas que recebe regularmente em sua casa, para ir se alimentando do contexto em que o vencedor do Prêmio Nobel do ano passado está mergulhado.
Com sereno, mas evidente entusiasmo, Martin detalha em entrevista à Folha como está estruturando o que espera ser o retrato de uma existência "sensacional" sem ser "sensacionalista".

 

Folha - Depois de García Márquez, o sr. se concentra na vida de Vargas Llosa. Que diferenças fundamentais há entre os dois trabalhos?
Gerald Martin -
Fazer a biografia de García Márquez era para mim uma aventura. Eu era mais jovem, nunca havia feito uma biografia e não conhecia a Colômbia.
Não posso dizer que somos íntimos, mas com Vargas Llosa conversei muitas vezes e, como professor, ensino sua obra há quatro décadas. Nesse sentido, essa é uma obra que já está com metade da pesquisa feita.
Além disso, agora me considero um biógrafo, porque acho que aprendi mais ou menos o ofício.
Fazer a biografia de García Márquez foi uma das melhores coisas que me aconteceram e agora sei exatamente o que desejo e tenho que fazer.
Quero conseguir unidade de conteúdo, mas também estética. E será como voltar a meus passos iniciais de forma diferente.

O sr. e Vargas Llosa já se falaram depois do anúncio de que faria sua biografia?
Sim, a relação foi restabelecida e estamos chegando à compreensão mútua sobre como vamos realizar nossos encontros.

Restabelecida? Esteve rompida, então?
Não. Mas, se você está estudando a obra de García Márquez, não vai incomodar Vargas Llosa todos os fins de semana (risos).
Todos sabemos que Márquez não é o santo de devoção de Llosa, mas, como profissional que é, me falou sobre Márquez para meu projeto em torno dele, prova de uma grande generosidade.

García Márquez dedicou um de seus livros a "Gerald Martin, o louco que me persegue". Que dedicatória lhe faria Vargas Llosa, agora que será ele o perseguido?
(Risos) Muito boa pergunta. Não sei. Só os escritores muito presunçosos querem ser alvo de uma biografia.
Quando disse a Mario que iria escrever a sua, creio que não lhe dei a melhor notícia do ano... Mas trata-se de um homem cortês e que compreende perfeitamente que isso seria inevitável, que é necessário reagir de forma positiva, como vem fazendo. Aceitou com resignação.

Quais os eixos dessa biografia que pretende fazer?
Escrever uma biografia de Llosa sem observar o ângulo político de sua existência seria uma bobagem. É algo que não está presente apenas em seus ensaios.
Talvez ainda seja cedo para conclusões, mas creio que ele também muda ideologicamente em seus romances ao longo destas cinco décadas como escritor.
Há três momentos fundamentais, eixos de sua vida pública e que comporão a estrutura da biografia: seu afastamento da esquerda nos anos 1970, seu fracasso político nos anos 1990, quando perde para Alberto Fujimori nas eleições [presidenciais no Peru], e por fim, mais recentemente, quando depois de tudo e apesar de tudo vence o Nobel.


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