São Paulo, sexta-feira, 07 de abril de 2000


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CARLOS HEITOR CONY
O primeiro centenário da ópera "Tosca"

Já começa a ser comemorado o primeiro centenário da ópera "Tosca", de Puccini, uma das mais populares do repertório lírico e uma das mais representadas em todo o mundo, inclusive com algumas versões cinematográficas. Antes de mais nada, o drama musical teve um antecedente glorioso no palco: Sarah Bernhardt incorporou o papel de Floria Tosca entre os principais de sua carreira.
O drama original, de Victorien Sardou, recebeu acusação de plágio por parte de um irmão de Daudet, que reivindicava a primazia de ter escrito o caso da cantora que assassina o chefe de polícia de Roma no dia seguinte ao da batalha de Marengo.
Nem assim a idéia parece ter pertencido a Daudet. Um autor americano, Maurice Barrymore, garante que a cena final, o fuzilamento simulado do herói, era de um drama seu, "Nadjeska", de 1884.
De quem quer que tenha sido a idéia do drama, e por mais brilhante que Sarah Bernhardt tenha sido no palco, a história de Tosca não duraria cem anos se não fosse a música de Puccini.
Toscano, nascido em Lucca, Giacomo Puccini (1858-1924) é considerado o primeiro músico que conquistou o público internacional. A crítica moderna vê nele, ao mesmo tempo, o sucessor de Verdi e o "fundador do moderno musical do teatro" -um ramo que cresceria mais tarde com Victor Herbert, Radolphe Friml, Vincent Youmans, Jerome Kern, George Gershwin e Cole Porter. Todos, de certa forma, usaram recursos melódicos e bossas especiais criadas por Puccini.
"Tosca" foi a ópera romana do autor que ganhara notoriedade com dois dramas franceses: "Manon Lescaut", de Abbé Prévost, musicado também por Massenet e Auber, e "La Bohème", inspirada em "Scènes de la Vie de Bohème", de Henri Murger, também musicada por Leoncavallo.
Mais uma vez, ele recorria a um drama francês de um autor da moda, mas Puccini desejava fazer uma ópera que tivesse a ver com a cidade de Roma e com seus mitos, sua luxúria, seus crimes.
As duas óperas anteriores já lhe haviam garantido o pódio deixado vago por Verdi. A aceitação de sua música, brilhantemente orquestrada, de linha melódica inconfundível e não raras vezes roçando pelo popular, foi fulminante nos Estados Unidos. Thomas Edison mandou-lhe de presente um gramofone em que a tuba era de ouro, com a inscrição: "Outros farão inventos maiores do que o meu. Mas ninguém fará música melhor do que Puccini".
Anos mais tarde, em Nova York, quando estreou "The Girl of the Golden West", drama de David Belasco, Puccini foi considerado o homem mais popular do mundo entre os americanos. E, no Japão, apesar das restrições ideológicas a "Madame Butterfly", ele era o maior símbolo da cultura ocidental. Somente os alemães não gostaram de "Tosca". A ópera foi considerada nojenta, obscena, de criminosa vulgaridade. Nada a ver com a música em si, mas com a história.
Floria Tosca, cantora famosa, é amante do pintor Mario Cavaradossi, que está pintando uns afrescos na basílica de Sant"Andréa del Valle. Um prisioneiro político foge do castelo Sant'Angelo e, com a cumplicidade do pintor, esconde-se num altar lateral da igreja. O chefe de polícia, o barão Scarpia, vai à igreja onde haverá um Te Deum pela derrota de Napoleão em Marengo -um boato que não se confirmaria, mas que está sendo comemorado pela classe dominante romana, julgando-se livre do general que espalhava pela Europa as conquistas da Revolução Francesa.
Ajudado pelo sacristão, Scarpia desconfia que o pintor escondeu o fugitivo. Cobiçando Tosca, sente ali o caminho para a conquista violenta, que ele diz preferir ao "melífluo consenso".
Prende Cavaradossi e manda chamar a cantora. Os esbirros torturam o pintor, cujos gritos fazem Tosca denunciar o esconderijo do fugitivo. Neste momento, chega a notícia de que Napoleão vencera em Marengo. Scarpia pergunta pelo general Mélas, comandante das tropas austríacas que tentavam impedir a conquista da Itália. Mélas fugira. Banhado em sangue, Cavaradossi canta vitória e amaldiçoa Tosca, que revelara o seu segredo. É condenado ao fuzilamento, tem uma hora de vida.
Scarpia condiciona a sentença a uma hora de amor com Tosca. Ela tenta suborná-lo, diz que nada tem, viveu sempre da arte e do amor ("vissi d'arte, vissi d'amore" -uma das mais famosas árias do repertório lírico). Scarpia insiste, Tosca o mata, mas antes obrigara o barão a assinar um salvo-conduto para ela e seu amante, que teria um fuzilamento simulado.
Corre ao castelo Sant'Angelo, levando a salvação de Cavaradossi. Avisa-o que o fuzilamento será simulado. Aos disparos do pelotão, ele deverá cair como morto. Depois fugiriam.
Mas Scarpia também simulara. O fuzilamento é real. Mario morre, os soldados buscam a assassina de Scarpia. Tosca se atira do alto do castelo.
Como se nota, um drama bem século 19. Mas a música de Puccini, velha de cem anos, continua atual. Temas de sua ópera são tocados todos os dias em todas as partes do mundo.


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